Guilherme Dias Santos Ferreira, mais uma vítima do racismo sistêmico e da violência do Estado no Brasil

Guilherme Dias Santos Ferreira, mais uma vítima do racismo sistêmico e da violência do Estado no Brasil

Rio de Janeiro, 9 de julho de 2025.– O Instituto Internacional sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos manifesta profundo pesar e solidariedade à família e aos amigos de Guilherme Dias Santos Ferreira, jovem marceneiro negro de 26 anos, brutalmente assassinado com um tiro na cabeça por um policial militar de folga, no dia 4 de julho de 2025, no bairro de Parelheiros, Zona Sul de São Paulo.[1]

Essa tragédia não é um caso isolado: é reflexo da atual realidade da segurança pública no Estado de São Paulo, sob a gestão do governador Tarcísio de Freitas e do secretário de segurança pública Guilherme Derrite, no qual as mortes cometidas por policiais explodiram.

Em 2024, a Polícia Militar matou 737 pessoas no estado, representando um aumento de 60% em relação ao ano anterior.[2] No primeiro ano do governo Tarcísio, em 2023, já havia sido registrado um aumento de 98% das mortes por policiais, totalizando 406 vítimas entre janeiro e novembro. Os dados são do Grupo de Atuação Especial da Segurança Pública e Controle Externo da Atividade Policial do Ministério Público de São Paulo (GAESP-MPSP).[3]

O caso de Guilherme revela o racismo estrutural que fundamenta a atuação das forças de segurança pública no Brasil e aprofunda a desigualdade racial nas periferias urbanas, parafraseando aqui o Dr. Hédio Silva Júnior: Não há comoção social quando jovens pretos são chacinados nas periferias do Brasil.

Nesse contexto, destaque-se aqui o Relatório sobre Justiça Racial na Aplicação da Lei, divulgado em 2024 com as conclusões do Mecanismo Internacional de Especialistas Independentes para o Avanço da Igualdade e Justiça Racial na Aplicação da Lei (EMLER, na sigla em inglês), conforme a Resolução 47/21[4] do Conselho de Direitos Humanos da ONU, após visita ao Brasil entre 27 de novembro e 8 de dezembro de 2023 em cidades como Brasília, Salvador, Fortaleza, São Paulo e Rio de Janeiro.[5]

O relatório do EMLER, destaca alguns números e alerta: 

“O Mecanismo está alarmado com os números e as circunstâncias nas quais as pessoas são assassinadas pela polícia no Brasil. Nos últimos dez anos, 54.175 pessoas foram mortas por policiais no país, com mais de 6.000 indivíduos mortos todos os anos (17 todos os dias) nos últimos seis anos. As mortes causadas pela polícia aumentaram significativamente de 2.212 em 2013 para 6.393 em 2023. O dado mais recente representa 13% do total de mortes violentas intencionais no país. Das 6.393 pessoas mortas pela polícia em 2023, 99,3% eram homens; 6,7% crianças entre 12 e 17 anos; e 65% eram jovens adultos: 41% tinham entre 18 e 24 anos e 23,5% entre 25 e 29 anos.’’[6]

Os dados expressam que o perfilamento racial é uma realidade de há muitos anos, sendo os mais afetados são jovens afrodescendentes que vivem em áreas empobrecidas. O assassinato de Guilherme evidencia que o racismo segue sendo um pilar estruturante das ações policiais no Brasil e urge a necessidade de mudança nos procedimentos e políticas de segurança pública, sob risco de que outros jovens inocentes, como Guilherme, continuem sendo assassinados nas periferias e reduzidos a meros números nas estatísticas da violência de Estado.

 

 

 

[1] G1. Só porque é um jovem negro, preto e estava correndo para pegar o ônibus”, diz esposa do homem morto por PM com tiro na cabeça por engano. São Paulo, 7 jul. 2025. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2025/07/07/so-porque-e-um-jovem-negro-preto-e-estava-correndo-para-pegar-o-onibus-diz-esposa-do-homem-morto-por-pm-com-tiro-na-cabeca-por-engano.ghtml. Acesso em: 9 jul. 2025.

[2] BRASIL DE FATO. Com Tarcísio e Derrite, PM de São Paulo matou 737 pessoas em 2024, 60% a mais do que no ano anterior. São Paulo, 7 jan. 2025. Disponível em: https://www.brasildefato.com.br/2025/01/07/com-tarcisio-e-derrite-pm-de-sao-paulo-matou-737-pessoas-em-2024-60-a-mais-do-que-no-ano-anterior/. Acesso em: 9 jul. 2025.

[3] CNN BRASIL. Com Tarcísio e Derrite, mortes por PMs aumentaram 98% em SP. São Paulo, 4 dez. 2024. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/com-tarcisio-e-derrite-mortes-por-pms-aumentaram-98-em-sp/. Acesso em: 9 jul. 2025.

[4] UNITED NATIONS. Human Rights Council. Resolution 47/21: Promotion and protection of the human rights and fundamental freedoms of Africans and of people of African descent against excessive use of force and other human rights violations by law enforcement officers through transformative change for racial justice and equality. Genebra, 13 jul. 2021. Disponível em: https://documents.un.org/doc/undoc/gen/g21/199/03/pdf/g2119903.pdf. Acesso em: 9 jul. 2025.

[5] NAÇÕES UNIDAS BRASIL. Especialistas independentes da ONU avaliam justiça racial no contexto da aplicação da lei em visita ao Brasil. Brasília, 24 nov. 2023. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/253777-especialistas-independentes-da-onu-avaliam-justi%C3%A7a-racial-no-contexto-da-aplica%C3%A7%C3%A3o-da-lei-em. Acesso em: 9 jul. 2025.

[6] NAÇÕES UNIDAS BRASIL. Brasil: Relatório sobre Justiça Racial na Aplicação da Lei. Brasília, 1º out. 2024. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/280159-brasil-relat%C3%B3rio-sobre-justi%C3%A7a-racial-na-aplica%C3%A7%C3%A3o-da-lei. Acesso em: 9 jul. 2025.

