Dia dos Direitos Humanos: em busca da dignidade, liberdade e justiça

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Este ano, a comemoração do Dia dos Direitos Humanos é marcada pelo início da celebração dos 75 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), que acontecerá no dia 10 de dezembro de 2023. As Nações Unidas anunciaram que lançarão uma campanha de um ano para apresentar à DUDH concentrando-se em seu legado, relevância e […]

Este ano, a comemoração do Dia dos Direitos Humanos é marcada pelo início da celebração dos 75 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), que acontecerá no dia 10 de dezembro de 2023. As Nações Unidas anunciaram que lançarão uma campanha de um ano para apresentar à DUDH concentrando-se em seu legado, relevância e ativismo.

Ao nos aproximarmos do 75º aniversário da proclamação desta Declaração – que estabelece uma ampla variedade de direitos humanos e liberdades fundamentais aos quais todas as pessoas, em qualquer parte do mundo, têm direito – é importante refletir sobre o que melhorou e o que piorou em todo esse tempo.

Um bom ponto de partida para esta reflexão é o lema escolhido pelas Nações Unidas para o Dia dos Direitos Humanos deste ano: “Dignidade, liberdade e justiça para todos e todas”. Na América Latina pós-pandemia, esses três princípios são seriamente questionados pelo aprofundamento causado pela Covid-19 das diversas crises que a região atravessa: desigualdade, pobreza, racismo e discriminação, autoritarismo, violência e corrupção.

Cuba: a sociedade civil à sombra do novo Código Penal

Em 1º de dezembro entrou em vigência em Cuba um novo Código Penal, o que significa um aprofundamento da situação de perseguição e criminalização enfrentada por ativistas, defensores de direitos humanos, artistas e jornalistas independentes, pois estabelece novos crimes de forma ambígua e aumenta as penas por outros já existentes, sempre no campo da liberdade de expressão e manifestação pública. Por exemplo, afirma que atos considerados “provocadores” serão sancionados, sem especificar o alcance dessa terminologia.

Durante o ano de 2022 foram registrados na Ilha números recordes de manifestações cidadãs, principalmente devido à escassez de alimentos e medicamentos. Esta situação foi um dos motores dos protestos históricos de 11 de julho de 2021 e nos dias seguintes, que levaram à detenção de mais de mil pessoas, das quais mais de 600 permanecem encarceradas.

Nicarágua: a repressão que perdura e se reinventa

À medida que a crise sociopolítica e de direitos humanos da Nicarágua continua a se aprofundar, o regime autoritário de Daniel Ortega e Rosario Murillo continua a fugir de suas obrigações internacionais de direitos humanos e a usar novas estratégias repressivas para atacar vozes dissidentes.

O governo negou a entrada de nicaraguenses em retaliação por seu ativismo ou papel político. Os casos mais recentes são o de Anexa Alfred Cunningham, advogada e perita do Mecanismo das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, que – apesar de seus privilégios e imunidades – foi impedida de entrar na Nicarágua em junho passado; e o do jornalista Luis Felipe Palacios, delegado da agência de notícias EFE em Managua, que, ao querer embarcar em um voo em Miami para retornar à Nicarágua, foi informado de que não estava autorizado a retornar.

Por outro lado, segundo o monitoramento do Mecanismo de Reconhecimento de Presos Políticos, pelo menos 235 pessoas encontram-se privadas de liberdade por motivos políticos em centros estatais e clandestinos dos quais “continuam a receber informação sobre tortura e maus-tratos… e foram fornecidas informações sobre casos de violência sexual e de gênero”. Além disso, entre as detenções mais recentes, verifica-se um novo padrão repressivo: ao não encontrarem as pessoas consideradas de interesse da Polícia Nacional, os agentes procedem à detenção arbitrária dos seus familiares.

Colômbia: o segundo país mais perigoso para lideranças sociais da região

Um dos principais efeitos sobre os direitos humanos neste país é a violência contínua contra pessoas que são lideranças sociais e defensores de direitos, que são perseguidos, sequestrados e assassinados, como represália e punição por seu trabalho diário. Segundo os dados do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento e a Paz (Indepaz), até agora, em 2022, 180 lideranças sociais foram assassinadas, incluindo Breiner David Cucuñame, um menino ambientalista de 14 anos.

Enquanto isso, informações da Ouvidoria indicam que entre maio e agosto de 2022, receberam e verificaram 62 casos de homicídios de lideranças sociais e defensores de direitos humanos, segundo comunicado da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) sobre o assunto na região, situação que também é particularmente preocupante no Brasil, Guatemala, Honduras e México.

Peru: entre a crise política e a investida de grupos antidireitos

Foi somente em 7 de dezembro que o Peru abriu um novo capítulo na profunda crise política que vive há meses. Horas depois que o presidente Pedro Castillo anunciou a dissolução do Congresso para instalar um novo, com a tarefa de formar uma Assembleia Constituinte, o Poder Legislativo aprovou sua destituição e Castillo foi preso. Em seu lugar, foi nomeada a vice-presidente Dina Boluarte. Este processo de destituição – ou moção de vacância – foi o terceiro que Castillo enfrentou em menos de dois anos, ao mesmo tempo em que pesavam graves acusações de corrupção contra ele, junto com vários ministros e associados.

A isso se acrescenta que no Poder Legislativo grupos conservadores tentam posicionar uma agenda em detrimento das mulheres e pessoas LGBTI+, atacando diretamente a abordagem de gênero na educação, a descriminalização do aborto, os direitos LGBTI+, para os quais convidam abertamente os chamados grupos antidireitos para consulta. O último projeto de lei aprovado foi o 904/2021, que foi proposto pela bancada ultraconservadora Renovación Popular, que reduz a autonomia do Ministério da Educação (Minedu), além de eliminar a abordagem de gênero e a educação sexual integral no conteúdo dos materiais educativos nas escolas.

