Fórum Permanente das Nações Unidas sobre Afrodescendentes realizará consulta regional em Bogotá

Fórum Permanente das Nações Unidas sobre Afrodescendentes realizará consulta regional em Bogotá

Bogotá, 16 de setembro de 2025. Nesta sexta-feira, 19 de setembro, o Fórum Permanente das Nações Unidas sobre Afrodescendentes realizará a consulta regional para a América Latina de língua espanhola, um espaço que faz parte do processo de construção da futura Declaração das Nações Unidas sobre o respeito, à proteção e a efetividade dos direitos humanos das pessoas afrodescendentes.

Este encontro, que terá início às 9h da manhã na sede principal do Ministério das Relações Exteriores da Colômbia e reunirá mais de 60 líderes, faz parte das consultas regionais que o Fórum Permanente está realizando em diferentes partes do mundo, com o objetivo de coletar contribuições e garantir que as vozes das comunidades afrodescendentes sejam levadas em consideração na elaboração da Declaração. A jornada em Bogotá será a segunda consulta regional, após a realizada em dezembro de 2024 em Barbados, com foco no Caribe.

De acordo com a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), cerca de 200 milhões de afrodescendentes vivem na região, o equivalente a 30% da população total. No entanto, persistem barreiras estruturais que limitam seu acesso à justiça, participação política, educação, saúde e emprego digno. Essas lacunas se aprofundam no caso das mulheres afrodescendentes, que enfrentam de forma interseccional os efeitos do racismo e do sexismo. A consulta regional em Bogotá, dirigida às comunidades afrodescendentes dos países de língua espanhola da América Latina, busca gerar um diagnóstico sobre as múltiplas formas de discriminação e racismo estrutural na região e, ao mesmo tempo, consolidar propostas que fortaleçam o projeto de Declaração.

​​A jornada, que será desenvolvida por meio de um diálogo amplo e participativo, se concentrará em temas prioritários identificados pelo Fórum Permanente, entre eles: o reconhecimento e o combate ao racismo sistêmico e estrutural; a justiça reparadora diante dos legados do colonialismo, da escravidão, do apartheid e do genocídio; os direitos coletivos dos povos afrodescendentes; o desenvolvimento sustentável e a redução das desigualdades; bem como questões urgentes e emergentes em matéria de direitos humanos, como o impacto da inteligência artificial, as mudanças climáticas, a injustiça ambiental e a necessidade de reformar a ordem econômica internacional.

O Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) acompanha a participação de destacadas líderes da região, que contribuirão para a discussão com suas experiências e trajetórias. Entre elas estão: a boliviana Paola Yánez, coordenadora da Rede de Mulheres Afro-latino-americanas, Afro-caribenhas e da Diáspora; a hondurenha Mirtha Colón, presidente da Organização Negra Centro-americana (ONECA); a dominicana María Bizenny Martínez, coordenadora do Departamento de Direitos Humanos e Incidência Política da MOSCTHA; a colombiana Luz Marina Becerra Panesso, representante legal da Coordenação de Mulheres Afrocolombianas Deslocadas em Resistência (La Comadre); e a mexicana Teresa Mojica, presidente da Fundação Afromexicana Petra Morga. Sua participação permitirá visibilizar as realidades específicas que as mulheres afrodescendentes enfrentam diante da violência racial, do deslocamento forçado e da exclusão.

Vozes da diáspora: Mulheres afrodescendentes em resistência e liderança global

Como prelúdio à consulta, na quinta-feira, 18 de setembro, às 16h, no Hotel Suite Jones (Chapinero, Bogotá), será realizado o diálogo Vozes da diáspora: Mulheres afrodescendentes em resistência e liderança global. Este encontro contará com a participação das líderes mencionadas e do professor Justin Hasford, membro do Fórum Permanente da ONU sobre Afrodescendentes, cuja trajetória nos Estados Unidos e articulação com movimentos afrodescendentes da diáspora permitirão uma análise comparativa entre a América Latina e o Norte Global.

O evento, organizado pela Raza e Igualdade, contará com interpretação simultânea em inglês e espanhol e busca consolidar um espaço de intercâmbio e construção coletiva, fortalecendo o vínculo entre as lutas históricas das comunidades afrodescendentes na América Latina e aquelas que se desenvolvem em outros contextos internacionais.



A Raça e Igualdade realizará na Colômbia dois encontros da Escola Kátia Tapety

Bogotá, 16 de setembro de 2025 – O Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade), em parceria com o Grupo de Acción y Apoyo a personas Trans (GAAT) e a Fundación Somos Identidad, realizará na Colômbia dois encontros da Escola de Formação Política Kátia Tapety, que acontecerão no dia 23 de setembro em Cali e no dia 26 em Bogotá.

A Escola de Formação Política Kátia Tapety é um projeto do Instituto criado no Brasil em 2022, com o objetivo de capacitar mulheres LBTI, negras e indígenas para que possam participar plenamente em espaços de poder e tomada de decisões. Desde a sua criação, mais de 60 líderes no Brasil participaram dessas jornadas de capacitação.

O programa leva o nome de Kátia Tapety, reconhecida como a primeira travesti eleita por voto direto no Brasil em 1992, cujo legado político é uma referência na América Latina para a defesa dos direitos humanos e a ampliação da participação política de mulheres trans, travestis, negras e indígenas.

Durante os encontros que serão realizados na Colômbia, serão desenvolvidas sessões sobre os seguintes temas:

  • Conceitos e alcance da participação política.
  • Manifestações e consequências da violência política.
  • Mecanismos internacionais de proteção dos direitos humanos.
  • Intercâmbio de experiências e aprendizados da Escola no Brasil.

Se você é uma pessoa LBTI, negra ou indígena e deseja participar deste espaço, inscreva-se no link a seguir. As vagas são limitadas: https://forms.cloud.microsoft/r/sckf9qMPXt 

Orgulho em resistência: Desafios persistentes para os direitos LGBTI+ na América Latina e no Caribe

Washington, D.C., 28 de junho de 2025.– O Dia do Orgulho LGBTI+ nasceu de um ato de protesto e resistência contra a discriminação e a violência. Embora tenha sido um importante ponto de virada na luta pelos direitos das pessoas com orientações sexuais e identidades de gênero diversas, a verdade é que, 56 anos após os protestos de Stonewall, em 28 de junho de 1969, em Nova York, a resistência não é passado — é presente, especialmente em uma região que marginaliza e violenta pessoas LGBTI+.