A ONU alerta sobre a persistência do racismo sistêmico no Brasil mesmo com avanços institucionais

Rio de Janeiro, 3 de julho de 2025.– A Relatora Especial das Nações Unidas sobre Formas Contemporâneas de Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, Ashwini K.P., apresentou o relatório oficial de sua visita ao Brasil, no qual reconhece o progresso institucional do país no combate à discriminação racial, mas alerta para a persistência do racismo sistêmico que continua a afetar desproporcionalmente comunidades racializadas e etnicamente marginalizadas.

Durante sua missão oficial, realizada de 5 a 16 de agosto de 2024, a especialista visitou as cidades de Brasília, Salvador, São Luís, São Paulo, Florianópolis e Rio de Janeiro, onde se reuniu com representantes dos governos federal e estadual, do sistema de justiça, da sociedade civil e de organizações internacionais. Ela também ouviu depoimentos de mais de 120 representantes de grupos afrodescendentes, indígenas, quilombolas, ciganos e outros historicamente excluídos.

Reconhecimento institucional do racismo

A Relatora Especial saudou a decisão do Governo brasileiro de reconhecer o racismo enquanto fenômeno estrutural, distanciando-se da noção de “democracia racial”. Ela destacou avanços importantes como a criação do Ministério da Igualdade Racial (MIR) e do Ministério dos Povos Indígenas (MPI) em 2023, bem como os esforços para fortalecer o monitoramento das recomendações internacionais por meio do Sistema de Acompanhamento de Recomendações (SIMORE).

No entanto, ela enfatizou que a discriminação racial continua a se manifestar de forma interseccional e generalizada em diversas esferas, afetando severamente os direitos civis, políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais de pessoas de ascendência africana, indígenas, quilombolas, romani e outros grupos historicamente excluídos.

Violência e desapropriação territorial

O relatório destaca com particular preocupação a violência estrutural enfrentada por povos indígenas e quilombolas na defesa de seus territórios. Exemplos como os ataques contra o povo Guaraní-Kaiowá no Mato Grosso do Sul e a ocupação das terras da comunidade quilombola Alto do Tororó, na Bahia, ilustram como o racismo sistêmico se expressa na ausência de demarcação de terras, na extração ilegal de recursos e na presença de forças armadas em territórios ancestrais.

Racismo ambiental

A Relatora Especial documentou casos de racismo ambiental, como a pulverização de pesticidas tóxicos em comunidades quilombolas no Maranhão por atores do agronegócio, gerando consequências devastadoras para a saúde e o meio ambiente, bem como o enfraquecimento dos meios de subsistência tradicionais.

“Fiquei chocada ao ouvir de atores do sistema judiciário estadual que o dever de consultar os povos indígenas e as comunidades quilombolas — e de garantir seu consentimento livre, prévio e informado — estava sendo delegado às mesmas empresas com interesses comerciais em projetos extrativos”, acrescentou.

Discriminação de gênero e violência contra mulheres racializadas

O relatório alerta para a prevalência alarmante de feminicídio e violência doméstica no Brasil, que afeta particularmente mulheres afrodescendentes, indígenas e quilombolas. Também destaca a situação de mulheres LGBTI+ racializadas, que enfrentam violência exacerbada por causas interseccionais.

Ela também expressou preocupação com os relatos de acesso limitado ou inexistente aos serviços básicos de saúde para a comunidade lésbica, gay, bissexual, trans e intersexo, bem como casos de racismo e fobia contra essa comunidade por profissionais médicos dentro do sistema de saúde.

Violência policial e acesso à justiça

A especialista denunciou o uso sistemático de força letal por forças policiais em comunidades afrodescendentes, especialmente nas favelas. Essas operações militarizadas geram inúmeras violações de direitos humanos e afetam o cotidiano das pessoas, interrompendo serviços essenciais como educação e saúde.

Ela também expressou preocupação com a ineficácia dos programas federais que protegem os defensores dos direitos humanos, especialmente aqueles que lutam contra o racismo.

Intolerância religiosa e discurso de ódio

Ashwini K.P. também recebeu informações alarmantes sobre ataques a líderes religiosos afro-brasileiros e terreiros, bem como sobre a violência e a impunidade enfrentadas por praticantes de religiões de matriz africana. A Relatora Especial saudou os esforços do Ministério da Igualdade Racial para desenvolver políticas específicas para combater o racismo religioso.

‘’Estou profundamente preocupada com os relatos sobre o alto — e crescente — número de casos de intolerância religiosa e discriminação, frequentemente chamados no Brasil de ‘racismo religioso’, contra pessoas que praticam religiões afro-brasileiras. Esses relatos incluem atos profundamente prejudiciais de racismo cotidiano, como taxistas fechando suas portas para pessoas que usam roupas associadas com as religiões afro-brasileiras, além de restrições ao uso dessas roupas no local de trabalho e bullying contra crianças que praticam essas religiões”, afirma a especialista no relatório.

Em relação ao discurso de ódio, ela alertou sobre o aumento de casos de incitação ao racismo, tanto em espaços físicos quanto online, e destacou o baixo índice de condenações, apesar do alto número de denúncias.

Recomendações principais

A Relatora Especial fez 67 recomendações ao Estado brasileiro, agrupadas em cada uma das áreas temáticas observadas e analisadas. Entre as principais recomendações, destacamos as seguintes:

  • Estabelecer uma instituição nacional de direitos humanos de acordo com os Princípios de Paris, com o poder de monitorar e combater a discriminação racial.
  • Implementar integralmente as obrigações internacionais relativas à justiça racial, incluindo a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial.
  • Garantir a implementação efetiva de planos para desenvolver políticas destinadas a combater o racismo religioso.
  • Rejeitar qualquer interpretação jurídica regressiva que limite os direitos territoriais dos povos indígenas.
  • Garantir políticas públicas efetivas e inclusivas para as comunidades Quilombolas.
  • Fortalecer os mecanismos de proteção para defensores dos direitos humanos e garantir financiamento adequado.
  • Tome medidas urgentes contra o racismo religioso e o discurso de ódio, online e offline.
  • Desenvolver campanhas de educação e conscientização pública para combater estereótipos negativos sobre as religiões afro-brasileira e islâmica e promover a coexistência pacífica e o respeito a todas as religiões.

