Operação Verão x Operação Escudo: Raça e Igualdade condena a letalidade da Segurança Pública de São Paulo

Operação Verão x Operação Escudo: Raça e Igualdade condena a letalidade da Segurança Pública de São Paulo

Brasil, 21 de fevereiro de 2024 – Seguindo a mesma lógica violenta de 2023, a política de segurança pública aplicada pelo Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e pelo seu Secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite; celebra seu êxito com um fatídico número de mortes. A Operação Verão realizada na Baixada Santista alcançou 28 mortes em 16 dias, ou seja, com 23 dias a menos que Operação Escudo, ocorrida na mesma época no ano passado. O expressivo número de mortes atingido em menos dias de operação, demonstra a alta letalidade sem qualquer fundamento mais objetivo e dentro da legalidade. Ressaltamos também, que a impunidade diante dos fatos ocorridos em 2023 revela a falta de transparência nas investigações e na descredibilidade do sistema de justiça.

O Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) rechaça a estratégia de implementação de uma política de terror e de morte que ignora quaisquer direitos de vida e dignidade humana. Desse modo, condenamos a ação de forças policiais que consideram viável responder com requintes de vingança a morte de um policial na região. Com o mesmo argumento, a atual Operação Verão, foi estabelecida em sua terceira fase, após a morte do policial Samuel Wesley da Costa, no dia 02 de fevereiro, em Santos.

Mesmo diante das denúncias da população de desrespeito às leis, da invisibilidade dos moradores da região perante os agentes de segurança pública e da vitimização de inocentes, a Polícia Militar e seus superiores justificam a Operação Verão como “um esquema especial diante dos munícipes e turistas”. No entanto, Policiais Militares que atuam nas comunidades seguem aplicando execuções extrajudiciais e não fazem uso de câmeras nos seus uniformes. Segundo relatos do Ouvidor da Polícia de São Paulo, esta operação está sendo considerada uma das mais letais da história.

Em dezembro de 2023, o Brasil recebeu a visita do Mecanismo de Especialistas Independentes para Promoção da Justiça e Igualdade Racial na Aplicação da Lei (EMLER), das Nações Unidas, que se pronunciou sobre as chacinas ocorridas no Rio de Janeiro e São Paulo, alertando sobre as execuções extrajudiciais que têm como atravessamento o “racismo perverso e presente”, que evidencia as desigualdades na aplicação da lei. Segundo o Mecanismo, “a impunidade é generalizada no sistema penal e as pessoas têm medo de retaliação”.

Deste modo, em mais um ano, seguimos urgindo aos sistemas internacionais de proteção de direitos humanos que intervenham perante as ações da polícia de São Paulo que com sua política de morte, fere o devido processo legal, o direito de defesa e nega a vida sem qualquer critério objetivo, executando pessoas sob um suposto argumento de legalidade das ações letais e que de forma inequívoca resultam em violações de direitos humanos. Prestamos nossa solidariedade às famílias da região da Baixada Santista e seguimos pleiteando por estratégias de vida e de proteção do povo brasileiro, pois sabemos que o perfilamento racial e a questão territorial têm grande influência no perfil das vítimas. Assim, recomendamos ao Estado brasileiro:

  • Estabeleça a obrigatoriedade do uso de câmeras nos uniformes policiais em qualquer operação deflagrada por agentes da força de segurança pública.
  • Investigação e responsabilização de Governadores e Secretários envolvidos em execuções extrajudiciais em seus mandatos, além dos agentes de segurança envolvidos em ambas as operações.
  • A aplicação da Convenção Interamericana contra o Racismo e Formas Correlatas de Intolerância (CIRDI) que como um instrumento de pacto jurídico internacional prevê ações efetivas antidiscriminatórias com força de lei;

 

Primeira ‘Marsha’ Nacional de Visibilidade Trans no Brasil

Brasil, 30 de janeiro de 2024 – No dia 28 de janeiro (domingo), Brasília foi palco da Primeira ‘Marsha‘ Nacional pela Visibilidade Trans no Brasil, reunindo centenas de pessoas trans de todas as  regiões do país pelo direito à vida, à dignidade e identidade, além de convocar pessoas LGBI+ e aliades do país. A primeira marcha escrita como “Marsha“, refere-se à ativista Marsha P. Johnson, uma travesti e artista afro-americana, que foi uma das figuras mais proeminentes entre as décadas de 1960 e 1990, em Nova York, e que desempenhou um papel importante na rebelião de Stonewall. Da mesma forma, a mobilização recordou e homenageou o legado de Kátia Tapety, Jovanna Baby, Keila Simpson, Erika Hilton e Duda Salabert, que são reconhecidas pelo protagonismo na luta em prol dos direitos das pessoas trans.

O evento, que teve início em frente ao Congresso Nacional e seguiu até o Museu Nacional da República, comemorou os 20 anos daquele marco histórico onde, pela primeira vez, um grupo de transgêneros, travestis e transexuais ocupou o Congresso Nacional, em Brasília, para participar de decisões de políticas públicas. Estabelecendo, assim, o dia 29 de janeiro como o Dia da Visibilidade Trans no Brasil.

“Esse lugar é das travestis que chegaram pra ocupar, que chegaram para fazer história; é dos homens trans, é das mulheres transexuais, é da nossa comunidade que sempre foi negada de estar aquí presente”, enfatizou a Deputada Federal Erika Hilton durante a passeata em Brasília.

A ‘Marsha’ começou às 13h com atrações culturais de artistas trans e continuou com as palavras de representantes do movimento social e de organizações internacionais, como a de Mariah Rafaela Silva, Oficial de Participação Política de Mulheres LBTI, de Raça e Igualdade: “Nos juntamos à Marsha Trans com o compromisso de fazer ecoar as vozes que clamam por direitos iguais, espaços de representatividade, dignidade e respeito às pessoas trans deste país. A população trans, sabemos, enfrenta múltiplos desafios para sua efetiva cidadania e reconhecimento humano, no Brasil e internacionalmente”, disse.

Também tiveram espaço de fala as parlamentares como Duda Salabert, Erika Hilton, Daiana Santos, Symmy Larrat e a Enviada Especial dos EUA para promover os direitos humanos das pessoas LGBTIQ+, Jessica Stern. “Acredito muito no valor da ação direta e das manifestações. Estas, são as expressões mais poderosas de nossas ideias e como traduzimos nossa paixão em demandas por mudança”, disse a Enviada Especial Jessica Stern.

Por sua vez, Duda Salabert enfatizou: “A nossa luta não é apenas identitária, não lutamos apenas em defender a nossa identidade, a nossa luta é estrutural. Nós estamos discutindo, por exemplo, um anti-modelo de empregabilidade, já que 90% das travestis e transexuais estão se prostituindo para sobreviver”.

Antes do fim do ato,  aconteceu algo inédito no Brasil: os principais prédios públicos, como o Supremo Tribunal Federal, o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto, o Itamaraty e o Ministério da Justiça, foram iluminados com as cores da bandeira trans, por ocasião do Dia Nacional da Visibilidade Trans.