Em comemoração ao Dia do Orgulho LGBTI+, o Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) reconhece que a América Latina e o Caribe têm avançado significativamente em termos legislativos, com medidas como a proteção contra discriminação e violência por orientação sexual e identidade de gênero, o casamento igualitário e o reconhecimento da identidade de gênero para pessoas trans e não-binárias.

No entanto, destacamos que a região ainda enfrenta sérios desafios para a efetiva implementação dessas leis, além de registrar números alarmantes de violência e assassinatos contra pessoas LGBTI+. Esse cenário se agrava com o aumento dos discursos de ódio promovidos por grupos anti-direitos, o estabelecimento de governos autoritários em diversos países e a drástica redução da cooperação internacional.

O assassinato de pessoas por sua orientação sexual ou identidade de gênero é uma realidade na América Latina — tanto que a região é considerada a mais perigosa do mundo para pessoas trans, especialmente mulheres trans. Nesse contexto, Brasil, México e Colômbia lideram os números: segundo o Trans Murder Monitoring, entre outubro de 2023 e setembro de 2024, foram registrados 106 assassinatos no Brasil, 71 no México e 25 na Colômbia.

Na Colômbia, o brutal assassinato da ativista trans e defensora de direitos humanos Sara Millerey, ocorrido em abril de 2025, inspirou a luta pela aprovação do projeto de Lei Integral Trans, que foi formalmente apresentado ao Congresso da República nos últimos dias, marcando um marco histórico na luta pelo reconhecimento e garantia dos direitos das pessoas trans e não-binárias no país.

Por outro lado, o fechamento do espaço cívico em países como Cuba e Nicarágua, bem como a aprovação de leis que restringem e condicionam o trabalho de organizações não governamentais na área de direitos humanos — como ocorreu recentemente em El Salvador e no Peru — representam um grave retrocesso na luta pelos direitos das pessoas LGBTI+.

Soma-se a isso a redução repentina e drástica da cooperação internacional, a partir da suspensão de fundos por parte do governo dos Estados Unidos, o que coloca em risco anos de trabalho comunitário, redes de proteção, serviços básicos (como saúde, abrigo e assistência jurídica) e participação política. Sem esse apoio, muitas organizações não conseguem se manter, especialmente em contextos onde não existem políticas públicas reais de inclusão.

Diante dessa realidade, reafirmamos nosso compromisso com a promoção e defesa dos direitos das pessoas LGBTI+, especialmente junto aos mecanismos internacionais de proteção dos direitos humanos das Nações Unidas e do Sistema Interamericano. Mas também fazemos um chamado à comunidade internacional, aos governos e à sociedade civil para proteger essa população e garantir seus direitos.

Hoje, mais do que nunca, o orgulho deve se traduzir em ação — porque, para as pessoas LGBTI+, resistir não é um ato simbólico: é uma forma de sobrevivência.

As organizações que compõem RegionaR / Fórum Regional de Direitos Humanos pedem a garantia e o respeito ao trabalho das organizações e defensores de direitos humanos nas Américas

23 de maio de 2025. – Diante das prisões de defensores dos direitos humanos em El Salvador e na Venezuela e da possível criminalização de seu trabalho, as organizações que compõem o Fórum Regional de Direitos Humanos (RegionaR) expressam sua preocupação com a estigmatização e a perseguição estatal contra organizações e indivíduos dedicados à promoção e defesa dos direitos fundamentais. Por isso, apelam aos Estados envolvidos para que cumpram a sua obrigação de garantir esse trabalho em condições de liberdade e segurança, e instigam a comunidade internacional a tomar medidas urgentes destinadas a fortalecer a democracia e o Estado de Direito na América Latina e no Caribe.

Como organizações que defendem o respeito à dignidade e à integridade humana, com base no direito internacional dos direitos humanos e com uma abordagem interseccional, consideramos extremamente desconcertantes as recentes prisões de Eduardo Torres, advogado venezuelano e membro da ONG Provea, e Ruth López, chefe da Unidade Anticorrupção e Justiça da organização Cristosal em El Salvador.

No caso de Torres, sua família e representantes da organização Provea relataram que ele estava sendo submetido a um desaparecimento forçado desde a tarde de sexta-feira, 9 de maio, pois não tinham informações sobre seu paradeiro ou estado de saúde, após ele ter contactado sua esposa por telefone e informado que estava a caminho de casa em Caracas. Somente na terça-feira, 13 de maio — depois que a ONG Provea fez várias denúncias públicas sobre seu desaparecimento, que duraram quase 5 dias, e entrou com um pedido de habeas corpus perante a Câmara Constitucional do Supremo Tribunal de Justiça, que ainda não tem data para resposta — o procurador-geral Tarek William Saab confirmou que Torres foi detido por seu suposto envolvimento em um complô para “gerar violência” nas eleições regionais e legislativas de 25 de maio. Ele também observou que as denúncias sobre o desaparecimento forçado de Torres feitas por Óscar Murillo, coordenador geral do PROVEA, constituem “ataques ao sistema de justiça venezuelano contra grupos desestabilizadores e contrários à paz da República, que fazem parte de uma campanha sustentada para garantir a impunidade”. De acordo com informações não oficiais divulgadas pela PROVEA, ele aparentemente está detido no Helicóptero do SEBIN, sem que advogados de confiança nem familiares tenham podido vê-lo.

Em El Salvador, Ruth López foi presa às 23h do domingo, 18 de maio, em sua casa. Policiais da Polícia Nacional chegaram e informaram que ela era procurada pelo Ministério Público para ser formalmente acusada de peculato. Imediatamente, a organização Cristosal e outras organizações da sociedade civil do país alertaram sobre o desaparecimento forçado de López, exigindo das autoridades informações oficiais sobre seu paradeiro, acesso pleno e imediato à sua equipe jurídica e garantias efetivas de sua integridade física, psicológica e jurídica. Somente na terça-feira, 20 de maio, sua mãe, Eleonor Alfaro, disse à mídia nacional que pôde vê-la ao meio-dia na Divisão de Trânsito Terrestre da Polícia Nacional Civil.