Um chamado à ação

O relatório constitui um apelo urgente ao Estado brasileiro para que avance decisivamente na erradicação do racismo sistêmico e na consolidação da igualdade racial. A Relatora Especial demonstra que o progresso institucional deve se traduzir em profundas transformações estruturais que garantam justiça, reparação e dignidade a todas as pessoas, especialmente àquelas historicamente excluídas.

O relatório será apresentado ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas e servirá como ferramenta fundamental para monitorar e garantir a responsabilização quanto às obrigações internacionais do Estado brasileiro no combate ao racismo, à discriminação racial e à intolerância.

A Relatora Especial reafirmou sua disposição de trabalhar com o Estado, a sociedade civil e as comunidades afetadas para avançar em direção a uma sociedade verdadeiramente igualitária, na qual os direitos humanos de todas as pessoas, independentemente da origem racial ou étnica, sejam totalmente respeitados e garantidos.

A ONU publicizou carta na qual cobra informações ao Estado brasileiro sobre a situação de Sônia Maria de Jesus

· Sônia Maria de Jesus, mulher negra com múltiplas deficiências, foi submetida a condições de escravidão doméstica por décadas por uma família com vínculos no Judiciário.

· Quatro relatorias especiais e um grupo de trabalho da ONU enviaram comunicação ao Estado brasileiro expressando grave preocupação com o caso, cobrando informações e medidas urgentes para evitar sua revitimização e garantir seus direitos.

· No 2024, representantes da família de Sônia, o CPT, o CEJIL e o Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos denunciaram o caso à ONU, exigindo justiça e garantias de não repetição.

Río de Janeiro, Brasil. 25 de Abril de 2025. – Quatro Relatorias Especiais da ONU cobraram esclarecimentos e posição do governo brasileiro em relação ao caso de Sônia Maria de Jesus, uma mulher negra, com múltiplas deficiências e analfabeta, que foi submetida desde a infância a condições análogas à escravidão doméstica por uma família no estado de Santa Catarina, que tem um desembargador como membro.

A ONU, por meio de quatro relatorias especiais — sobre tráfico de pessoas; direitos das pessoas com deficiência; formas contemporâneas de racismo e discriminação racial; e formas contemporâneas de escravidão – e do grupo de trabalho sobre discriminação contra mulheres e meninas tornou pública a carta enviada ao governo brasileiro expressando preocupação com o caso, com as violações denunciadas, com a revitimização de Sônia e a perpetuação das violações, bem como com o precedente negativo aberto pelo caso.

As relatorias, também destacaram que os fatos comunicados indicam a violação de diversos direitos previstos em diferentes tratados internacionais e ressaltaram a preocupação com a decisão judicial que determinou o retorno de Sônia à residência onde supostamente foi submetida a escravidão contemporânea, contrariando protocolos nacionais e internacionais de proteção às vítimas de escravidão e violência, o que pode agravar sua revitimização.

Além de pedir informações, a ONU cobrou o Estado brasileiro sobre as medidas adotadas para garantir os direitos humanos de Sônia e sua família, para investigar as violações de direitos denunciadas e sobre políticas públicas de enfrentamento à escravidão contemporânea e tráfico de pessoas, especialmente no contexto de trabalho doméstico e em relação a pessoas em situação de vulnerabilidade agravada, como mulheres negras e pessoas com deficiência. “Para nós, irmãos da Sônia, é gratificante e um alívio ver que alguma instituição se sensibilizou e manifestou sobre o caso. O Judiciário brasileiro não está respondendo adequadamente às questões da Sônia e nem às nossas. Não garantem o convívio familiar e não enxergam como ela poderia estar sendo acolhida e reconstruindo a vida junto a nós.”, disse Marta de Jesus, irmã da Sônia.

Em 1982 Sônia foi entregue na casa de um desembargador de Santa Catarina para proteção, mas acabou sendo levada para outro estado, sem o conhecimento de sua família biológica. Sônia acabou sendo explorada por décadas, sem registro formal de trabalho, acesso à educação ou cuidados médicos adequados, tendo tido seu desenvolvimento comunicacional bloqueado, em função da falta de estímulos adequados. Em 2023, Sônia foi resgatada após uma denúncia anônima, mas sua liberdade durou pouco. Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça autorizou o seu retorno à residência onde

vinha sendo explorada. Seus irmãos só souberam do seu paradeiro com o resgate, mas têm sido privados do pleno convívio com a irmã.

No final de 2024, representantes da família de Sônia e as organizações Comissão Pastoral da Terra (CPT), Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL), Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos, e o Movimento Vidas Negras Com Deficiência Importam encaminharam uma comunicação à Organização das Nações Unidas (ONU) denunciando as violações sofridas por Sônia e sua família e pedindo que fossem cobradas informações e medidas do Estado brasileiro.

Enquanto aguarda uma resposta por parte do Estado, as relatorias e o grupo de trabalho da ONU reforçaram a necessidade de que o Brasil adote todas as medidas necessárias para cessar as violações e evitar sua recorrência e de garantir a sua responsabilização. Também indicaram a possibilidade de expressar publicamente suas preocupações, pois consideram que este é um assunto que merece atenção imediata e que o público deve ser alertado sobre suas possíveis implicações.

Programa de Ação e Declaração de Durban: Expectativas da sociedade civil sobre o projeto de Declaração Internacional sobre a Proteção, a Promoção e o Cumprimento Eficaz dos Direitos das Pessoas Afrodescendentes

No dia 15 de janeiro de 2025, o Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) e a Articulación Latinoamericana para los Decenios Afrodescendientes (ALDA), realizaram uma reunião em vistas da implementação sobre a Declaração e Plano de Ação de Durban, na sede de Raça e Igualdade em Genebra. Estiveram presentes neste espaço as Missões do Brasil, acompanhada de representação do Ministério de Igualdade Racial (MIR); da Colômbia, do México e do Chile; além de representantes do Fórum Permanente Afrodescendente da ONU e de organizações da sociedade civil de países como o Brasil, Costa Rica, Chile e Argentina. 