Eventos importantes no âmbito da Visibilidade Trans

No dia 29 de janeiro, um dia após a marcha e no mesmo dia da comemoração, foi realizado no Congresso Nacional um painel público sobre os direitos das pessoas trans, com a participação de Erika Hilton e Duda Salabert, ambas Deputadas Federais do Brasil; Bruna Benevides, representante da ANTRA; Fabián Algarte, coordenador do IBRAT; e Pedro Paulo Bicalho, presidente do Conselho Federal de Psicologia. Durante o painel, Salabert destacou que o Brasil tem atualmente o congresso mais conservador de sua história e que, embora tenha a presença de duas mulheres trans, sua presença continua sendo em nível simbólico e de resistência à violência. Por sua vez, Hilton parafraseou Angela Davis e disse que  “a sociedade avança quando as pessoas trans avançam” e  ainda alertou as pessoas trans em posições de liderança a não assumirem a responsabilidade de serem heroínas, mas de reconhecerem a capacidade de não desistir.

Nesse dia também foi realizado um evento do  Governo Federal do Brasil coordenado entre o Ministério dos Direitos Humanos e outros ministérios, no qual  foi lançado o Dossiê Assassinatos e Violência contra Travestis e Transexuais brasileiras em 2023 da  ANTRA e contou com a presença de Symmy Larrat, Secretária Nacional dos Direitos da População LGBTQIA+ do MDHC e do Ministro da pasta Silvio Almeida; da Ministra da Saúde, Nísia Trindade, e a participação da Enviada Especial, Jéssica Stern. O relatório, em sua publicação mais recente desde a retomada democrática, informa que durante o ano de 2023, foram registradas 155 mortes de pessoas trans, superando o valor do ano passado. Destes, 145 correspondem a homicídios e 10 a casos de suicídios.

Por fim, no dia 30 de janeiro, Raça e Igualdade em conjunto com a ANTRA e a ONU Mulheres, organizou o evento “CEDAW – contribuições interseccionais para a proteção de mulheres trans e travestis”, cujo painel foi composto por Malu Aquina, assessora do Gabinete da Mulher do Ministério da Mulher do Brasil, Bruna Benevides, representante da ANTRA; Angela Pires, Diretora de Direitos Humanos das Nações Unidas; e María Eduarda Dantas, representante da ONU Mulheres. O evento discutiu os principais desafios para a participação de mulheres trans na revisão do Brasil pelo CEDAW, e serviu como um convite para a capacitação que Raça e Igualdade oferecerá às organizações da sociedade civil que desejam submeter seus relatórios para a revisão do Brasil na CEDAW.

A partir do comprometimento de Raça e Igualdade com os direitos humanos das pessoas LGBTI+, continuaremos apoiando a luta das pessoas trans e a conquista de seus lugares de fala e de existência nos espaços de poder. Seguimos apoiando as organização em estratégias de advocacy em seus territórios, de mãos dadas para ecoar suas vozes e direitos.

20 de luta trans: A revolução pelos direitos do movimento brasileiro

Brasil, 29 de janeiro de 2024. – Hoje completam 20 anos que pela primeira vez, um grupo de pessoas trans, travestis e transexuais ocupou o Congresso Nacional em Brasília para participar de decisões das políticas públicas. Este evento ocorreu no âmbito do lançamento da campanha “Travesti e Respeito: Já está na hora dos dois serem vistos juntos, em casa, na boate, na escola, no trabalho, na vida”, onde lideranças do movimento organizado de travestis, transgêneros e transexuais estabeleceram uma articulação com o Programa Nacional de DST e Aids do Ministério da Saúde, com o objetivo de formular políticas específicas para a saúde e proteção da população trans.[1]

Esse marco marcou a história do movimento trans no Brasil ao instituir o Dia Nacional da Visibilidade Trans. Graças ao trabalho da defesa de direitos e aos vários esforços das organizações trans da sociedade civil, o país comemora todos os anos as existências trans com dignidade e no pleno gozo dos direitos humanos.

Neste dia, o Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) enfatiza a importância do reconhecimento abrangente das pessoas trans e do acesso aos seus direitos fundamentais num país onde a taxa de mortalidade de pessoas trans é a mais alta do mundo.

Segundo a ANTRA, durante o ano de 2023 foram notificadas 155 mortes de pessoas trans, superando o valor do ano passado. 145 destes números correspondem a homicídios e 10 a casos de suicídios. Com o objetivo de acabar com a discriminação e a violência estrutural, o movimento trans brasileiro tem desempenhado um papel crucial na conscientização sobre os problemas que enfrentam, incluindo a falta de acesso aos serviços básicos como educação, saúde e trabalho; e, no geral, continuam a trabalhar para alcançar e defender os seus direitos mais essenciais.

Embora os avanços sejam muito importantes, ainda é dever do Estado garantir o pleno exercício de todos os direitos. “Gostaria de viver dentro de um curto espaço de tempo de ter segurança pública para poder acessar todos os espaços, junto com saúde integral para a população trans”, destaca Dom Erick, transmasculino amazonense, 32 anos, gordo e pansexual, formado em Psicologia, membro do IBRAT. Nessa linha, Rame Ferreira, elu, Doutorando em História (UFRGS), bolsista da CAPES, também menciona a importância do “acesso ao atendimento ambulatorial e à hormonização em qualquer Unidade Básica de Saúde”.

Outro ponto importante é o acesso à participação política e o acesso aos cargos públicos por parte de pessoas trans. “Com as transformações políticas e sociais no Brasil, temos pessoas trans mais instruídas dentro do espaço político e com esse espaço conquistamos uma liderança para que as pessoas trans ocupem espaços de poder nas esferas federal, estadual e municipal. “Essa é uma conquista para o movimento”, disse Bruna Ravena Braga, mulher trans, estudante da Escola de Formação Política Kátia Tapety, ativista da ONG Casa de Malhú, afirmando que dentro desses processos de inclusão seriam úteis as cotas para acessar esses espaços.

Como se sabe, no Brasil, as pessoas trans enfrentam muitos desafios, porém, o movimento trans brasileiro comparado a outros países da região, obteve avanços importantes desde a ocupação do Congresso Nacional.

Por isso, neste dia de 28 de janeiro, em Brasília, acontecerá a Primeira Marsha Nacional da Visibilidade Trans em frente ao Congresso Nacional. Serão 20 anos desse marco histórico, e em comemoração à luta e à memória de pessoas como Marsha P Johnson, Katia Tapety, Jovanna Baby, Keila Simpson, Erika Hilton e Duda Salabert, o Congresso Nacional será mais uma vez palco de celebração e reivindicações. Participe da 1ª Marsha Nacional pela Visibilidade Trans, no dia 28 de janeiro, em Brasília, a partir das 13h. Um encontro pelos direitos na democracia e uma vida sem violência.