Observamos com grande preocupação que, em ambos os casos, está sendo aplicado um padrão de ataques que é prática comum em Cuba e na Nicarágua contra defensores dos direitos humanos e jornalistas: desaparecimentos de curto ou longo prazo e subsequente criminalização, estigmatização e ameaças de criminalização contra membros de suas organizações. Deve-se notar também que a prisão de Ruth López ocorreu dias depois do presidente Nayib Bukele, em 14 de maio, anunciar sua intenção de implementar uma “lei de agentes estrangeiros” para impor um imposto de até 30% sobre ONGs ativas no país. Dia 21 de maio, foi aprovada a lei, assim como ocorreu recentemente no Peru, com a alteração da Lei nº 27.692, que fortalece o controle estatal sobre as organizações da sociedade civil por meio da Agência Peruana de Cooperação Internacional (APCI).

Diante desses acontecimentos, as organizações que compõem a RegionaR fazem o seguinte apelo aos estados da região, e principalmente aos governos de El Salvador e da Venezuela:

  • Que cesse a criminalização da defesa dos direitos humanos, do Estado de Direito e do combate à corrupção, e que o trabalho dos defensores e das organizações de direitos humanos seja reconhecido e protegido.
  • Exigir a libertação imediata e integral do advogado e membro da Provea Eduardo Torres, e garantias pelo trabalho realizado por essa organização, incluindo seu coordenador geral, Oscar Murillo, bem como por todos os defensores e grupos de direitos humanos na Venezuela.
  • Libertar imediata e integralmente Ruth López, chefe da Unidade Anticorrupção e Justiça de Cristosal , e garantir sua integridade física e psicológica e a segurança dos defensores dos direitos humanos em El Salvador.

Da mesma forma, RegionaR instiga as organizações internacionais de direitos humanos e a comunidade diplomática a se juntarem a este chamado e convoca todos os Estados da região a tomarem medidas urgentes para reconhecer e garantir a contribuição que os defensores e as organizações de direitos humanos fazem para o fortalecimento da democracia e do Estado de Direito na América Latina e no Caribe.

 

RegionaR / Fórum Regional de Direitos Humanos:

 

RegionaR / Fórum Regional de Direitos integrado por, entre outras organizações, Argentina : Advogados pelos Direitos Sexuais ( AboSex ) e o Centro de Estudos Legais e Sociais (CELS). Brasil : Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras de Ruas Quilombolas (CONAQ); IEPE-Instituto de Pesquisa e Treinamento Indígena ; Helen Keller Coletivo Feminista de Mulheres com Deficiência. Bolívia: Serviço Jesuíta de Migrantes da Bolívia (SJR Bolívia). Costa Rica: Serviço Jesuíta para Migrantes da Costa Rica (SJR-CR) e Associação de Cidadãos ACCEDER. Colômbia: Comissão Colombiana de Juristas (CCJ); Conferência Nacional de Organizações Afro-Colombianas (CNOA); Ação Legal ILEX; Grupo Comunicarte; Grupo de Ação e Apoio a Pessoas Trans (Fundação GAAT); Consultoria para Direitos Humanos e Deslocamento (CODHES) e Fundação Mahumpi Venezuela. Chile: Associação Mapuche Tain Adkimn . Equador: Centro de Apoio e Proteção aos Direitos Humanos SURKUNA; Associação ALFIL; Oficina de Comunicação Feminina (TCM). Guatemala: Rede de Jovens para Advocacia Política (Incide Joven) e Associação Las Crisálidas. Honduras: Equipe Jurídica de Direitos Humanos e Centro de Direitos da Mulher de Honduras. Nicarágua: Coletivo de Direitos Humanos Nicarágua Nunca Mais e Unidade de Defesa Legal (UDJ). Paraguai: Coordenadora dos Direitos da Criança e do Adolescente do Paraguai. Peru: Associação para os Direitos Humanos (APRODEH); Estudo para a Defesa dos Direitos da Mulher (DEMUS); Centro Loyola Ayacucho; Fundação Ecumênica para o Desenvolvimento e a Paz (FEDEPAZ) e Instituto de Defesa Legal (IDL). República Dominicana: Movimento de Mulheres Dominicano-Haitianas (MUDHA); Organização Trans Queens da noite e Movimento Sociocultural dos Trabalhadores Haitianos (MOSCTHA); Uruguai: Organização Social Salvador. Venezuela: Programa Venezuelano de Educação-Ação em Direitos Humanos (PROVEA); Comitê de Familiares das Vítimas do Caracazo (COFAVIC). Organizações regionais: Rede Latino-Americana e Caribenha de Jovens por Direitos (REDLAC); Serviço Jesuíta aos Refugiados para a América Latina e o Caribe (JRS LAC ) Artigo 19 México e América Central; Fórum Indígena Abya Yala (FIAY); Trabalhadores Latino-Americanos Grupo (LAWG); e Rede de Mulheres Afro-Latinas, Afro-Caribenhas e da Diáspora. (REDMAAD). Organizações internacionais: Women’s Link Worldwide (WLW); Centro de Direitos Reprodutivos; Sinergia Iniciativas pelos Direitos Humanos ; Serviço de Amigos Americanos Comitê (AFSC) e Instituto Internacional sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos.

 

Contato: velez@raceandequality.org

Nicarágua: Sete Anos Após Os Protestos De Abril, As Vítimas Da Repressão Continuam Exigindo Justiça

Washington, DC, 17 de abril de 2025.– Este mês de abril marca o sétimo aniversário dos protestos que desencadearam uma onda de repressão violenta por parte do regime liderado por Daniel Ortega e Rosario Murillo. Segundo a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e seu Mecanismo Especial de Acompanhamento para a Nicarágua (MESENI), a repressão resultou em 355 vítimas fatais, mais de 2.000 pessoas feridas, mais de 2.000 detidas e mais de 440.000 exiladas. As vítimas não apenas não receberam a justiça que merecem, como foram perseguidas por um Estado que insiste em retalia-las.

A Raça e Igualdade expressa sua solidariedade com todas as vítimas da repressão e reafirma seu compromisso de continuar acompanhando-as até que a justiça seja feita.

Sete anos após o início dos protestos de abril na Nicarágua, de acordo com o Mecanismo de Reconhecimento de Presos Políticos, 52 pessoas continuam detidas arbitrariamente por motivos políticos, sendo 11 delas em situação de desaparecimento forçado — entre as quais cinco são mulheres. Mais de 450 pessoas foram destituidas de sua nacionalidade. O jornalismo independente não pode exercer suas funções no país e a defesa dos direitos humanos e da liberdade de associação foi gravemente afetada pelo fechamento de mais de 5.400 organizações da sociedade civil e pela confiscação de seus bens.