Este encontro ocorreu durante as ações do Grupo de Trabalho Intergovernamental, reunido na semana de 13 a 17 de janeiro de 2025, em Genebra, e teve como principal objetivo visibilizar a Implementação do Plano de Ação e da Declaração de Durban, assim como evidenciar a importância da aliança estratégica para a incidência política no projeto de declaração internacional para proteção, promoção e efetivo cumprimento dos direitos das pessoas Afrodescendentes. Importante destacar que houve pouca participação de entidades da sociedade civil de forma direta neste espaço intergovernamental, pois somente puderam estar presentes organizações da sociedade civil que possuem o ‘Status ECOSOC ONU’ [1] ou que tenham participado da Conferência de Durban, em 2001.  

Por essa razão, Raça e Igualdade e ALDA [2]  participaram da 23ª Sessão do Grupo de Trabalho Intergovernamental sobre a Implementação Efetiva da Declaração e Programa de Ação de Durban (IGWG – sigla em inglês), para apoiar o projeto de Declaração dos Direitos dos Afrodescendentes. Como grupos da sociedade civil, apontamos algumas considerações importantes que os governos devem levar em conta neste projeto de Declaração. Além de dar apoio essencial às Missões do Brasil e da Colômbia para que possam liderar e apoiar as vozes de quase 200 milhões de afrodescendentes nas Américas, queremos destacar a necessidade de participação e de escuta da sociedade civil e dos povos afrodescendentes, assim como da população latino-americana e caribenha. Neste sentido gostaríamos de destacar algumas recomendações: 

Apoiamos o Governo da Colômbia, que nesta sessão apresentou uma posição muito clara sobre o reconhecimento dos afrodescendentes como sujeito coletivo no marco da jurisprudência internacional e das nações que o estabeleceram por lei. Portanto, o projeto de Declaração deve levar em consideração em sua linguagem pessoas, comunidades e povos afrodescendentes. 

Consideramos necessário ampliar o conceito de afrodescendente como expressão civilizatória que tem origem na experiência do tráfico de escravos de africanos ocorrido entre os séculos XVI e XIX nas Américas. Os afrodescendentes devem ser considerados grupos étnico-culturais e que também habitam territórios rurais, preservam instituições culturais tradicionais e se definem como tais. 

O conceito de povos afrodescendentes está se tornando parte do sistema internacional de direitos humanos que salvaguarda o direito dos membros dessas comunidades de serem sujeitos coletivos de direitos, para além das categorias tradicionais de “igualdade e não discriminação, como princípio fundador de direitos humanos”. (Recomendação Geral 34 de 2011 CERD) 

A partir da abordagem do conceito de “diáspora africana” para os afrodescendentes nas Américas, o sistema de justiça interamericano conceitua os afrodescendentes rurais como “povos tribais”, enquanto as comunidades rurais têm uma relação com o território que vai além dos aspectos físicos, pois transformam o espaço que ocupam em um mecanismo de luta, transcendência política e reivindicação de sua ancestralidade. 

O movimento afro-latino-americano sempre teve uma participação coletiva e ativa na agenda internacional de direitos desde antes de Durban, por isso destacamos a importância do evento e a necessidade de fortalecer laços, redes e articulações para garantir a voz dos nossos povos. 

As missões presentes na reunião fechada destacaram a necessidade de maior aproximação com sociedade civil, a fim de subsidiar conceitos e prover informações atualizadas para o combate ao racismo nas Américas, e assim, possam aportar no texto da Declaração que vem sendo debatida neste Grupo de Trabalho Intergovernamental. Temas como reparação, o uso das novas tecnologias de inteligência artificial, bem como atenção com a agenda do clima, também foram objeto de debates.   

Ao final dos trabalhos, houve a finalização da primeira leitura do texto da Declaração que se seguirão nas próximas reuniões do Grupo de Trabalho Intergovernamental, com novos aportes que poderão ser realizados no texto.  

Raça e Igualdade e ALDA, expressam o entendimento de que este espaço deve ser plural e esperamos que, mesmo que de forma indireta, possamos propiciar uma maior participação das entidades da sociedade civil para construção da Declaração sobre a proteção, promoção e efetivo cumprimento dos direitos das pessoas Afrodescendentes. 

 

[1] https://ecosoc.un.org/en/ngo/consultative-status  

[2] Articulación Latinoamericana para los Decenios Afrodescendientes – ALDA e a Coalizão de Organizações Defensoras do Território Ancestral e das Terras Coletivas dos Afrodescendentes da América Latina e do Caribe fazem parte do movimento social afrodescendente que promove a causa do reconhecimento, da justiça e da reparação histórica da diáspora africana no mundo. A ALDA e a COALIZAÇÃO fizeram parte das organizações da sociedade civil que apoiaram e promoveram a proposta de reconhecimento dos povos afrodescendentes no direito internacional, especialmente no âmbito da última COP 16 realizada na cidade de Cali sob os auspícios do governo colombiano. 

Política Nacional para Povos e Comunidades de Terreiro e Matriz Africana: Uma Iniciativa por Direitos e Reparação

Brasil, 21 de janeiro de 2025 – Neste ano, em celebração ao Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, o Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) celebra uma importante conquista em prol do enfrentamento do racismo religioso no Brasil: a Política Nacional para Povos e Comunidades Tradicionais de Terreiro e Matriz Africana. Decretada pelo Presidente Lula, em novembro de 2024, esta política constitui-se como um valoroso legado do Ministério da Igualdade Racial (MIR) pelos direitos dos povos e comunidades de terreiro.

O lançamento oficial aconteceu no dia 15 de janeiro de 2025, no Ilê Axé Omiojuarô, terreiro fundado por Mãe Beata, em Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro. Com a presença da Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco; do Secretário Nacional de Territórios e Sistemas Produtivos Quilombolas e Tradicionais do Ministério da Agricultura (MDA), Edmilton Cerqueira; o evento também contou com ilustres lideranças de matriz africana, como o Babalorixá da Casa, Baba Adailton Moreira, Mãe Meninazinha de Oxum, do Ilê Omolu Oxum; além da Coordenadora Geral da ONG Criola, Lúcia Xavier.