A partir de Raça e Igualdade, acompanharemos as diversas atividades que serão realizadas em Brasília, reafirmando nosso compromisso em contribuir com a defesa e promoção dos direitos humanos e com o objetivo conjunto de garantir a igualdade e a dignidade das pessoas trans.

 

[1] Campanha Travestis – 2002. Disponível em: https://antigo.aids.gov.br/pt-br/campanha/campanha-travestis-2002

Visita do EMLER ao Brasil: Mecanismo da ONU exorta por reparação frente ao racismo sistêmico e a brutalidade policial

Brasil, 22 de dezembro de 2023 – De 27 de novembro a 08 de dezembro, o Mecanismo de Especialistas Independentes para Promoção da Justiça e Igualdade Racial na Aplicação da Lei (EMLER), das Nações Unidas, esteve em Missão no Brasil com visita às cidades de Brasília, Salvador, Fortaleza, São Paulo e Rio de Janeiro. O Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) junto às organizações parceiras, se mobilizou para entregar ao Mecanismo, um documento com recomendações gerais e específicas sobre os temas atravessados pelo perfilamento racial antinegro no país, em busca de reparação e de justiça racial.

Previamente à visita, Raça e Igualdade organizou uma capacitação com entidades da sociedade civil em sua sede, no Rio de Janeiro, para facilitar a elaboração conjunta do documento, além de apresentar um panorama dos objetivos da visita, o funcionamento do Mecanismo e de apoiá-los para um oportuno diálogo com os Relatores. As entidades que assinaram o documento entregue ao EMLER foram: ONG Criola, Grupo de Estudos Novos Ilegalismos (GENI), Instituto Juristas Negras, Instituto Marielle Franco (IMF), Articulação Brasileira de Lésbicas (Rede ABL); Resistência Lésbica da Maré; Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (Cesec), Ilê Axé Omiojuarô e Raça e Igualdade.

“Como uma organização de capacitação institucional, vemos como crucial oferecer apoio à sociedade civil diante das especificidades dos mecanismos internacionais de direitos humanos. A visita do EMLER se fez como uma oportunidade única e urgente neste ano de retomada democrática, pois o país passou por um grande retrocesso nesta matéria e a aplicação da justiça racial e o enfrentamento ao racismo estrutural e sistêmico é urgente no Brasil”; analisa Rodnei Jericó da Silva, Diretor de Raça e Igualdade no Brasil.

Sobre o EMLER e a visita ao Brasil

 O EMLER é um mecanismo criado em 2021, pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, através a RESOLUÇÃO DA ONU 47/21. Este mecanismo atua especificamente na promoção e proteção dos direitos humanos e liberdade fundamentais de africanos e afrodescendentes contra o uso excessivo da força policial, entre outras violações dos direitos humanos por agentes da lei, visando mudanças transformadoras para a justiça e igualdade racial. Junto ao EMLER e peça-chave na organização desta visita ao Brasil, a Coalizão Antirracista da ONU (UNARC), foi responsável por acompanhar e facilitar os encontros dos Relatores no país.

Durante a Missão, os Especialistas se reuniram diretamente com o Estado e suas autoridades, incluindo as instâncias responsáveis pela aplicação da lei e as suas agências de supervisão. Ademais, nas cidades visitadas realizaram oitivas com a sociedade civil, incluindo um diálogo direto com as vítimas e/ou seus familiares, as comunidades afetadas, defensores e defensoras dos direitos humanos. Em Salvador, tiveram a oportunidade de visitar a Penitenciária Lemos de Brito e, no Rio de Janeiro, a Cadeia Pública José Frederico Marques.

Em uma coletiva de imprensa realizada virtualmente, no dia 08 de dezembro, os Membros do EMLER, Tracie Keesee e Juan Mendez, compartilharam suas impressões preliminares sobre a experiência no país, enfatizando que o relatório final será apresentado na 57ª sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em setembro de 2024 e, até esta data, estão abertos para receber mais informações e materiais sobre a situação racial no Brasil. Esse relatório será entregue ao governo brasileiro que, como país signatário da ONU, deve comprometer-se com uma resposta ao Mecanismo.

Na abertura da coletiva, os Especialistas fizeram referência às boas práticas adotadas pelo país, assim como o reconhecimento da existência do racismo sistêmico, fator determinante em termos de concepção de políticas públicas. Além disso, citaram a criação do Ministério da Igualdade Racial e a sua replicação em diversos estados; as iniciativas do sistema de cotas raciais; o uso de câmeras nos uniformes policiais adotados por alguns estados; o reconhecimento da importância da perspectiva interseccional e a atuação da defensoria pública no acompanhamento de familiares de vítimas da violência policial e estatal no país.

Entre os desafios, “o racismo perverso e presente”, destacaram, entre a vigência de leis que perpetuam a desigualdade em relação à saúde e o acesso ao trabalho. “As desigualdades resistem na aplicação da lei”, enfatizaram. Assim como criticaram a falta de representação de pessoas negras no judiciário e no poder público, e chamaram atenção para a marginalização do racismo religioso e as diversas denúncias recebidas sobre discurso de ódio e assassinatos de lideranças religiosas (em especial lideranças de religiões de matriz africana) e quilombolas.

Sobre as chacinas ocorridas no Rio de Janeiro e São Paulo, os membros do EMLER alertaram para as violações extrajudiciais referentes as ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) vigentes e ignoradas pelo poder público. Ademais, a partir da escuta de pessoas LGBTI+, constataram que são constante vítimas dos agentes da lei, além da falta de reconhecimento de seus nomes sociais pelos mesmos e pelas instituições públicas.

“A impunidade é generalizada no sistema penal e as pessoas têm medo de retaliação”, observou o Mecanismo. O tema da impunidade foi visto com grande preocupação, tal como avaliaram que este fato gera uma desconfiança geral sobre o sistema de justiça. Desse modo, apontaram que as câmeras devem ser obrigatórias nos uniformes dos agentes de segurança pública. Destacaram que as famílias enfrentam muitas represálias quando precisam do apoio do Estado, sendo que a maior parte dessas famílias são chefiadas por mulheres negras. Para os Relatores, a falta de transparência nas investigações legitima o impacto racial nos processos em curso.

Em relação ao sistema prisional enfatizaram a grande proporção de pessoas negras nas prisões e como este fato é provado estatisticamente, pois o Brasil possui mais de 800 mil pessoas encarceradas. Sobre este tema destacaram a alimentação inadequada, saneamento precário e as diversas denúncias de torturas e maus-tratos. “Violações que equivalem a tortura e levam a mortes”, alarmaram. Nesse sentido, advertiram que a falta de mão de obra adequada e capacitada leva a manutenção das precárias condições, sendo importante o apoio à saúde mental destes funcionários, pois essa debilidade do sistema reverbera, consequentemente, nas pessoas negras.