Além disso, uma profunda reforma constitucional que entrou em vigor em fevereiro deste ano completou a configuração de um regime ditatorial co-governado por Ortega e Murillo. Como consequência dessa reforma, mais de 80.000 civis foram armados e equipados com máscaras de esqui para aterrorizar a população e submetê-la à vontade de Daniel Ortega e Rosario Murillo de se manterem no poder.

Durante esses sete anos, a Raça e Igualdade acompanhou as vítimas da repressão em sua busca por justiça, bem como para lhes garantir a proteção conferida por medidas cautelares e provisórias diante dos graves riscos que enfrentam. Junto com outras organizações da sociedade civil, desenvolvemos extensas ações de advocacy e litígio com o objetivo de contribuir para a superação dessa crise.

Raça e Igualdade também tem acompanhado organizações da sociedade civil, tanto locais quanto aquelas que continuam atuando sobre a crise nicaraguense a partir do exílio, para que seu trabalho de documentação sirva como subsídio para relatórios apresentados aos Órgãos de Tratados que revisaram o cumprimento das obrigações internacionais da Nicarágua nos anos de 2022 e 2023, bem como nas avaliações realizadas no âmbito da Revisão Periódica Universal (RPU) em 2019 e 2024.

Raça e Igualdade também realizou diversas ações de advocacy junto ao Parlamento Europeu com o objetivo de condenar o regime e pressioná-lo a cumprir com suas obrigações internacionais em matéria de direitos humanos.

Sete anos após o início dos protestos cívicos de abril, é com profunda preocupação que vemos a direção para qual um regime cruel e implacável conduz o povo nicaraguense por meio do exercício de um poder desenfreado, que continua a violar os direitos humanos de forma massiva e sistemática. O regime optou por se isolar, deixando a Organização dos Estados Americanos (OEA) e se retirando de todas as atividades vinculadas ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, com o objetivo de evitar se responsabilizar pelos graves crimes contra a humanidade e violações de direitos humanos documentados pelo Grupo de Especialistas em Direitos Humanos sobre a Nicarágua (GHREN), pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), e pelos órgãos do Sistema Interamericano de Direitos Humanos.

Nos últimos sete anos, as recomendações dos Órgãos de Tratados, da Revisão Periódica Universal e as ordens emitidas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos foram completamente ignoradas, e o Estado se ausentou desses espaços, levantando questionamentos infundados na tentativa de fugir de suas responsabilidades internacionais.

No entanto, a Nicarágua continua vinculada aos instrumentos universais de direitos humanos e à Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

A comunidade internacional, as organizações da sociedade civil e os órgãos de proteção dos direitos humanos devem continuar empenhando todos os esforços para que a democracia seja restaurada o quanto antes na Nicarágua e que o respeito aos direitos humanos seja garantido.

Vamos continuar trabalhando lado a lado para que isso aconteça!

Programa de Ação e Declaração de Durban: Expectativas da sociedade civil sobre o projeto de Declaração Internacional sobre a Proteção, a Promoção e o Cumprimento Eficaz dos Direitos das Pessoas Afrodescendentes

No dia 15 de janeiro de 2025, o Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) e a Articulación Latinoamericana para los Decenios Afrodescendientes (ALDA), realizaram uma reunião em vistas da implementação sobre a Declaração e Plano de Ação de Durban, na sede de Raça e Igualdade em Genebra. Estiveram presentes neste espaço as Missões do Brasil, acompanhada de representação do Ministério de Igualdade Racial (MIR); da Colômbia, do México e do Chile; além de representantes do Fórum Permanente Afrodescendente da ONU e de organizações da sociedade civil de países como o Brasil, Costa Rica, Chile e Argentina. 

Este encontro ocorreu durante as ações do Grupo de Trabalho Intergovernamental, reunido na semana de 13 a 17 de janeiro de 2025, em Genebra, e teve como principal objetivo visibilizar a Implementação do Plano de Ação e da Declaração de Durban, assim como evidenciar a importância da aliança estratégica para a incidência política no projeto de declaração internacional para proteção, promoção e efetivo cumprimento dos direitos das pessoas Afrodescendentes. Importante destacar que houve pouca participação de entidades da sociedade civil de forma direta neste espaço intergovernamental, pois somente puderam estar presentes organizações da sociedade civil que possuem o ‘Status ECOSOC ONU’ [1] ou que tenham participado da Conferência de Durban, em 2001.  

Por essa razão, Raça e Igualdade e ALDA [2]  participaram da 23ª Sessão do Grupo de Trabalho Intergovernamental sobre a Implementação Efetiva da Declaração e Programa de Ação de Durban (IGWG – sigla em inglês), para apoiar o projeto de Declaração dos Direitos dos Afrodescendentes. Como grupos da sociedade civil, apontamos algumas considerações importantes que os governos devem levar em conta neste projeto de Declaração. Além de dar apoio essencial às Missões do Brasil e da Colômbia para que possam liderar e apoiar as vozes de quase 200 milhões de afrodescendentes nas Américas, queremos destacar a necessidade de participação e de escuta da sociedade civil e dos povos afrodescendentes, assim como da população latino-americana e caribenha. Neste sentido gostaríamos de destacar algumas recomendações: 

Apoiamos o Governo da Colômbia, que nesta sessão apresentou uma posição muito clara sobre o reconhecimento dos afrodescendentes como sujeito coletivo no marco da jurisprudência internacional e das nações que o estabeleceram por lei. Portanto, o projeto de Declaração deve levar em consideração em sua linguagem pessoas, comunidades e povos afrodescendentes. 

Consideramos necessário ampliar o conceito de afrodescendente como expressão civilizatória que tem origem na experiência do tráfico de escravos de africanos ocorrido entre os séculos XVI e XIX nas Américas. Os afrodescendentes devem ser considerados grupos étnico-culturais e que também habitam territórios rurais, preservam instituições culturais tradicionais e se definem como tais. 

O conceito de povos afrodescendentes está se tornando parte do sistema internacional de direitos humanos que salvaguarda o direito dos membros dessas comunidades de serem sujeitos coletivos de direitos, para além das categorias tradicionais de “igualdade e não discriminação, como princípio fundador de direitos humanos”. (Recomendação Geral 34 de 2011 CERD) 

A partir da abordagem do conceito de “diáspora africana” para os afrodescendentes nas Américas, o sistema de justiça interamericano conceitua os afrodescendentes rurais como “povos tribais”, enquanto as comunidades rurais têm uma relação com o território que vai além dos aspectos físicos, pois transformam o espaço que ocupam em um mecanismo de luta, transcendência política e reivindicação de sua ancestralidade. 