Luzi Borges, Diretora nacional de políticas para povos e comunidades tradicionais de matriz africana e de terreiro do Ministério da Igualdade Racial, abriu a mesa apresentando o plano de ação e as diretrizes e princípios que compõem esta nova Política. Fruto de uma extensa pesquisa e trabalho do MIR, a Diretora explicou que foram mapeadas 93 iniciativas para ações concretas durante os próximos 2 anos. Além disso, esta Política está articulada com 11 ministérios, sendo que cinco ministérios formam parte de um comitê gestor que irá monitorar a efetividade e aplicação destas iniciativas perante os povos de terreiro.

Entre as iniciativas que compõem esta Política, Luzi citou a capacitação da gestão de justiça, visando uma interlocução com o sistema judiciário para ampliar o acesso à justiça nos casos que envolvam racismo religioso. Ademais, o direito a maternidade no axé e a questão da mobilidade social são iniciativas que mostram a interseccionalidade das ações previstas para a construção de um olhar de respeito, participação e melhorias das condições de vida destas comunidades.

Ademais, o Observatório do Racismo Religioso, que já existia no Rio de Janeiro, em homenagem a Mãe Beata foi ampliado a nível nacional. Com um orçamento de R$ 115 milhões, esta Política é celebrada por ser um instrumento de garantias institucionais para o enfrentamento ao racismo religioso, pois mesmo mudando a gestão, os povos de terreiro seguem com seus direitos salvaguardados pela Lei.

Ao celebrar a conquista desta Política, a Ministra Anielle Franco recordou que ouviu muitas vezes que seria loucura insistir na criação e no fomento desta Política, mas trouxe à tona que em sua trajetória aprendeu que aquilo que move cada um nos leva a conquista dos nossos direitos. E enfatizou que essa Política é mais um passo para a não naturalização da violência contra as pessoas negras e da depredação dos terreiros.

“É importante lembrar e ter memória para que a gente não cometa os mesmos erros e para que a gente saiba onde quer chegar, pois enquanto estivermos aqui, vamos lutar para que se concretize, para que não seja mais um passo dado que não fique no esquecimento”, enfatizou Anielle em referência à trajetória do movimento negro, especialmente dos povos de terreiro, ao lançar a referida Política.

Em sua fala, Baba Adailton Moreira celebrou este lançamento ser realizado dentro de uma comunidade de terreiro, fato que para ele, demonstra que a luta pelos direitos e pelo enfrentamento ao racismo religioso não foi em vão. Além disso, ele reiterou a importância de seguir lutando pelo que é correto, para que as comunidades e povos de terreiro possam exercitar seus direitos políticos no país.

O Dia Nacional de Combate à Intolerância Religioso foi instituído através da Lei 11.635/2007, em homenagem à Mãe Gilda de Ogum, falecida em janeiro de 2020, devido a problemas de saúde ocasionados por atos decorrentes do racismo religioso. A liberdade religiosa é um importante vetor de um estado plenamente democrático, no qual o reconhecimento da pluralidade de expressões de fé é um importante caminho de respeito e valorização da cultura e memória dos povos afrodescendentes do Brasil. O racismo religioso afeta diretamente as religiões de matriz africana, atingindo seus cultos e liturgias, patrimônios materiais e imateriais, e até mesmo, a memória ancestral.

Raça e Igualdade se orgulha desta importante conquista, que nasceu de uma demanda que urgia da sociedade civil, através do movimento negro e das comunidades de matriz africana. Desde 2021, seguimos com o projeto de combate ao racismo religioso que, unidos a importantes ativistas e lideranças afro-religiosas, nos permite enxergar com admiração este importante passo que veio de longe, resultado de saberes ancestrais, e se concretizou em uma notória Política de proteção de direitos aos povos de axé.

 

NOTA DE REPÚDIO: URGIMOS PELA PROTEÇÃO DO POVO INDÍGENA AVA GUARANI NO PARANÁ!

Brasil, 07 de janeiro de 2025 – Sob ataques constantes de pistoleiros, indígenas da etnia Ava Guarani, pertencentes à comunidade Yvy Okaju, localizada entre Guaíra e Terra Roxa, no Paraná, clamam por socorro às autoridades! Quatro indígenas, incluindo uma criança e um adolescente, foram baleados por invasores mascarados que entraram atirando na comunidade. No dia 03 de janeiro, foi denunciado o quarto ataque em sete dias. O medo e a violência assombram o povo Ava Guarani que também tiveram uma casa queimada durante os ataques.

Mesmo tendo suas terras delimitadas desde 2018 pela FUNAI, há anos a Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá é alvo de conflitos, pois a construção da hidrelétrica Itaipu Binacional expulsou-os de seus territórios que está em processo de retomada. Portanto, perguntamos quais os interesses escusos na manutenção dessa violência?

O relatório “Violência contra os povos indígenas do Brasil” [1], elaborado pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), demonstra que em 2023 foram registrados 1276 casos de violências contra o Patrimônio” dos povos indígenas, especialmente a omissão e morosidade na regularização de terras (850 casos); conflitos relativos a direitos territoriais (150 registros); e invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio (276 casos). O documento apresenta, 411 registros de violência contra a pessoa em 2023 – entre os casos: abuso de poder (15 casos); ameaça de morte (17); ameaças várias (40); assassinatos (208); homicídio culposo (17); lesões corporais (18); racismo e discriminação étnico-cultural (38); tentativa de assassinato (35); e violência sexual (23).

A ONU já se pronunciou sobre a urgência na demarcação das terras indígenas e sobre a tese do Marco Temporal, que é contrária a toda legislação internacional de direitos humanos. A omissão estatal – ou a demora em ações concretas – mostra a ausência de compromisso do Estado à diversos compromissos internacionais, o que pode e deve gerar responsabilização internacional.

Raça e Igualdade rechaça a omissão e a inércia do Poder Público sobre a violência contra os povos indígenas, que perpetua o colonialismo, o racismo e o morrer. É preciso a construção de políticas de prevenção e de ação imediata no caso de novos atos delituosos, com a devida punição dos responsáveis, e pleiteia pelo direito à reparação dos povos originários. Não ao marco temporal! Chega de genocídio contra os povos indígenas!

 

[1] https://cimi.org.br/wp-content/uploads/2024/07/relatorio-violencia-povos-indigenas-2023-cimi.pdf

A Escalada da Violência Policial em São Paulo: e agora, quem protege os cidadãos?

