Raça e Igualdade e Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (ANTRA) solicitam à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) um pronunciamento público sobre o aumento de assassinatos de pessoas trans no Brasil em 2020

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Washington, D.C. e Rio de Janeiro, Brasil. 13 de maio de 2020. O Instituto Internacional sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) e a Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (ANTRA) nos dirigimos à Honorável CIDH para expressar a profunda preocupação pelo aumento de cerca de 48% nos casos de assassinatos […]

Washington, D.C. e Rio de Janeiro, Brasil. 13 de maio de 2020. O Instituto Internacional sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) e a Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil (ANTRA) nos dirigimos à Honorável CIDH para expressar a profunda preocupação pelo aumento de cerca de 48% nos casos de assassinatos de pessoas trans no Brasil em relação ao ano de 2019, considerando os quatro primeiros meses do ano, mesmo durante a pandemia de COVID-19, conforme boletim publicado recentemente pela ANTRA.

Em 2019, foram 43 ocorrências. Em 2020, 64 casos. Isolando os meses de março e abril, para comparar especificamente com o período inicial da pandemia, houve um aumento de 13%. Esse cenário demonstra o quanto a sociedade e o Estado brasileiro são violentos com as pessoas trans, que se tornam ainda mais desprotegidas nesse período, em um contexto em não houve nenhuma ação do Estado pensando no cuidado e atenção a essa população frente aos impactos socioeconômicos provocados pela crise sanitária.

A situação é intensificada pela séria crise política que o país atravessa nesse momento, agravada por um presidente que tem feito, constantemente, diversas ameaças à democracia brasileira, chegando a participar, recentemente, de manifestações[1] que clamavam pelo fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF). A participação do presidente na referida manifestação se torna ainda mais grave ao nos depararmos com a informação de que um dos grupos que estiveram na linha de frente da organização se proclama como um grupo paramilitar, cuja líder declarou ter como objetivo “fazer os ministros do STF entenderem, de maneira, se for preciso, coercitiva, que não são 11 semideuses” [2].

A crise política ganha novos contornos ao ser atravessada pela pandemia provocada pelo coronavírus. O presidente Jair Bolsonaro tem se esquivado de sua responsabilidade enquanto chefe do Poder Executivo e incentivado o desrespeito ao isolamento, num movimento de inobservância das recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), da UNAIDS e da própria CIDH. Enquanto isso, o número de mortos não para de crescer, tendo chegado a 12.484[3] mortes na contagem mais recente quando do envio deste comunicado. Ao mesmo tempo, num país extremamente desigual como o Brasil, os dados confirmam que as populações mais vulneráveis são as mais afetadas nas taxas de letalidade do vírus, o que se expressa no preocupante aumento de mortes entre pessoas negras e pobres[4].

Demonstramos grande preocupação com o fato de que as vulnerabilidades sociais têm sido agravadas durante a pandemia do coronavírus, o que se torna nítido quando olhamos para a população travesti e transexual. Afinal, se cerca 90% das travestis e mulheres transexuais no Brasil utilizam o trabalho sexual como fonte primária de renda[5], como esperar que essa população consiga concretizar o isolamento social sem abrir mão de seu sustento para sobrevivência? Houve diversos relatos de grupos que exploram essas profissionais que não permitiram a interrupção de suas atividades, exigindo que as prostitutas travestis e mulheres transexuais continuassem a trabalhar nas ruas[6].

Nesse sentido, solicitamos que esta Honrável Comissão se pronuncie publicamente a respeito da situação das pessoas trans no Brasil e faça um chamado ao Estado brasileiro, a fim de que confira a atenção necessária para garantir o direito à vida, à integridade e à dignidade das pessoas travestis e transexuais do Brasil, em sua maioria negras, que, ainda em meio à pandemia, seguem sendo as mais vulnerabilizadas e mais sujeitas a casos de violência física e letal.

[1] BBC. Bolsonaro participa mais uma vez de ato com críticas a STF e Congresso. 3 de maio de 2020. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-52518123

[2] Diário do Centro Mundo. Grupo paramilitar criado por Sara Winter está na mira da PGR. 08 de maio de 2020. Disponível em: https://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/grupo-paramilitar-criado-por-sara-winter-esta-na-mira-da-pgr/

[3] News Google. Casos de coronavírus e número de mortes no Brasil em 13 de maio. 13 de maio de 2020. Disponível em: https://news.google.com/covid19/map?hl=pt-BR&mid=%2Fm%2F015fr&gl=BR&ceid=BR%3Apt-419

[4] O Estado de São Paulo. Em SP, risco de morte de negros por covid-19 é 62% maior em relação aos brancos. 04 de maio de 2020. Disponível em: https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,em-sp-risco-de-morte-de-negros-por-covid-19-e-62-maior-em-relacao-aos-brancos,70003291431

[5] Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA). Dossiê assassinatos contra travestis brasileiras e violência e transexuais em 2019. 2020, p. 69. Disponível em: https://antrabrasil.files.wordpress.com/2020/01/dossic3aa-dos-assassinatos-e-da-violc3aancia-contra-pessoas-trans-em-2019.pdf

[6] RD News. Exploração das cafetinas obriga trans a descumprir quarentena e continuar na rua. 22 de março de 2020. https://www.rdnews.com.br/cidades/exploracao-das-cafetinas-obriga-trans-a-descumprir-quarentena-e-continuar-na-rua/125737

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