O movimento afro-latino-americano sempre teve uma participação coletiva e ativa na agenda internacional de direitos desde antes de Durban, por isso destacamos a importância do evento e a necessidade de fortalecer laços, redes e articulações para garantir a voz dos nossos povos. 

As missões presentes na reunião fechada destacaram a necessidade de maior aproximação com sociedade civil, a fim de subsidiar conceitos e prover informações atualizadas para o combate ao racismo nas Américas, e assim, possam aportar no texto da Declaração que vem sendo debatida neste Grupo de Trabalho Intergovernamental. Temas como reparação, o uso das novas tecnologias de inteligência artificial, bem como atenção com a agenda do clima, também foram objeto de debates.   

Ao final dos trabalhos, houve a finalização da primeira leitura do texto da Declaração que se seguirão nas próximas reuniões do Grupo de Trabalho Intergovernamental, com novos aportes que poderão ser realizados no texto.  

Raça e Igualdade e ALDA, expressam o entendimento de que este espaço deve ser plural e esperamos que, mesmo que de forma indireta, possamos propiciar uma maior participação das entidades da sociedade civil para construção da Declaração sobre a proteção, promoção e efetivo cumprimento dos direitos das pessoas Afrodescendentes. 

 

[1] https://ecosoc.un.org/en/ngo/consultative-status  

[2] Articulación Latinoamericana para los Decenios Afrodescendientes – ALDA e a Coalizão de Organizações Defensoras do Território Ancestral e das Terras Coletivas dos Afrodescendentes da América Latina e do Caribe fazem parte do movimento social afrodescendente que promove a causa do reconhecimento, da justiça e da reparação histórica da diáspora africana no mundo. A ALDA e a COALIZAÇÃO fizeram parte das organizações da sociedade civil que apoiaram e promoveram a proposta de reconhecimento dos povos afrodescendentes no direito internacional, especialmente no âmbito da última COP 16 realizada na cidade de Cali sob os auspícios do governo colombiano. 

Política Nacional para Povos e Comunidades de Terreiro e Matriz Africana: Uma Iniciativa por Direitos e Reparação

Brasil, 21 de janeiro de 2025 – Neste ano, em celebração ao Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, o Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) celebra uma importante conquista em prol do enfrentamento do racismo religioso no Brasil: a Política Nacional para Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiro e Matriz Africana. Decretada pelo Presidente Lula, em novembro de 2024, esta política constitui-se como um valoroso legado do Ministério da Igualdade Racial (MIR) pelos direitos dos povos e comunidades de terreiro.

O lançamento oficial aconteceu no dia 15 de janeiro de 2025, no Ilê Axé Omiojuarô, terreiro fundado por Mãe Beata, em Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro. Com a presença da Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco; do Secretário Nacional de Territórios e Sistemas Produtivos Quilombolas e Tradicionais do Ministério da Agricultura (MDA), Edmilton Cerqueira; o evento também contou com ilustres lideranças de matriz africana, como o Babalorixá da Casa, Baba Adailton Moreira, Mãe Meninazinha de Oxum, do Ilê Omolu Oxum; além da Coordenadora Geral da ONG Criola, Lúcia Xavier.

Luzi Borges, Diretora nacional de políticas para povos e comunidades tradicionais de matriz africana e de terreiro do Ministério da Igualdade Racial, abriu a mesa apresentando o plano de ação e as diretrizes e princípios que compõem esta nova Política. Fruto de uma extensa pesquisa e trabalho do MIR, a Diretora explicou que foram mapeadas 93 iniciativas para ações concretas durante os próximos 2 anos. Além disso, esta Política está articulada com 11 ministérios, sendo que cinco ministérios formam parte de um comitê gestor que irá monitorar a efetividade e aplicação destas iniciativas perante os povos de terreiro.

Entre as iniciativas que compõem esta Política, Luzi citou a capacitação da gestão de justiça, visando uma interlocução com o sistema judiciário para ampliar o acesso à justiça nos casos que envolvam racismo religioso. Ademais, o direito a maternidade no axé e a questão da mobilidade social são iniciativas que mostram a interseccionalidade das ações previstas para a construção de um olhar de respeito, participação e melhorias das condições de vida destas comunidades.

Ademais, o Observatório do Racismo Religioso, que já existia no Rio de Janeiro, em homenagem a Mãe Beata foi ampliado a nível nacional. Com um orçamento de R$ 115 milhões, esta Política é celebrada por ser um instrumento de garantias institucionais para o enfrentamento ao racismo religioso, pois mesmo mudando a gestão, os povos de terreiro seguem com seus direitos salvaguardados pela Lei.

Ao celebrar a conquista desta Política, a Ministra Anielle Franco recordou que ouviu muitas vezes que seria loucura insistir na criação e no fomento desta Política, mas trouxe à tona que em sua trajetória aprendeu que aquilo que move cada um nos leva a conquista dos nossos direitos. E enfatizou que essa Política é mais um passo para a não naturalização da violência contra as pessoas negras e da depredação dos terreiros.

“É importante lembrar e ter memória para que a gente não cometa os mesmos erros e para que a gente saiba onde quer chegar, pois enquanto estivermos aqui, vamos lutar para que se concretize, para que não seja mais um passo dado que não fique no esquecimento”, enfatizou Anielle em referência à trajetória do movimento negro, especialmente dos povos de terreiro, ao lançar a referida Política.

Em sua fala, Baba Adailton Moreira celebrou este lançamento ser realizado dentro de uma comunidade de terreiro, fato que para ele, demonstra que a luta pelos direitos e pelo enfrentamento ao racismo religioso não foi em vão. Além disso, ele reiterou a importância de seguir lutando pelo que é correto, para que as comunidades e povos de terreiro possam exercitar seus direitos políticos no país.

O Dia Nacional de Combate à Intolerância Religioso foi instituído através da Lei 11.635/2007, em homenagem à Mãe Gilda de Ogum, falecida em janeiro de 2020, devido a problemas de saúde ocasionados por atos decorrentes do racismo religioso. A liberdade religiosa é um importante vetor de um estado plenamente democrático, no qual o reconhecimento da pluralidade de expressões de fé é um importante caminho de respeito e valorização da cultura e memória dos povos afrodescendentes do Brasil. O racismo religioso afeta diretamente as religiões de matriz africana, atingindo seus cultos e liturgias, patrimônios materiais e imateriais, e até mesmo, a memória ancestral.