Brasil, 05 de dezembro de 2024 – O Brasil segue a passos largos na contramão do desrespeito aos direitos humanos, sobretudo quando observamos o racismo estrutural e sistêmico, fruto de políticas contínuas que evidenciam violações e o menosprezo à vida de pessoas negras. A violência como política de segurança pública revela-se, principalmente, perante os moradores nas periferias dos grandes centros urbanos e, somente em 2024, os números das práticas abusivas de violência policial seguem subindo exponencialmente. Diante deste cenário, o Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade), urge pela ação objetiva e direta do Estado brasileiro diante da gestão da segurança pública de São Paulo. É preciso uma política de segurança pública que garanta direitos aos cidadãos e em casos de violação por parte de agentes públicos, seja capaz de responsabilizar as autoridades, pelos atos da corporação militar.

O Estado de São Paulo, segundo dados do Ministério Público Estadual, teve um aumento de 46% nas mortes cometidas por policiais. Somente de janeiro a novembro de 2024, houve 673 mortes pelas mãos da polícia paulista, com média de duas vítimas letais por dia. [1]

Os últimos acontecimentos demonstram um descontrole e ausência de gestão da política de segurança pública no Estado de São Paulo. Diversos casos foram testemunhados por cidadãos e, até mesmo, através das câmeras corporais dos policiais que evidenciam a violência exacerbada, mesmo quando o suspeito está dominado. As ações brutais da PM vão desde tiros na cabeça, execuções pelas costas com 11 tiros, execução a queima roupa, morte de criança em suposto tiroteio, agressões físicas diversas, uma pessoa abordada por 13 policiais, e um policial atirando o corpo de uma vítima de cima de uma ponte na zona sul de São Paulo, entre outros. Estes casos nos levam a seguinte questão: há algum tipo de controle efetivo da polícia militar ou esta polícia tem salvo conduto do governo do Estado para praticar violações?

Ademais, ressaltamos que a criação de uma Ouvidoria Paralela pelo Secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite é mais uma indicação de que as forças policiais do Estado de São Paulo continuarão sua escalada de violência e de impunidade, tendo em vista que já existe uma Ouvidoria da Polícia Civil, que vem diuturnamente denunciando a política de Segurança Pública do Estado de São Paulo. A criação de uma ouvidoria paralela, sem qualquer autonomia, reforça, segundo a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB – SP), mais um passo no enfraquecimento dos mecanismos de controle e transparência da atividade policial no estado.

“É evidente que a política de segurança pública no Estado de São Paulo segue um caminho contrário dos diversos relatórios das Nações Unidas que indicam que há necessidade da aplicação de procedimentos de monitoramento, de uma corregedoria que seja efetiva e não corporativista, permitindo que os processos de apuração sejam céleres, imparciais e transparentes, e que a política de segurança pública possa restabelecer alguma credibilidade, assim como no governo do Estado de São Paulo”, aponta Rodnei Jericó, Diretor de Raça e Igualdade no Brasil.

Após sua visita ao Brasil, em agosto de 2024, a Relatora Especial da ONU sobre formas contemporâneas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata, Ashiwini K.P., publicou um relatório sobre a questão racial no país ressaltando a gravidade e complexidade da violência das forças de segurança pública. O documento insta o Estado a tomar medidas mais efetivas frente ao sistema carcerário e, mesmo reconhecendo que o uso de câmeras policiais seja um passo importante para uma política de segurança antirracista, sinalizou que há relatos de que essas câmeras não são utilizadas e que medidas de perfilamento racial estão sendo utilizadas pelo governo sem base científica. Ademais, a Relatora apontou que são especialmente mães afrodescendentes que perdem os seus filhos em razão da brutalidade policial, e que além de vítimas, estas também são criminalizadas.

Em outubro de 2024, o Mecanismo Internacional de Especialistas Independentes para o Avanço da Igualdade e Justiça Racial na Aplicação da Lei – EMLER publicou relatório destacando o racismo sistêmico enraizado na polícia e no sistema de justiça criminal, onde o preconceito racial, o perfilamento racial e os estereótipos raciais influenciam a ação e a inação do Estado. O uso excessivo da força de segurança pública que leva a milhares de mortes todos os anos e o encarceramento excessivo, que afetam desproporcionalmente as pessoas negras, são uma consequência do racismo sistêmico que, combinado com as atuais políticas de “guerra ao crime”, resulta em um processo de limpeza social que serve para exterminar setores da sociedade considerados indesejáveis, perigosos e criminosos. Esta é uma questão sistêmica generalizada que exige uma resposta sistêmica e abrangente.

Entre as diversas recomendações emitidas pelo EMLER, é importante evidenciar na luta contra a violência policial com perfilamento racial os seguintes pontos:

  1. Estabelecer por lei um órgão de controle civil nacional da força policial.
  2. Estabelecer o uso obrigatório nacional de câmeras corporais por policiais.
  3. Adotar uma abordagem baseada em direitos humanos para o policiamento.
  4. Acabar com as atuais políticas de “guerra às drogas” e “guerra ao crime” e adotar uma abordagem baseada nos direitos humanos para essas questões.
  5. Adotar uma legislação nacional sobre o uso da força que esteja em conformidade com as normas internacionais de direitos humanos – particularmente com os princípios de legalidade, precaução, necessidade, proporcionalidade, responsabilidade e não-discriminação, e a obrigação de proteger e respeitar o direito à vida.
  6. Garantir que o perfilamento racial seja claramente definido e proibido por lei, e investigar todas as alegações de perfilamento racial e processar os casos em conformidade.
  7. Garantir a adequada responsabilização em todos os casos de uso excessivo da força e outras violações dos direitos humanos por agentes da lei, inclusive responsabilizando superiores e comandantes de operações, também responsabilizar as agências policiais enquanto instituições, e não apenas as e os oficiais diretamente envolvidos.
  8. Garantir o direito das vítimas a reparações, notadamente através do estabelecimento por lei de um mecanismo independente especializado centrado nas vítimas com suficiente orçamento, especificamente concebido para apoiar indivíduos e comunidades afetadas.