“O Brasil precisa adotar uma segurança pública nos padrões dos direitos humanos, incluindo a aplicação da lei e os padrões de segurança para reparação racial”, afirmaram os Especialistas. Nesse sentido, pontuaram a responsabilidade do judiciário para desmantelar o sistema vigente e retirar a experiência do racismo nessas relações institucionais e nas forças policiais.

Assim, Raça e Igualdade segue apoiando veementemente a luta antirracista no país, buscando agregar e colaborar com a sociedade civil para enfrentar a brutalidade e toda a violência derivada das desigualdades enraizadas nas diferenças raciais. O racismo precisa ser combatido nas leis, na democratização do acesso às informações e no combate a fake news, no negacionismo, nas políticas e na estrutura do capital racial que, historicamente, se firmou no controle e descartabilidade de pessoas negras por forças policiais estruturadas em relações de poder coloniais e escravagistas que se perpetuam até hoje.

Por fim, compartilhamos algumas das recomendações entregues ao EMLER pelas organizações brasileiras em nosso documento conjunto:

  • Condenação pública da violência policial e dos desaparecimentos forçados: O Estado brasileiro deve emitir uma declaração pública condenando veementemente a violência policial e os desaparecimentos forçados. Essa posição firme demonstrará o compromisso do Estado em proteger os direitos humanos e garantir a segurança de seus cidadãos.
  • Investigação rigorosa dos assassinatos de jovens negros por agentes do Estado: O Estado brasileiro deve garantir que todos os casos de assassinatos de jovens negros por agentes do Estado sejam investigados de forma completa, imparcial e transparente. A justiça deve prevalecer e os responsáveis devem ser responsabilizados.
  • O Estado brasileiro deve adotar medidas específicas para garantir a presença de policiais femininas na abordagem de mulheres cis e trans. Além disso, deve haver treinamento obrigatório para as policiais femininas sobre questões de gênero, a fim de que atuem de forma profissional e respeitosa.
  • O Estado brasileiro deve adotar medidas legislativas para garantir a celeridade e a transparência das investigações em casos que envolvam o Estado como autor do crime, especialmente em casos que envolvam discriminação racial e questões de gênero.
  • O Estado brasileiro, por meio de seus Ministérios, deverá realizar, no prazo de um ano, um diagnóstico e avaliação da situação das políticas públicas de combate ao preconceito e à discriminação religiosa (racismo religioso), verificando sua aplicação, orçamento, efetividade das delegacias especializadas em crimes dessa natureza, com a criação de um Observatório da Violência contra os Povos Tradicionais de Matriz Africana.

Ativistas afrodescendentes do Brasil, Colômbia e Cuba realizaram reuniões estratégicas em Washington D.C. para desenvolver ações de enfrentamento ao racismo

Nos dias 14 e 15 de novembro, ativistas afrodescendentes do Brasil, Colômbia e Cuba estiveram em Washington D.C. realizando reuniões estratégicas para reconhecer o progresso no combate ao racismo e à discriminação racial, além de preparar recomendações para ações mais eficazes.

A delegação participou de discussões com a Open Society Foundation sobre colaborações conjuntas e oportunidades de financiamento. Ademais, realizaram uma reunião separada com o Setor de Liberdade Religiosa do Departamento de Estado, discutindo recomendações sobre como investir em treinamento político para líderes de religiões afrodescendentes. Destacou-se a necessidade de reforçar essas recomendações no Plano de Ação Conjunta para a Eliminação da Discriminação Racial e Étnica (JAPER) e no Plano de Ação EUA-Colômbia para a Igualdade Racial e Étnica (CAPREE). Isso inclui garantir a expansão de projetos de pesquisa liderados por universidades de ambos os países para coletar e interpretar dados sobre racismo religioso no Brasil e em outras partes da região, a fim de aprimorar a troca de experiências e melhores práticas.

Durante a visita, a delegação também se reuniu com o Diretor do DRL e com a Representante Especial para Equidade Racial e Justiça do Departamento de Estado, concentrando-se nas recomendações para a eficácia do JAPER e do CAPREE e em seu possível papel no combate ao racismo religioso nas Américas. Discussões posteriores na embaixada brasileira se concentraram no tema do racismo religioso, incluindo ataques a líderes religiosos e praticantes de terreiro e a perda da guarda dos filhos por mães praticantes de religiões de matriz africana, juntamente com recomendações para o JAPER e iniciativas regionais contra a discriminação racial.

No Congresso, a delegação se aprofundou nas transformações que estão ocorrendo na Colômbia e no Brasil, destacando o compromisso de abordar a discriminação racial por meio do JAPER e do CAPREE. Abordou-se os ataques persistentes a líderes e templos de religiões de origem africana. A visita culminou em um painel de discussão com a sociedade civil americana que destacou os aspectos críticos da abordagem do racismo religioso, o impacto da defesa internacional, a educação antirracista, o genocídio negro e o papel influente da arte nessas conversas vitais.

 

Sociedade Civil Celebra a Nomeação de Graeme Reid como Terceiro Especialista Independente das Nações Unidas em Orientação Sexual e Identidade de Gênero e Reconhece as Conquistas de Victor Madrigal-Borloz

Genebra, 13 de outubro de 2023.- O Presidente do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas nomeou Graeme Reid como o próximo Especialista Independente encarregado de abordar a violência e a discriminação contra indivíduos devido à sua orientação sexual e identidade de gênero (SOGI).

Essa nomeação ocorreu hoje no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, após sua indicação pelo Presidente do órgão governamental composto por 47 membros, responsável pela supervisão dos direitos humanos globais, no mês passado. Graeme Reid assumirá essa função em 1º de novembro de 2023.

Anthropologist e pesquisador da África do Sul, Reid atualmente ocupa o cargo de Diretor do Programa de Direitos LGBT na Human Rights Watch. Ele se torna a terceira pessoa a ocupar o mandato das Nações Unidas especificamente destinado a combater violações dos direitos humanos contra pessoas LGBTQ+ e de identidades de gênero diversas, sucedendo a Vitit Muntarbhorn da Tailândia (2016-2017) e a Victor Madrigal-Borloz da Costa Rica (2017-2023).

Organizações da sociedade civil em todo o mundo receberam com entusiasmo essa decisão: “Bilhões de pessoas continuam a viver em sociedades com leis e atitudes sociais que colocam em perigo pessoas LGBTI”, disseram organizações XYZ do mundo inteiro. “Dada sua vasta experiência em defesa e academia, juntamente com seu compromisso inabalável em ouvir as vozes dos defensores dos direitos humanos de base, confiamos que Reid poderá promover maior compreensão e lembrar aos Estados de suas obrigações para com pessoas de diversas orientações sexuais e identidades de gênero em todo o mundo. Como sociedade civil, aguardamos com expectativa um engajamento construtivo com o novo titular do mandato.”