Brasil: Protagonismo dos movimentos sociais na luta pelos direitos humanos 

A luta pela proteção e garantia de direitos humanos no Brasil tem como expoente as lideranças dos movimentos sociais que historicamente têm denunciado a situação do uso excessivo da força pela polícia nas favelas, atentando contra a vida das pessoas negras, LGBTI+, contra as mulheres negras, sobre a violência sofrida pelos praticantes de religiões de matriz africana, e como o racismo no sistema de justiça brasileiro tem gerado um alto grau de impunidade aos infratores. Ativistas indígenas têm exposto os impactos da mineração ilegal e extração de madeira em seus territórios e como o estado tem falhado na proteção da vida dos povos originários, convocando toda a comunidade internacional a pensar saídas e estratégias que possibilitem a defesa dessa população.

Desde janeiro de 2019, com a posse do presidente Jair Bolsonaro, houve um recrudescimento da ofensiva contra os direitos humanos da população negra, dos povos indígenas, da população LGBTI+ no Brasil, marcado pelo racismo, preconceito, discriminações e discursos de ódio, assim como por ações violentas cometidas pelo próprio Estado que deveria proteger e promover direitos, e ainda, pelo desmantelamento e encerramento de políticas públicas criadas em governos anteriores, situação que tem precarizado a manutenção do bem-viver das pessoas em situação de vulnerabilidade no país.

O movimento negro, indígena e LGBTI+ brasileiro tem trabalhado ativamente na construção de uma agenda de combate ao racismo e todas as formas de intolerância, preconceito e violência, visando a garantia e proteção dos direitos humanos.

República Dominicana

Na República Dominicana, o governo de Luis Abinader está realizando uma campanha racista e xenófoba de perseguição e expulsão em massa contra imigrantes haitianos, dominicanos de ascendência haitiana e dominicanos negros. Nesse sentido, segundo dados do Escritório Nacional de Migração do Haiti, pelo menos 50.000 haitianos foram deportados da República Dominicana no último trimestre (setembro-novembro).

Organizações de direitos humanos também documentaram buscas domiciliares sem mandado, ameaças e tortura por parte de policiais e agentes de imigração, detenções arbitrárias, dentre as quais foram presas mulheres grávidas e crianças sem a companhia de seus representantes legais; furtos de bens, centros de detenção insalubres, expulsões de pessoas por pontos de fronteira não oficiais em dias e horários fora dos estabelecidos, entre outras violações.

Deve-se notar que, para legitimar essas graves violações dos direitos humanos, o Presidente emitiu o decreto 668-22 “para prevenir e processar invasões e ocupações irregulares de propriedades privadas e do Estado” em 11 de novembro. Isso configura violação de tratados e pactos internacionais sobre direitos humanos, especialmente aqueles que se referem ao direito de refúgio.

Tudo isso apresenta um cenário sem esperança, onde a existência de mecanismos nacionais e internacionais de promoção e proteção dos direitos humanos parece não ser suficiente para os Estados adotarem e implementarem políticas e medidas que garantam uma vida digna, com liberdade e justiça para todas as pessoas. O que é preciso para atingir aquele objetivo que, por enquanto, parece uma miragem? Como se passa das palavras aos atos?

O movimento de direitos humanos, formado hoje por centenas de organizações que atuam na promoção e defesa dos direitos e liberdades fundamentais para diversos setores, vem dando passos significativos ao tornar visíveis as necessidades e demandas de grupos populacionais vulneráveis ​​e excluídos, formulando políticas públicas, recomendações, executando projetos de impacto social e ativando mecanismos de proteção em nível nacional, regional e internacional.

No entanto, nos últimos anos foi erguido um muro que impede de avançar com pés firmes, e que é composto por diferentes fatores: a falta de vontade política, o aumento do discurso de ódio e de grupos conservadores, a consolidação de governos autoritários, a impunidade na atuação de grupos armados irregulares e a atividade extrativista, para citar alguns.

Unindo esforços, compartilhando esperança

Diante das múltiplas dificuldades para a promoção e proteção dos direitos humanos, o Instituto Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade), juntamente com treze organizações civis da América Latina e Caribe, decidiu impulsionar a criação do Fórum Regional sobre Direitos Humanos, o RegionaR. A partir da análise do contexto da região numa perspectiva interseccional, esta iniciativa busca superar a fragmentação e iniciar um caminho que facilite a defesa integrada e simultânea de todos os direitos.

O Fórum realizou sua primeira ação conjunta nos dias 29 e 30 de novembro em Bogotá, na Colômbia, por meio da Conferência Regional de Direitos Humanos, RegionaR. Nesse espaço, mais de 150 organizações sociais da região se reuniram para discutir, refletir e encontrar pontos de atuação comuns para dar continuidade ao seu trabalho. O resultado foi uma carta conjunta com seis pontos-chave para a defesa dos direitos humanos, das liberdades fundamentais e da proteção da Mãe Terra a partir de uma perspectiva interseccional, diversa, inclusiva e multicultural.

Raça e Igualdade, em seu firme propósito de promover e proteger os direitos humanos, acredita que o trabalho conjunto é fundamental para alcançar mudanças estruturais e construir uma sociedade democrática e inclusiva. Reunindo vontades e coordenando ações, poderemos ter uma visão completa da realidade e do que precisa ser feito para transformá-la, e poderemos formular estratégias efetivas de incidência perante os Estados e mecanismos internacionais, a fim de que nossas recomendações sejam aceitas e implementadas. A União faz a força.

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