 

 

[1] https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2024/12/04/sp-acumula-casos-de-violencia-policial-recentes-no-ano-mortes-pela-pm-no-estado-aumentaram-46percent.ghtml

Tracie Keesee, Especialista do EMLER, participa de evento na Câmara dos Deputados

Brasil, 01 de novembro de 2024 – No próximo dia 5 de novembro, às 9h, a Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial da Câmara dos Deputados, presidida pela deputada Daiana Santos (PCdoB-RS), realizará o evento “Justiça Racial no Cenário Internacional”. O encontro discutirá o cumprimento, no Brasil, das recomendações do Mecanismo Internacional de Especialistas para o avanço da igualdade e justiça racial, além dos encaminhamentos do Fórum Permanente de Afrodescendentes da ONU e da Conferência da Diáspora Africana, realizada em Salvador no mês de setembro.

O Seminário reunirá entidades políticas nacionais e internacionais, lideranças da sociedade civil e convidados como a Dra. Tracie Keesee, Integrante do Mecanismo Internacional de Especialistas Independentes da ONU para Promoção da Justiça Racial na Aplicação da Lei (EMLER) e ex-comissária de Diversidade e Inclusão da Polícia de Nova York; a Ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, a Ministra dos Direitos Humanos e Cidadania, Macaé Evaristo e a Conselheira Bruna Vieira de Paula, Chefe da Divisão de Direitos Humanos do Ministério das Relações Exteriores. Elas debaterão sobre boas práticas e os desafios na implementação das recomendações da ONU para promover efetivamente a proteção e promoção dos direitos humanos no Brasil.

Daiana Santos destacou a importância de a Câmara Federal sediar o encontro e convocou a população a participar:

“A realização deste seminário simboliza um compromisso concreto com a luta pela igualdade racial e enfrentamento ao racismo, uma pauta que exige nossa determinação e atenção constante. É fundamental que a população se engaje nesse diálogo, pois somente com a nossa mobilização ativa alcançaremos as mudanças necessárias nas estruturas que perpetuam o racismo e as desigualdades históricas no Brasil e no Mundo.”

Dividido em dois painéis, a primeira mesa intitulada ‘Diálogos intersetoriais sobre recomendações da ONU em pauta raciais’ enfatizará o fortalecimento da participação e a representação das vozes afrodescendentes nas esferas política e social, com a participação da Ministra Macaé Evaristo (MDHC), Lúcia Xavier (Criola), Rodnei Jericó (Raça e Igualdade), Deputada Daiana Santos (CDHMIR), além da convidada internacional Tracie Keesee (EMLER).

O segundo painel, ‘Diálogos sobre o papel do Estado e da Sociedade Civil no cumprimento de recomendações da ONU relativas à pauta racial’, contará com a presença da Ministra Anielle Franco (MIR), Deputada Daiana Santos (CDHMIR), Bruna Vieira de Paula (Itamaraty – MRE), Leonardo Magalhães (Defensoria Pública Geral da União), Maria do Carmo Rebouças dos Santos (Observatório ODS-18/Universidade Federal do Sul da Bahia) e Baba Adailton Moreira (Ilê Axé Omiojuarô). 

Rodnei Jericó, Diretor do Instituto Raça e Igualdade no Brasil, destacou que o evento é uma oportunidade importante para alinhar a agenda de justiça racial promovida pela sociedade civil junto às autoridades brasileiras. A discussão sobre o relatório EMLER e sobre o Comitê CERD sinaliza a retomada dos compromissos democráticos: 

“Diante dos desafios para implementar políticas de direitos humanos, o evento na Câmara dos Deputados busca compartilhar boas práticas nacionais e internacionais e apoiar a implementação efetiva das recomendações dos tratados da ONU.”

O evento é uma parceria entre a Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial, Instituto Raça e Igualdade e a Universidade Federal do Sul da Bahia. 

Imunidade aos Militares, Impunidade aos Crimes Estatais: #JustiçaParaJohnatha

Brasil, 03 de outubro de 2024 – Após quase dez anos de espera para o Júri do caso Johnatha, jovem negro periférico assassinado em maio de 2014 na Favela de Manguinhos, cujo crime cometido por um policial militar, foi desqualificado como homicídio culposo, ou seja, quando não há intenção de matar. Essa  decisão, contrária às provas dos autos, levou o Ministério Público a apelar pela nulidade do julgamento. No entanto, o recurso que seria julgado hoje, 03 de outubro de 2024, foi remarcado às vésperas, por ausência de intimação do advogado de defesa.

Raça e Igualdade repudia a morosidade excessiva do Judiciário com o caso, e que corrobora com mais uma violência enfrentada pelos familiares, especialmente por Ana Paula de Oliveira, mãe de Johnatha, que vem a ser revitimizada pelo descaso do sistema de justiça. Ana Paula está essa semana em Genebra, para denunciar a ausência de responsabilidade do Estado pelo ocorrido, a falta de políticas de reparação para os familiares e a criminalização e desumanização da vítima perante as Nações Unidas. Além disso, a mãe de  Johnatha acompanhou o lançamento do relatório do Mecanismo EMLER sobre o Brasil, no qual teve um importante espaço de fala diante dos Especialistas da ONU.

Somente neste ano de 2024, é possível constatar a omissão estatal e Judiciária em vários casos envolvendo vítimas da brutalidade policial.  Além do Johnatha, ocorreu o julgamento do caso João Pedro, que com 14 anos foi baleado por um tiro de fuzil enquanto brincava com os primos na casa de familiares, e, impunentemente, resultou na absolvição dos acusados. Sem esquecer o julgamento do caso da Cláudia, que foi arrastada pela viatura policial após ter sido baleada, e mais uma vez, os acusados foram absolvidos, com a alegação de erro de execução. E também nesta data de hoje, dia 03/10, Kathlen Romeu, que foi baleada grávida, faria 28 anos. Novamente, uma bala de fuzil dilacerando peles negras.