Essa nomeação segue um longo processo de seleção, que incluiu a pré-seleção de 23 candidatos, realização de entrevistas e, finalmente, a nomeação sob a supervisão dos Estados Membros do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. No início deste mês, organizações globais expressaram preocupação com a ausência de mulheres e pessoas não binárias na lista de candidatos recomendados pelo Grupo Consultivo, conforme destacado durante a recente sessão do Conselho de Direitos Humanos. “Assegurar a participação e representação das mulheres é fundamental para refletir as diversas realidades de suas vidas”, enfatizaram essas organizações.

Em junho de 2022, o Conselho de Direitos Humanos renovou com sucesso o mandato do Especialista Independente sobre violência e discriminação com base na orientação sexual e identidade de gênero. A renovação reconheceu e reafirmou a importância vital da manutenção desse mandato, à medida que as comunidades LGBTQ+ em todo o mundo continuam a enfrentar violência e discriminação com base em sua SOGI.

Victor Madrigal-Borloz, o atual titular do mandato, permanecerá no cargo até o final do mês. Organizações da sociedade civil também aproveitaram este momento para celebrar as realizações dos últimos seis anos, afirmando: “Hoje também queremos celebrar tudo o que foi conquistado nos últimos seis anos”. Graças aos esforços de Víctor Madrigal-Borloz, o mundo passou a compreender melhor o impacto da criminalização de relações entre pessoas do mesmo sexo, a necessidade de reconhecimento legal da identidade de gênero, as barreiras à inclusão social, a importância da coleta de dados relacionados às vidas LGBTI+ e os danos causados pela chamada ‘terapia de conversão’, entre outros. Madrigal-Borloz também destacou as melhores práticas para prevenir a discriminação e realizou visitas à Geórgia, Moçambique, Tunísia, Ucrânia, Estados Unidos e Reino Unido, construindo pontes entre a sociedade civil, líderes políticos e autoridades religiosas. Em um momento em que grupos anti-direitos estão se tornando cada vez mais vocais e direcionando suas comunidades como parte de um ataque mais amplo à igualdade de gênero, é crucial que o trabalho do mandato continue e receba apoio tanto dos Estados quanto da sociedade civil.

Direitos LGBTI+ no Brasil: Impressões após visita de Roberta Clarke, Relatora da CIDH

Brasil, 06 de outubro de 2023 – Em visita promocional ao Brasil facilitada pelo Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade), Roberta Clarke, Relatora dos Direitos das Pessoas LGBTI da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), teve a oportunidade de dialogar com organizações da sociedade civil e ativistas LGBTI+ de Brasília, Fortaleza e Rio de Janeiro. Durante a visita que aconteceu de 18 a 22 de setembro, a Relatora da CIDH pode acompanhar de perto a realidade da população LGBTI+ brasileira que, entre avanços e retrocessos, segue unida como movimento social e na luta pela preservação dos direitos conquistados.

A trajetória da visita de Roberta Clarke além do eixo Rio-São Paulo foi uma estratégia adotada por Raça e Igualdade após diversas escutas da sociedade civil que, constantemente, pleiteava por atenção as diferentes realidades da população LGBTI+ no país. Assim, junto ao apoio do Ministério dos Direitos Humanos, através da Secretária Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, Symmy Larrat, a cidade de Brasília foi crucial para reuniões com gabinetes ministeriais e encontros com o movimento LGBTI+ do Distrito Federal. Vale ressaltar que o estado do Ceará, um dos primeiros na lista de assassinatos de pessoas LGBTI+, com destaque para o assassinato de pessoas trans, segundo o dossiê da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), também fez parte do roteiro para uma escuta ativa com ativistas da região nordeste, e por possuir a Unidade Prisional Irmã Imelda Lima Pontes, voltada exclusivamente para a população carcerária LGBTI+.

Reconhecendo que ainda é cedo para apontar pareceres e conclusões sobre a visita da Relatora LGBTI ao país, Raça e Igualdade traz ao seu público um panorama das impressões compartilhadas por Roberta Clarke após conversar com mais de 15 organizações do movimento LGBTI+ nos estados visitados. As impressões da Relatora sobre a situação da população LGBTI+ no país também foram relatadas durante o evento público realizado no Rio de Janeiro; “Construindo Pontes: Direitos das Pessoas LGBTI+ em Perspectiva Interseccional”, realizado por Raça e Igualdade.

Durante a semana em que a Comissionada esteve no Brasil duas pautas sobre direitos LGBTI+ – já conquistados – estavam em discussão em âmbito nacional. Uma delas refere-se ao casamento civil igualitário que, por inserção do avanço de políticos de extrema direita no Congresso Nacional, voltou a ser questionado em sua validade. Desde 2011 e 2013, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) equipararam a união civil homoafetiva com a heteroafetiva; no entanto, o Projeto de Lei nº 5.167/2009 visa anular esse direito. Embora tenha sido adiada duas vezes devido à pressão de Deputades LGBTI+, a votação segue suspensa, mas pode voltar a pauta no Senado. A outra pauta que estava em discussão, refere-se a uma manipulação também orquestrada pela crescente ideologia anti-gênero que criou um movimento para atacar o uso dos banheiros unissex. O fomento da intolerância por parte de atores políticos conservadores criou uma falsa ideia de que essa era uma pauta urgente em votação.

Fatos estes que, para a Comissionada, refletiram uma outra realidade brasileira, uma vez que dentre os países da região, o Brasil se destaca entre os que mais avançou sobre os direitos LGBTI+. Nesse sentido, Roberta Clarke manifestou preocupação com o que está acontecendo no país e, particularmente, com o tema da violência política de gênero, um tema que tem sido denunciado recorrentemente à CIDH. Para ela, a propagação do discurso de ódio e o crescimento do movimento anti-gênero leva a necessidade de reflexão e de um trabalho em união do movimento social e de lideranças LGBTI+. Isto é, organizar-se estrategicamente para perceber quando vale despender esforços aos ataques de conservadores que visam somente propagar fake news para desarticular a sociedade civil e interromper os encaminhamentos da agenda política LGBTI+.

Diante destes retrocessos, a Comissionada demonstrou sua solidariedade e destacou que a possibilidade de ter vivenciado diferentes contextos pelo país a fez entender, de forma interseccional, os diversos tipos de violência que afetam diferencialmente a comunidade LGBTI+. Mesmo reconhecendo os progressos alcançados através da luta histórica pela visibilidade e direitos, a escuta atenta dos ativistas revelou que ainda há muito por avançar. O momento atual do país demonstrou a existência de uma forte pressão por parte da extrema direita para destruir o progresso alcançado através de políticas de equidade de gênero e de reconhecimento de direitos LGBTI+, e como por meio da propagação de discursos de ódio, pessoas trans sentem-se cada vez mais ameaçadas e sem acesso a direitos básicos.

Assim, Roberta afirmou o compromisso da CIDH na atenção do que estará se passando no país nos próximos meses, visto que o Brasil é um país de dimensão continental e o que se passa em seu território influencia politicamente toda região.