Raça e Igualdade se orgulha desta importante conquista, que nasceu de uma demanda que urgia da sociedade civil, através do movimento negro e das comunidades de matriz africana. Desde 2021, seguimos com o projeto de combate ao racismo religioso que, unidos a importantes ativistas e lideranças afro-religiosas, nos permite enxergar com admiração este importante passo que veio de longe, resultado de saberes ancestrais, e se concretizou em uma notória Política de proteção de direitos aos povos de axé.

 

NOTA DE REPÚDIO: URGIMOS PELA PROTEÇÃO DO POVO INDÍGENA AVA GUARANI NO PARANÁ!

Brasil, 07 de janeiro de 2025 – Sob ataques constantes de pistoleiros, indígenas da etnia Ava Guarani, pertencentes à comunidade Yvy Okaju, localizada entre Guaíra e Terra Roxa, no Paraná, clamam por socorro às autoridades! Quatro indígenas, incluindo uma criança e um adolescente, foram baleados por invasores mascarados que entraram atirando na comunidade. No dia 03 de janeiro, foi denunciado o quarto ataque em sete dias. O medo e a violência assombram o povo Ava Guarani que também tiveram uma casa queimada durante os ataques.

Mesmo tendo suas terras delimitadas desde 2018 pela FUNAI, há anos a Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá é alvo de conflitos, pois a construção da hidrelétrica Itaipu Binacional expulsou-os de seus territórios que está em processo de retomada. Portanto, perguntamos quais os interesses escusos na manutenção dessa violência?

O relatório “Violência contra os povos indígenas do Brasil” [1], elaborado pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), demonstra que em 2023 foram registrados 1276 casos de violências contra o Patrimônio” dos povos indígenas, especialmente a omissão e morosidade na regularização de terras (850 casos); conflitos relativos a direitos territoriais (150 registros); e invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio (276 casos). O documento apresenta, 411 registros de violência contra a pessoa em 2023 – entre os casos: abuso de poder (15 casos); ameaça de morte (17); ameaças várias (40); assassinatos (208); homicídio culposo (17); lesões corporais (18); racismo e discriminação étnico-cultural (38); tentativa de assassinato (35); e violência sexual (23).

A ONU já se pronunciou sobre a urgência na demarcação das terras indígenas e sobre a tese do Marco Temporal, que é contrária a toda legislação internacional de direitos humanos. A omissão estatal – ou a demora em ações concretas – mostra a ausência de compromisso do Estado à diversos compromissos internacionais, o que pode e deve gerar responsabilização internacional.

Raça e Igualdade rechaça a omissão e a inércia do Poder Público sobre a violência contra os povos indígenas, que perpetua o colonialismo, o racismo e o morrer. É preciso a construção de políticas de prevenção e de ação imediata no caso de novos atos delituosos, com a devida punição dos responsáveis, e pleiteia pelo direito à reparação dos povos originários. Não ao marco temporal! Chega de genocídio contra os povos indígenas!

 

[1] https://cimi.org.br/wp-content/uploads/2024/07/relatorio-violencia-povos-indigenas-2023-cimi.pdf

Direitos humanos e litígio estratégico: rumo a uma transformação das normas internacionais

  • Em comemoração ao Dia dos Direitos Humanos, Raça e Igualdade oferece uma visão abrangente de quatro casos que estão atualmente sendo demandados no Sistema Interamericano de Direitos Humanos. 

Washington D.C., 10 de dezembro de 2024 – No processo de promoção e defesa dos direitos humanos, o litígio estratégico representa uma linha de frente fundamental de luta. Para o Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade), esse se configura como um dos seus quatro pilares de trabalho. 

Com a visão de que o acesso à justiça é fundamental para garantir e proteger os direitos humanos, Raça e Igualdade litiga ao lado de vítimas e de organizações aliadas perante os mecanismos de direitos humanos a nível interamericano e universal, realizando este trabalho de duas formas.  

Por um lado, existe a resposta jurídica de emergência, que é ativada quando os parceiros enfrentam riscos de violações dos direitos humanos. Neste caso, a Equipe Legal de Raça e Igualdade os apoia na documentação e na apresentação dentro do prazo de pedidos de proteção e intervenção, perante o Sistema Interamericano e/ou Universal.  

Litigando diante do Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH)

Por outro lado, com o objetivo de conseguir uma justiça integral para as vítimas e promover mudanças estruturais sustentáveis a longo prazo para uma maior proteção dos direitos humanos, Raça e Igualdade realiza um litígio estratégico através de uma coordenação constante com os parceiros da sociedade civil.  

É sobre este segundo ponto que, em razão da celebração do Dia dos Direitos Humanos, Raça e Igualdade apresenta quatro casos que estão atualmente sendo demandados no Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH). Nossa proposta é oferecer uma visão abrangente dos fatos por cada caso, o seu estado processual e, em colaboração com as vítimas, familiares e organizações parceiras, o que se espera em termos de jurisprudência e transformação das normas internacionais.  

Vale ressaltar que Raça e Igualdade, atualmente, litiga um total de 10 casos perante o SIDH (3 vs. Nicarágua, 2 vs. Colômbia, 3 vs. Cuba, 1 vs. Peru e 1 vs. México), por violação dos direitos humanos de 157 vítimas individuais e 3 vítimas coletivas, cada uma em diferentes fases processuais. Ademais, em 31 casos procura-se proteção perante o Sistema Universal e o SIDH (13 da Nicarágua, 3 da Colômbia, 14 de Cuba e 1 do Brasil), a favor de 401 beneficiários individuais e 2 beneficiários coletivos. Os indivíduos e grupos representados pertencem às populações com as quais a organização trabalha desde a sua criação: Afrodescendentes, indígenas, pessoas LGBTI+, mulheres líderes comunitárias, defensores dos direitos humanos e vítimas de repressão política.  

Além disso, em conformidade com a visão institucional de Raça e Igualdade, os casos são abordados a partir de uma perspectiva interseccional. É importante ressaltar que o trabalho de litígio estratégico está interligado e é reforçado pelos outros pilares de trabalho da instituição, que são advocacy, documentação e a capacitação dos parceiros. Saiba mais aqui.  