Ressaltamos que o EMLER destaca em seu relatório o racismo sistêmico, que está presente no Estado e no sistema de Justiça Criminal.  Em seus termos enfatiza que “o uso excessivo da força que leva a milhares de mortes todos os anos e o encarceramento excessivo, que afetam desproporcionalmente as pessoas afrodescendentes, são uma consequência do racismo sistêmico que, combinado com as atuais políticas de “guerra ao crime”, resulta em um processo de limpeza social que serve para exterminar setores da sociedade considerados indesejáveis, perigosos e criminosos. Esta é uma questão sistêmica generalizada que exige uma resposta sistêmica e abrangente.” Raça e Igualdade se une às Mães de Manguinhos e a UNARC, para gritar por justiça e por políticas reparatórias para as vítimas e familiares que acabam revivendo constantemente a dor e a violência da perda, passando por violência física e mental sem qualquer amparo estatal.

 

Curso debate cobertura jornalística sobre religiões de matriz africana.

A formação é organizada por Raça e Igualdade, em parceria com a Alma Preta;

Como convidada, Katiuscia Ribeiro, filósofa e pesquisadora, será uma das palestrantes dos encontros virtuais.

 

O curso de formação para jornalistas e estudantes sobre como cobrir temas ligados às religiões de matriz africana ocorre nos dias 12 e 19 de outubro, dois sábados, das 9h às 13h. Organizado pelo Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) em parceria com a Alma Preta, o curso “Racismo Religioso na Mídia: formação para jornalistas e estudantes” é gratuito e as inscrições podem ser feitas aqui até o dia 8 de outubro. 

A formação tem como objetivos centrais apresentar os estereótipos negativos perpetuados pela imprensa acerca dos cultos afro-brasileiros e indicar caminhos de fontes, dados e ângulos de coberturas possíveis sobre o tema. A formação terá momentos de introdução básica sobre o tema, com a apresentação dos princípios das matrizes africanas e afro-brasileiras, e sinalização de locais e pessoas com quem o jornalista pode apurar dados acerca desse segmento social.  

Os encontros terão a participação de pessoas com experiência na área e reconhecimento na sociedade. Katiuscia Ribeiro, pesquisadora de filosofia africana, é uma das participantes do encontro. Outra é Lúcia Xavier, uma das fundadoras da organização de mulheres negras Criola, que abordará sobre as violências contra os terreiros e territórios de matriz africana e analisará as respostas dadas por organizações negras acerca da violência sofrida por esse segmento da sociedade. A formação ainda conta com a presença de Babá Adailton Moreira, Babalorixá do Terreiro Ilê Axé Omiojuarô, em Nova Iguaçu (RJ), e doutorando em bioética pela UFRJ. 

Durante o curso, o jornalista Pedro Borges, um dos fundadores da Alma Preta, apresentará caminhos de apuração para tratar os temas ligados às religiões de matriz africana, crimes de racismo religioso e os cuidados para a não reprodução de estereótipos. Os participantes receberão um certificado de formação ao final do encontro. 

Um dos desdobramentos do curso será a produção de um catálogo de fontes com especialistas e lideranças das religiões de matriz africana. O projeto será desenvolvido pela Alma Preta, com previsão de publicação ainda neste ano.

Organização do curso: 

Raça e Igualdade 

O Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) é uma organização não-governamental internacional que colabora com organizações parceiras e ativistas no Brasil e na América Latina para promover e proteger os direitos humanos de populações marginalizadas, seja por sua origem nacional ou étnica, orientação sexual, identidade de gênero ou pertencimento religioso. 

Desde 2021, Raça e Igualdade desenvolve um projeto de combate ao racismo religioso, focado na capacitação institucional de inúmeras lideranças religiosas de matriz africana no Brasil. O objetivo é, através do protagonismo desses ativistas, defender a plena e completa incorporação dos temas de racismo religioso nos organismos internacionais de defesa de direitos humanos, em coordenação com a promoção de políticas e mobilização comunitária em nível nacional. Além disso, temos em vistas, através da incidência nacional, capacitar nossos parceiros para que possam fomentar uma agenda de políticas públicas que garantam os direitos e as liberdades das religiões de matriz africana. 

Alma Preta 

Criada em 2015, a Alma Preta faz uma cobertura da realidade brasileira a partir do olhar de jornalistas negros e produz conteúdo em diferentes formatos sobre assuntos variados, como segurança, direitos humanos, cultura, comportamento e política. 

A diversidade é um pilar da comunicação da Alma Preta, que produz conteúdos nas plataformas de áudio e vídeo, com foco para diferentes redes sociais. A agência tem uma pluralidade de vozes negras, com pessoas de diferentes regiões do país e diversas orientações sexuais e de gênero. 

 

Datas: 

12 e 19 de outubro, dois sábados, das 9h às 13h.  

Local: 

Plataforma virtual de Zoom. 

Programação: 

12 de Outubro 

Abertura 

João Pedro Araújo – Oficial de Combate ao Racismo Religioso para Raça e Igualdade no Brasil. 

Rodnei Jericó da Silva – Diretor de Raça e Igualdade no Brasil 

Pedro Borges – Co-fundador da Alma Preta. 

Primeira parte 

Gustavo Mello, Babalorixá Ilê Axé Omi Ogun siwajú, localizado no Recôncavo Baiano. 

Baba Adailton Moreira, Babalorixá do Ilê Axé Omiojuaro, no Rio de Janeiro. 

Lúcia Xavier, Coordenadora Geral da ONG Criola 

Segunda parte 

Pedro Borges, jornalista da Alma Preta. 

Thiago Kairu, Baobá – fortificando raízes, abordará a coletânea “Onã: Caminhos para a Transformação” 

 

19 de Outubro 

Abertura 

Carlos Quesada – Diretor Executivo de Raça e Igualdade. 

 Primeira parte 

Katiuscia Ribeiro, filósofa e pesquisadora sobre filosofia africana, XXXXXXX 

Segunda parte 

Paolla Moura – Oficial de Comunicação de Raça e Igualdade.  

Marco Teobaldo – Coordenação de comunicação do Ilê Omolu Oxum e curador do Museu Memorial Iyá Davina. 

Élida Aquino – Coordenadora de Comunicação da ONG Criola. 

Terceira parte 

Daniele Magalhães – Defensora Pública do Estado do Rio de Janeiro e atualmente Coordenadora de Promoção da Equidade racial da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (COOPERA).  

Quarta parte 

Pedro Borges, jornalista da Alma Preta. 

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