Entre seu diálogo com o movimento social, a Relatora declarou preocupação com as dificuldades relatadas nas documentações exigidas para o processo de retificação civil de nome e de gênero; as diversas formas de violência contra as mulheres lésbicas e a lacuna na provisão de políticas públicas que atendam às suas especificidades, desde a falta de recolhimento de dados à ausência de políticas na área de saúde. Ademais, as mulheres lésbicas relataram veementemente a exclusão social que vivenciam ao demonstrarem afetos em público, práticas de estupro corretivo e de terapias de conversão, além da expulsão de seus lares ao assumirem sua orientação sexual.

A partir da conversa com transmasculinos e transmasculines, a Comissionada pode perceber como a violência enfrentada entre eles/elus é atravessada principalmente pelas questões de raça, classe e território, principalmente no que se refere à violência policial. No Ceará, o tema da educação foi um grande mote entre os ativistas LGBTI+, destacando-se a necessidade de políticas de inclusão escolar já que, diversos estudantes LGBTI+ abandonam suas instituições de ensino, seja por práticas de LGBTIfobia, bullying, desrespeito a identidade de gênero, entre outras formas de discriminação, e nem sequer chegam a concluir o ensino fundamental. Nesse contexto, no dia 19 de setembro, o Conselho Nacional pelos Direitos da População LGBTQIA+, publicou uma resolução estabelecendo diretrizes para garantir a inclusão e respeito à identidade de gênero nas instituições de ensino.

Em Brasília, além da agenda com gabinetes ministeriais, Roberta Clarke encontrou-se com a diretoria do Conselho Nacional LGBTQIA+ e teve a oportunidade de conhecer as atuais demandas da agenda política LGBTI+, em vistas da retomada democrática no país. A reunião com ativistas da região aconteceu no Distrito Drag com uma mesa redonda que debateu temas como a necessidade de políticas de assistência social para a população LGBTI+, como o fomento das casas de acolhimento e o acesso à saúde da população trans na questão hospitalar.

Durante sua passagem pelo Rio de Janeiro, a Comissionada recebeu o relatório da Articulação Brasileira de Lésbicas (ABL) que versa sobre a situação das mulheres lésbicas no país; e recebeu o ‘Dossiê sobre o Lesbocídio’, após conversar com uma das autoras. Ademais, lhe foi entregue os dossiês sobre assassinato e violências contra travestis e transexuais brasileiras em 2022; além do dossiê ‘Trans Brasil’, sobre a situação destas no sistema prisional, sendo ambos documentos realizados pela ANTRA.

Por fim, Raça e Igualdade agradece profundamente ao movimento LGBTI+ brasileiro que mobilizou ativistas de diversas regiões do país para que pudessem transmitir à Relatora da CIDH suas experiências de vida e suas trajetórias de lutas por direitos em um país que ser e existir como pessoa LGBTI+ é um ato de coragem. Além disso, agradecemos à CIDH por aceitar o nosso convite e dialogar com o movimento civil LGBTI brasileiro. Diante da nossa missão, incentivar a vinda de relatores e especialistas de mecanismos internacionais concretiza-se como mais um passo na garantia de visibilidade, não discriminação e a plena realização dos direitos humanos. Deste modo, solicitamos à CIDH que considere as seguintes recomendações ao Estado brasileiro:

1 – Criação de um Conselho Nacional para o enfrentamento ao discurso de ódio e disseminação de notícias falsas com viés interseccional, tendo em vistas à violência e os ataques sofridos pela população LGBTI+ no país;

2 – Estabelecimento de políticas e projetos de lei que garantam constitucionalmente o casamento igualitário homoafetivo, além da garantia de segurança de pessoas trans em banheiros públicos conforme suas identidades de gênero e a pluralidade de banheiros unissex;

3 – Levantamento de dados desagregados referentes à população LGBTI+, seja através do Censo Nacional ou através de pesquisas que fomentem a criação de políticas públicas específicas para esta população.

4 – Treinamento e políticas de educação destinadas à força de segurança pública para que estas possam garantir a segurança das pessoas LGBTI+ brasileiras.

5 – Construção de uma política de enfrentamento à violência política de gênero, com previsão de medidas de proteção a parlamentares LGBTI+.

 

Relatora dos Direitos das Pessoas LGBTI, Roberta Clarke, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, realiza visita ao Brasil para dialogar com ativistas LGBTI+

Brasil, 14 de setembro de 2023 – De 18 a 22 de setembro, Roberta Clarke, Relatora dos Direitos das Pessoas LGBTI, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), realizará uma visita ao Brasil junto ao seu gabinete institucional. A visita promocional da Comissionada é uma iniciativa do Instituto Internacional sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) que junto às organizações da sociedade civil LGBTI+, facilitará encontros com lideranças e ativistas de direitos humanos, visando uma escuta ativa da Comissionada sobre os padrões violações dos direitos e o atual cenário sociopolítico dessa população no Brasil.

A agenda de Roberta Clarke contempla as cidades de Brasília, Fortaleza e Rio de Janeiro, nas quais terá reuniões oficiais com autoridades governamentais, além de reuniões com organizações LGBTI+. Esta visita ao Brasil tem em vista uma maior aproximação da CIDH perante a sociedade civil defensora dos direitos LGBTI+, e conhecer os principais desafios relacionados aos diferentes atravessamentos que afetam esta população além do eixo sudeste do país.

Ademais, sua equipe irá ministrar workshops com as organizações para oferecer capacitação técnica sobre incidência política internacional, com foco em monitoramento e medidas cautelares, com propósito de instrumentalizar as organizações sobre a CIDH, desde seu funcionamento e composição até os meandros técnicos para denunciar as violações de direitos humanos perante a Comissão. No Brasil, a vereadora do município de Niterói, Benny Briolly, tornou-se um caso paradigmático de medidas cautelares concedidas pela CIDH, pois é a primeira travesti a ter medidas cautelares outorgadas pela Comissão.

“Em 2018, num contexto pré pandemia, a CIDH realizou uma visita ao Brasil e, em 2021, publicou um relatório sobre a situação dos direitos humanos no país, no qual há recomendações específicas sobre a população LGBTI+. Nesse sentido, esta visita torna-se uma boa oportunidade para que a Relatora LGBTI veja se houve mudança de cenário nos padrões de violações de direitos desde que se emitiu o informe”, explica Zuleika Rivera, Coordenadora do Programa LGBTI de Raça e Igualdade.

Agenda Brasília e Fortaleza

Nos dias 18 e 19 de setembro, segunda e terça-feira, a Comissionada estará em Brasília em reuniões privadas com entidades do governo brasileiro. As reuniões com os gabinetes ministeriais e órgãos de justiça têm por objetivo conhecer as boas práticas do país no combate a LGBTIfobia, tendo em vista que o STF reconheceu LGBTIfobia como crime, equiparando-a ao crime de racismo e injúria racial. Fato este, que põe o Brasil na vanguarda dos países da região em leis protetivas a esta população. À tarde, junto às organizações LGBTI+ do Distrito Federal será realizado, no Distrito Drag, um seminário sobre o sistema de monitoramento da CIDH e, em seguida, uma mesa redonda sobre expressão de gênero como liberdade de expressão.