  • Petição de Damas de Blanco (Cuba): proteção integral do direito de defesa dos direitos humanos 

Devido ao seu trabalho de defesa e promoção dos direitos humanos em Cuba, as mulheres que integram a organização Damas de Blanco são continuamente ameaçadas, assediadas, perseguidas e reprimidas por agentes do Estado e são detidas todas as semanas durante horas ou dias, sendo algumas delas arbitrariamente presas por razões políticas. Durante as últimas semanas, a Presidenta, Berta Soler, foi detida e teve desaparecimento forçado em três ocasiões, por um período que se estendeu por até três dias.  Em 2013, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) concedeu medidas cautelares a favor de todos as membras da organização, que ainda estão em vigor; e em 2022, Raça e Igualdade apresentou uma petição pelas violações dos direitos humanos causadas às mulheres membras das Damas de Blanco e à própria organização. 

O prazo para que o Estado apresente suas observações sobre a admissibilidade e o mérito está em curso e, posteriormente, a CIDH terá o poder de se pronunciar sobre a responsabilidade internacional do Estado neste caso.  

Por meio das medidas cautelares ou de uma carta de alegação perante os Procedimentos Especiais do Conselho de Direitos Humanos e de ações perante outros órgãos da ONU, Raça e Igualdade busca garantir a proteção dos direitos à vida, à integridade pessoal, à liberdade pessoal, à liberdade de pensamento e de expressão, e a cooperação para o exercício do direito de defesa dos direitos humanos e da liberdade de expressão.  

A petição alega que o Estado de Cuba é internacionalmente responsável pela violação dos direitos à vida, à liberdade, à segurança e integridade da pessoa, à igualdade perante a lei, à proteção da honra, à constituição e proteção da família, à preservação da saúde e do bem-estar e à proteção contra a detenção arbitrária por motivos políticos, em detrimento das vítimas. 

  • Petição de Kevin Solís (Nicarágua): proteção dos defensores dos direitos humanos enquanto atores fundamentais para o reforço da democracia 

O caso de Kevin Solís é um exemplo do padrão de repressão sofrido pelos estudantes que denunciaram violações dos direitos humanos no meio da revolta social de 2018, na Nicarágua. Entre 2018 e 2020, Kevin foi privado de liberdade em duas ocasiões, tendo sido sujeito a torturas e castigos na prisão, para além de ter sido anulado o seu registo acadêmico na universidade pública. Em 9 de fevereiro de 2023, Kevin Solís foi libertado da prisão e banido para os Estados Unidos, tendo-lhe sido retirada a nacionalidade.  

Dada a situação de risco em que Solís se encontrava, a CIDH concedeu medidas cautelares e, posteriormente, ele foi beneficiário de medidas provisórias ordenadas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH). Em agosto de 2023, Raça e Igualdade apresentou uma petição à CIDH denunciando as violações dos direitos humanos cometidas pelo Estado contra ele. As medidas provisórias ainda estão em vigor, enquanto a petição aguarda processamento pela CIDH.  

Com a estratégia utilizada neste caso, procuramos proteger os defensores dos direitos humanos enquanto atores fundamentais para o fortalecimento da democracia, assim como denunciar as detenções arbitrárias através da utilização de legislação contrária às normas internacionais para criminalizar a liberdade de expressão. Este caso contribuirá também para a documentação das violações dos direitos humanos ocorridas desde o início da crise para a) pressão da comunidade internacional e b) posterior responsabilização, reparação e estabelecimento de garantias de não repetição.   

  • Medidas Cautelares de Benny Briolly (Brasil): garantir a participação política de pessoas negras com identidades de gênero diversas 

Benny Briolly Rosa da Silva Santos é uma vereadora travesti negra eleita na cidade de Niterói, cujo mandato foi renovado em 2024 e que, de 2017 até hoje, tem enfrentado um grave contexto de ataques direcionados à sua identidade de gênero e raça, atingindo também sua equipe de assessoria. Tais ataques, que se manifestam por meio de conteúdos discriminatórios e ameaças de morte, foram frequentemente utilizados para provocar medo e insegurança na sua atuação política em defesa dos direitos humanos. Diante dessa situação, as organizações Criola, Terra de Direitos, Justiça Global, Instituto Marielle Franco, Instituto de Defesa da População Negra e Raça e Igualdade solicitaram medidas cautelares perante a CIDH, que foram concedidas em 11 de junho de 2022. 

As organizações representativas da beneficiária têm buscado permanentemente a aplicação das medidas cautelares e a cessação do risco, mas até o momento não obtiveram pleno êxito, pois o Estado não tomou as providências adequadas e oportunas para isso.  

Juntamente com as demais organizações representativas, buscamos a efetiva proteção da vereadora e que o Estado brasileiro garanta a proteção política das pessoas negras com identidades de gênero diversas.  

  • La COMADRE (Colômbia): Direito à reparação coletiva para as mulheres líderes étnicas 

As lideranças comunitárias da Coordenação da Mujeres Afrocolombianas Desplazadas en Resistencia (La COMADRE), uma organização autônoma de mulheres vítimas do conflito armado, vítimas de violência sexual e de deslocamento forçado, continuam a enfrentar múltiplas formas de violência devido ao seu ativismo. Trata-se principalmente de pessoas pertencentes a comunidades étnicas rurais, que foram deslocadas à força para contextos urbanos devido ao conflito armado e à violência que persiste nos seus territórios ancestrais.  

Neste contexto, La COMADRE exigiu que o Estado colombiano as reconhecesse como sujeito coletivo étnico com direito a reparação coletiva através de consulta livre, prévia e informada. Apesar de terem obtido o reconhecimento como tal, esta reparação não foi concedida, pelo que, em 2022, a Asociación de Afrocolombianos Desplazados (AFRODES) e o ILEX Acción Jurídica junto à Raça e Igualdade, apresentaram conjuntamente uma petição perante à CIDH devido às violações perpetradas contra eles pelo Estado e à violência e riscos que as mulheres líderes que compõem a organização continuam a enfrentar. A petição foi aberta para tramitação e aguarda que a CIDH avance nas etapas de admissibilidade e mérito. 

Este caso pretende, em primeiro lugar, que seja concedida uma reparação coletiva a La COMADRE como sujeito coletivo étnico, depois de exercido o direito de consulta para determinar essa reparação; garantias para a cessação da violência e dos riscos enfrentados pelas mulheres líderes afro-colombianas vítimas do conflito armado, bem como a identificação e punição dos responsáveis e mudanças estruturais para garantir que essas mulheres possam defender os direitos humanos exercendo a sua liderança étnica em condições de segurança para si próprias, para as suas famílias e para a sua organização. 