Na quarta-feira, 20 de setembro, Roberta Clarke chega à Fortaleza para dialogar com o movimento LGBTI+ da região nordeste, oferecendo capacitação sobre a CIDH. Tendo em conta que o Brasil também conta com unidades prisionais destinadas a população LGBTI+, a Comissionada irá visitar em Fortaleza, a Unidade Prisional Irmã Imelda Lima Pontes, voltada exclusivamente para a população carcerária LGBTI+.

Agenda Rio de Janeiro – Evento Público

No dia 21 de setembro, na cidade do Rio de Janeiro, a Relatora LGBTI da CIDH será a anfitriã do evento público “Construindo Pontes: Direitos das Pessoas LGBTI+ em Perspectiva Interseccional”, promovido por Raça e Igualdade. O evento presencial será realizado no auditório do hotel Windsor Guanabara, das 18h às 20h, com tradução simultânea em inglês-português, sendo necessária inscrição prévia para participação presencial. Roberta Clarke irá compartilhar a visão da Comissão Interamericana diante do crescimento dos casos de violência política contra pessoas LGBTI+ no Brasil e escutar as perspectivas dos ativistas diante do atual panorama dos direitos LGBTI+.

Este espaço de diálogo aberto com a sociedade civil contará com a presença de Symmy Larrat, Secretária Nacional sobre os Direitos das Pessoas LGBTQIA+ do Ministério dos Direitos Humanos do Brasil. Além disso, a mesa de painelistas terá a participação de lideranças LGBTI+ como Bruna Benevides, Secretária Nacional de Articulação Política da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA); Michele Seixas, Coordenadora Política Nacional da Articulação Brasileira de Lésbicas; e OMari Scaramboni, Integrante do Fórum Estadual de Travestis e Transexuais (Fórum TT-RJ), do Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (IBRAT) e atleta do time de futebol TransUnited.

No dia 22 de setembro, sexta-feira, Roberta Clarke será a ilustre convidada da inauguração do escritório físico de Raça e Igualdade, sediado no centro do Rio de Janeiro. Com a presença da Junta Diretiva, organizações parceiras e aliadas, Raça e Igualdade dará o pontapé em uma nova fase da sua atuação no Brasil. O Diretor Executivo do Instituto, Carlos Quesada, junto ao Diretor do Programa Brasil, Rodnei Jericó da Silva, realizarão o ato de inauguração celebrando os 4 anos de Raça e Igualdade no Brasil.

Sobre Roberta Clarke

A Comissionada Roberta Clarke foi eleita no 51º Período Ordinário de Sessões da Assembleia Geral da OEA em 12 de novembro de 2021, por um período de quatro anos, de 1º de janeiro de 2022 a 31 de dezembro de 2025. Ativista pela justiça social e igualdade de gênero, Roberta Clarke liderou os Escritórios Regionais da ONU Mulheres na África Oriental e Austral, Ásia-Pacífico, Caribe e Líbia. Antes de sua carreira nas Nações Unidas, ela atuou como advogada em Trinidad e Tobago. Atualmente, preside o Comitê de Assédio do Tribunal de Justiça do Caribe.

Serviço:

Visita Relatora LGBTI da CIDH, Roberta Clarke, ao Brasil

Evento Público: Construindo Pontes: Direitos das Pessoas LGBTI+ em Perspectiva Interseccional.
Data e Hora: 21 de setembro, quinta-feira, das 18h às 20h.
Local:  Hotel Windsor Guanabara – Av. Pres. Vargas, 392 – Centro
Inscrição Presencial: https://x.gd/lA9rn

O evento contará com tradução simultânea em português-inglês.

Contato para imprensa:
Paolla Moura – Comunicadora para o Instituto Raça e Igualdade no Brasil
Email: jornalista@raceandequality.org

Raça e Igualdade condena o uso excessivo e violento da força policial no caso da Chacina do Guarujá

Brasil, 02 de agosto de 2023 – O Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) rechaça a ação brutal cometida por agentes da lei no caso da Chacina do Guarujá, que instaurou dias de terror durante o último final de semana de julho, na região do Guarujá, na Baixada Santista de São Paulo, por meio de uma política de medo, tortura e execução sumária. Esta chacina é resultado de uma vingança por parte da força policial em represália à morte do agente Patrick Reis, morto durante uma operação de combate ao tráfico na região. E alertamos, uma força militar estatal que age nos termos da barbárie e da terra sem lei é balizada na impunidade e nos privilégios das funções públicas das forças de segurança, que vem sendo chancelada pelo governador Tarcísio de Freitas e pelo Secretário de Segurança Pública do Estado, Guilherme Derrite.

Até o momento, a violência policial resultou em 16 mortes, vitimizando moradores de bairros periféricos, onde o viés do perfilamento racial é evidente diante do terror instaurado nas favelas da região. Uma força policial militar estatal que executa cidadãos em seus lares deve ser investigada por infringir os direitos humanos mais básicos desta população! Exigimos apuração transparente e instamos as autoridades brasileiras a exigir imparcialidade nas investigações e a responsabilizar o Governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que desqualificou as denúncias da população e, mesmo diante do palco de guerra formado, ordenou através da sua necropolítica de segurança que as ações policiais, denominada ‘Operação Escudo’, prossigam durante mais 30 dias na região.

Esta semana, o Comitê de Monitoramento do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos da ONU publicou recomendações ao Estado brasileiro, dentre as quais destaca-se o termo execuções extrajudiciais por agentes da lei: “O Comitê expressou preocupação com o perfilamento racial e a falta de responsabilização pelo uso excessivo da força e por execuções extrajudiciais por parte de agentes da lei. Pediu ao Brasil que redobrasse seus esforços para investigar todas essas alegações, processar os autores e indenizar as vítimas, incluindo os casos relacionados à invasão no Complexo da Maré e às operações policiais no Jacarezinho e na Vila Cruzeiro.” Desse modo, urgimos aos mecanismos internacionais de direitos humanos pelo monitoramento constante sobre o uso excessivo da força policial no Brasil.

Nos solidarizamos com as diversas famílias das comunidades da região do Guarujá e lamentamos pelas vidas perdidas pela cruel política de segurança que vitimiza, oprime e silencia pessoas negras e periféricas. Diante dos fatos, levamos ao Estado brasileiro as seguintes recomendações:

  • Transparência nas informações, seja na apuração do caso seja nas informações divulgadas sobre o número de mortes e o perfil das vítimas;
  • A aplicação da Convenção Interamericana contra o Racismo e Formas Correlatas de Intolerância (CIRDI) que como um instrumento de pacto jurídico internacional prevê ações efetivas antidiscriminatórias com força de lei;
  • Criação de leis e mecanismos com viés interseccional e antirracista para coibir e punir ações policiais violentas em favelas;
  • Investigação imparcial e responsabilização imediata dos agentes policiais envolvidos nesta operação, além do Governador Tarcísio e o Secretário de Segurança Pública do Estado, Guilherme Derrite por suas posturas de anuência e permissividade diante da chacina.

 

Vozes transcendentais: Arte e Cultura como formas de Resistência e Orgulho

Washington D.C., 28 de junio de 2023.- En el Día Internacional del Orgullo LGBTI+, el Instituto Internacional sobre Raza, Igualdad y Derechos Humanos (Raza e Igualdad) desea dedicar este artículo a reconocer, celebrar y visibilizar la presencia de personas LGBTI+ de la región en el campo del arte y la cultura que siempre han sido formas de resistencia, sobrevivencia y orgullo para las personas LBGTI+. Sus disruptivas formas de expresión artística han revolucionado este sector, no solo enriqueciéndolo sino desafiado y transformado las narrativas dominantes de la cisheteronormatividad.

Desde el enfoque de los derechos humanos, en el informe A/HRC/14/36 de la Relatoría Especial sobre Derechos Culturales de las Naciones Unidas señala que, en muchos aspectos, los derechos culturales son esenciales para el reconocimiento y el respeto de la dignidad humana. A través de estos, se protegen el desarrollo y la expresión de diversas visiones del mundo -individuales y colectivos-, y abarcan libertades importantes relacionadas con cuestiones de identidad[1].

En ese sentido, la representación y la visibilidad digna de grupos históricamente vulnerados, como la población LGBTI+, son fundamentales para reivindicar sus cuerpos e identidades, y promover sus derechos humanos. “Combate el estigma y la discriminación. La representación positiva en la cultura contribuye a desafiar los estereotipos y prejuicios negativos que existen la entorno a la diversidad sexual y de género”, menciona Alex Aguirre, Investigador en Derechos Humanos del Instituto para la paz y el Desarrollo (Ipades) de Nicaragua, quien señala que esto también sucede con une misme cuando los personajes y narrativas reflejan experiencias propias que contribuyen a desarrollar mayor confianza y aceptar su identidad de género u orientación sexual sin sentir vergüenza o culpa.

“La manifestación artística diversa visibiliza, expone, retrata y enriquece. Poder disfrutar del arte de manos de personas de la diversidad sexual y de género brinda una perspectiva diferente al público, humanizando y volviendo suyas las expresiones”, dice Fhran Medina, abogado y activista por los derechos de las personas LGBTI+ de Fraternidad Trans Masculina Perú.

Desde el significado del arte y la cultura, más que tener un fin instrumental, Guillermo Valdizán dice en su libro Creación Heroica que “las formas de producción cultural están íntimamente ligadas a los procesos de transformación de las sociedades”[2]. Es decir, la producción cultural no existe sino en un contexto social, político y económico determinado y ha continuado presente a lo largo de la historia de las sociedades; por ello, son parte del proceso social y no solo una herramienta. Como dice Sol Ámbar Sánchez Latorre, Directore de incidencia de la Fundación GAAT de Colombia, existe una apropiación de la esfera cultural más visible por parte de las personas LGBTI+ que produce nuevas representaciones y reflexionan sobre la sexualidad y el género, y desde este espacio se gestan transformaciones culturales también.

A continuación, las contrapartes de Raza e Igualdad recomiendan algunos ejemplos notables de producciones culturales que han contribuido a la visibilidad de las personas LGBTI+:

Yunior Pino, fotógrafo y activista cubano: “Somos personas valerosas, dotadas de talentos y dones; educamos para erradicar los tabúes que por generaciones han causado mucho daño y discriminación. Recomiendo el filme cubano titulado “Fátima” porque cuenta la cruda realidad que vive en su mayoría la comunidad LGBTI+ en Cuba, ante una sociedad machista, discriminatoria y un sistema que obliga a ejercer la separación familiar y la prostitución”.

Sol Ámbar Sánchez Latorre, Directore de incidencia de la Fundación GAAT de Colombia: “Me gustaría que el trabajo de Kia sonorica, una artista trans paraguaya, pudiera conocerse más. Ella también es historiadora anticolonial, conoce bien la historia del arte; y ahora es una de las artistas Latinoamericanas pioneras en el uso de la inteligencia artificial para producir obras artísticas”.

Fhran Medina, abogado y activista peruano: “Antay es mi cantautor peruano favorito, no solo por ser un gran cantante, sino por el trabajo y el enorme corazón que le pone a cada canción y presentación. Sus letras son ternura y también mucho arte. Como cantautor trans, lleva consigo muchas historias y vivencias de la población trans. El videocip de la canción “Júrame” es algo que todas las personas deberíamos ver, pueden encontrar más de sus producciones en Spotify y Youtube”.

Articulación Brasileña de Lésbicas – Rede ABL: “Recomendamos el trabajo de Bia Ferreira en la música porque es una mujer negra y ‘sapatão’* que trae en sus canciones verdaderos ‘evangelios’ de liberación. Es importante que otras personas conozcan su trabajo porque explica de forma didáctica la causa y las soluciones a diversas cuestiones sociales”.

Alex Aguirre, Investigador en Derechos Humanos del Instituto para la paz y el Desarrollo (Ipades) de Nicaragua: “Recomiendo a la artista Ru Paul, es una Drag Queen icónica y presentadora del programa RuPaul’s Drag Race, ha sido una figura importante en la cultura LGBTI+ y ha promovido la aceptación y la celebración de la diversidad”.

En conclusión, la visibilidad de las personas LGBTI+ en el campo del arte y la cultura es un indicador poderoso del progreso en materia de derechos humanos. A través del cine, la música, la danza, el teatro, arte visual y más, se ha conquistado un espacio en el que estas voces trascendentales pueden ser escuchadas y sus experiencias pueden ser representadas de forma más auténtica. Raza e Igualdad reafirma su compromiso de promover la visibilidad y la representación de las personas LGBTI+ en todos los ámbitos de la vida y les desea un mes del Orgullo con mucha música, arte y cultura. Todas las personas merecen vivir en una sociedad sin violencia, más justa y sin discriminación. ¡Derechos Humanos Siempre!

*’Sapatão’ es una palabra de orgullo que hace referencia a las mujeres lesbianas de Brasil. Es similar a que el movimento trans valoró la palabra ‘travesti’.

…………

[1] Report of the independent expert in the field of cultural rights, Ms. Farida Shaheed, submitted pursuant to resolution 10/23 of the Human Rights Council. Available at https://documents-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/G10/124/40/PDF/G1012440.pdf?OpenElement

[2] Valdizán, Guillermo (2021). Creación Heroica: Neoliberalismo, políticas culturales y estrategia comunitaria en el Perú del siglo XXI. Lima: RGC Ediciones

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