A Escalada da Violência Policial em São Paulo: e agora, quem protege os cidadãos?

Brasil, 05 de dezembro de 2024 – O Brasil segue a passos largos na contramão do desrespeito aos direitos humanos, sobretudo quando observamos o racismo estrutural e sistêmico, fruto de políticas contínuas que evidenciam violações e o menosprezo à vida de pessoas negras. A violência como política de segurança pública revela-se, principalmente, perante os moradores nas periferias dos grandes centros urbanos e, somente em 2024, os números das práticas abusivas de violência policial seguem subindo exponencialmente. Diante deste cenário, o Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade), urge pela ação objetiva e direta do Estado brasileiro diante da gestão da segurança pública de São Paulo. É preciso uma política de segurança pública que garanta direitos aos cidadãos e em casos de violação por parte de agentes públicos, seja capaz de responsabilizar as autoridades, pelos atos da corporação militar.

O Estado de São Paulo, segundo dados do Ministério Público Estadual, teve um aumento de 46% nas mortes cometidas por policiais. Somente de janeiro a novembro de 2024, houve 673 mortes pelas mãos da polícia paulista, com média de duas vítimas letais por dia. [1]

Os últimos acontecimentos demonstram um descontrole e ausência de gestão da política de segurança pública no Estado de São Paulo. Diversos casos foram testemunhados por cidadãos e, até mesmo, através das câmeras corporais dos policiais que evidenciam a violência exacerbada, mesmo quando o suspeito está dominado. As ações brutais da PM vão desde tiros na cabeça, execuções pelas costas com 11 tiros, execução a queima roupa, morte de criança em suposto tiroteio, agressões físicas diversas, uma pessoa abordada por 13 policiais, e um policial atirando o corpo de uma vítima de cima de uma ponte na zona sul de São Paulo, entre outros. Estes casos nos levam a seguinte questão: há algum tipo de controle efetivo da polícia militar ou esta polícia tem salvo conduto do governo do Estado para praticar violações?

Ademais, ressaltamos que a criação de uma Ouvidoria Paralela pelo Secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite é mais uma indicação de que as forças policiais do Estado de São Paulo continuarão sua escalada de violência e de impunidade, tendo em vista que já existe uma Ouvidoria da Polícia Civil, que vem diuturnamente denunciando a política de Segurança Pública do Estado de São Paulo. A criação de uma ouvidoria paralela, sem qualquer autonomia, reforça, segundo a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB – SP), mais um passo no enfraquecimento dos mecanismos de controle e transparência da atividade policial no estado.

“É evidente que a política de segurança pública no Estado de São Paulo segue um caminho contrário dos diversos relatórios das Nações Unidas que indicam que há necessidade da aplicação de procedimentos de monitoramento, de uma corregedoria que seja efetiva e não corporativista, permitindo que os processos de apuração sejam céleres, imparciais e transparentes, e que a política de segurança pública possa restabelecer alguma credibilidade, assim como no governo do Estado de São Paulo”, aponta Rodnei Jericó, Diretor de Raça e Igualdade no Brasil.

Após sua visita ao Brasil, em agosto de 2024, a Relatora Especial da ONU sobre formas contemporâneas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata, Ashiwini K.P., publicou um relatório sobre a questão racial no país ressaltando a gravidade e complexidade da violência das forças de segurança pública. O documento insta o Estado a tomar medidas mais efetivas frente ao sistema carcerário e, mesmo reconhecendo que o uso de câmeras policiais seja um passo importante para uma política de segurança antirracista, sinalizou que há relatos de que essas câmeras não são utilizadas e que medidas de perfilamento racial estão sendo utilizadas pelo governo sem base científica. Ademais, a Relatora apontou que são especialmente mães afrodescendentes que perdem os seus filhos em razão da brutalidade policial, e que além de vítimas, estas também são criminalizadas.

Em outubro de 2024, o Mecanismo Internacional de Especialistas Independentes para o Avanço da Igualdade e Justiça Racial na Aplicação da Lei – EMLER publicou relatório destacando o racismo sistêmico enraizado na polícia e no sistema de justiça criminal, onde o preconceito racial, o perfilamento racial e os estereótipos raciais influenciam a ação e a inação do Estado. O uso excessivo da força de segurança pública que leva a milhares de mortes todos os anos e o encarceramento excessivo, que afetam desproporcionalmente as pessoas negras, são uma consequência do racismo sistêmico que, combinado com as atuais políticas de “guerra ao crime”, resulta em um processo de limpeza social que serve para exterminar setores da sociedade considerados indesejáveis, perigosos e criminosos. Esta é uma questão sistêmica generalizada que exige uma resposta sistêmica e abrangente.

Entre as diversas recomendações emitidas pelo EMLER, é importante evidenciar na luta contra a violência policial com perfilamento racial os seguintes pontos:

  1. Estabelecer por lei um órgão de controle civil nacional da força policial.
  2. Estabelecer o uso obrigatório nacional de câmeras corporais por policiais.
  3. Adotar uma abordagem baseada em direitos humanos para o policiamento.
  4. Acabar com as atuais políticas de “guerra às drogas” e “guerra ao crime” e adotar uma abordagem baseada nos direitos humanos para essas questões.
  5. Adotar uma legislação nacional sobre o uso da força que esteja em conformidade com as normas internacionais de direitos humanos – particularmente com os princípios de legalidade, precaução, necessidade, proporcionalidade, responsabilidade e não-discriminação, e a obrigação de proteger e respeitar o direito à vida.
  6. Garantir que o perfilamento racial seja claramente definido e proibido por lei, e investigar todas as alegações de perfilamento racial e processar os casos em conformidade.
  7. Garantir a adequada responsabilização em todos os casos de uso excessivo da força e outras violações dos direitos humanos por agentes da lei, inclusive responsabilizando superiores e comandantes de operações, também responsabilizar as agências policiais enquanto instituições, e não apenas as e os oficiais diretamente envolvidos.
  8. Garantir o direito das vítimas a reparações, notadamente através do estabelecimento por lei de um mecanismo independente especializado centrado nas vítimas com suficiente orçamento, especificamente concebido para apoiar indivíduos e comunidades afetadas.

 

 

[1] https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2024/12/04/sp-acumula-casos-de-violencia-policial-recentes-no-ano-mortes-pela-pm-no-estado-aumentaram-46percent.ghtml

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