Sete fatos que você deve saber sobre a situação das pessoas transmasculinas e de gênero não-binário na região andina

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Seis defensores de direitos humanos da região compartilharam informações na Conversa Internacional “Identidade, nosso direito”, realizada no âmbito da 52ª Assembléia Geral da OEA em Lima. Washington DC, 18 de outubro de 2022.- Nenhuma pessoa pode ter uma vida digna sem um documento de identidade que lhe permita acessar seus direitos fundamentais e que realmente […]

Seis defensores de direitos humanos da região compartilharam informações na Conversa Internacional “Identidade, nosso direito”, realizada no âmbito da 52ª Assembléia Geral da OEA em Lima.

Washington DC, 18 de outubro de 2022.- Nenhuma pessoa pode ter uma vida digna sem um documento de identidade que lhe permita acessar seus direitos fundamentais e que realmente a represente. No Peru, pessoas transmasculinas e de gênero não-binário devem passar por processos legais caros, longos e incertos para que seus nomes e/ou gênero sejam alterados em seus documentos de identificação (RG). Em outros estados da região, apesar de haver regulamentações nesse sentido, ainda existem dificuldades que causam falta de proteção e violência contra pessoas de gêneros diversos.

No âmbito da 52ª Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) “Juntos contra a desigualdade e a discriminação”, que aconteceu de 5 a 7 de outubro em Lima, o Instituto Internacional sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade), Fraternidad Trans Masculina Perú e Fuerza No Binarie realizaram a Conversa Internacional sobre Transmasculinidades e Pessoas Não-Binárias: “Identidade, nosso direito”.

Esse evento foi desenvolvido de forma híbrida (você pode ver a discussão completa nesse link) e participaram representantes e ativistas de organizações de países da região sul, como Mateo Rodrigo Solares, da Hombres Trans Diversos da Bolívia; Michael Gabriel De Prada Padilla, da Fraternidade Trans Masculina do Equador; e Gabe Van, da Liga Transmasculina João W. Nery do Brasil. Do Peru, Kit Huayas Bernabé, da Fuerza No Binari; e Fhran Medina, consultor jurídico peruano especializado em direito à identidade. Além disso, a discussão foi liderada por Bruno Montenegro, coordenador da Fraternidade Transmasculina do Peru.

Kit Huayas Bernabé, pessoas de gênero não-binário da Fuerza No Binarie do Peru.

Durante uma hora e meia, seis defensores de direitos humanos da região compartilharam informações sobre os diversos marcos jurídicos de seus países, suas experiências na luta contra as barreiras institucionais e sociais que devem ultrapassar devido à sua identidade de gênero. Aqui está um resumo de sete ideias principais que a conversa deixou:

  1. A lei não é suficiente. Embora, em países como Bolívia e Equador, exista uma lei de identidade de gênero, isso não garante proteção integral para pessoas transmasculinas e de gênero não-binário. Na Bolívia, inclusive, apenas as pessoas trans têm o campo ‘gênero’ em sua carteira de identidade, enquanto as pessoas cisgênero mantêm a categoria ‘sexo’ em seus documentos. Consequentemente, essa diferenciação que é feita com a lei de identidade de gênero acaba por expor as pessoas trans a situações de vulnerabilidade.
  2. A alteração dos dados de sexo não possui um procedimento padrão. No Peru, a única maneira de alterar o dado ‘sexo’ no documento de identidade é por meio de um processo judicial caro, demorado e revitimizante. Além disso, os tribunais em nível nacional não possuem um procedimento padrão para isso. Alguns juízes exigem atestados psicológicos e psiquiátricos, além de prontuários médicos que comprovem alguma cirurgia no corpo para validar a alteração dos dados de sexo.
  3. A identidade de gênero não é binária. Os dois projetos de identidade de gênero existentes no Peru consideram apenas pessoas transfemininas e transmasculinas, não incluindo nem nomeando pessoas de gênero não-binário.
  4. Pessoas transmasculinas fazem abortos. Se por si só o direito ao aborto é uma questão controversa em muitos países latino-americanos, em países onde é legal —em certos fundamentos—, nenhuma legislação menciona a capacidade e o desejo de gestar de corpos transmasculinos e não-binários. Muitas vezes, pensa-se que não há possibilidade de exigir o serviço de aborto, uma vez que tenha sido decidida a transição para a masculinidade ou neutralidade.
  1. Bruno Montenegro, Mateo Rodrigo Solares, Gabriel de Prada Padilla, Kit Huaynas Bernabé, Fhran Medina y Gaby Van.

    A medicina continua a estigmatizar as pessoas trans. No campo da saúde, as pessoas de gênero trans e não-binárias são catalogadas com diagnósticos patologizantes. São pouquíssimos os profissionais de saúde que não buscam tornar as pessoas trans “normais”, ou seja, heterossexuais cisgêneros. No caso do Brasil, apesar de ter uma portaria que viabiliza o processo de sexualização trans pelo Sistema Único de Saúde, poucos estados disponibilizam hormônios, e o fazem sem respeitar a identidade e a presença trans nos espaços de saúde.

  1. Discriminação contra pessoas transmasculinas também afeta seus filhos. Nos países onde existe uma lei de identidade de gênero, ainda há batalhas judiciais contra o Registro Civil, pois não há procedimentos que reconheçam os filhos de pais transmasculinos e seu direito à família.
  2. Pessoas transmasculinas e não-binárias também sofrem outras violências. Ao falar sobre a população de gênero não normativa, é importante enfatizar de qual corpo se está falando. No Brasil, a cada 23 minutos um negro é assassinado. É o país da região onde mais pessoas trans são mortas e é o quinto onde mais pessoas transmasculinas cometem suicídio. Tornar visíveis essas interseccionalidades e o grau de violência a que as pessoas transmasculinas e não-binárias estão expostas é crucial para melhorar seus contextos.

O evento culminou com a intervenção de Fhran Medina, que recomendou o consumo da produção acadêmica realizada por pesquisadores trans da região; o primeiro é “Corpos e resistências que transgridem a pandemia” de Raça e Igualdade, e o segundo é “Homens não choram: preconceitos sobre identidades transmasculinas na região andina” da Fundação GAAT.

Cabe destacar que tanto no Peru quanto no Brasil, Raça e Igualdade vem apoiando os processos legais de mudança de nome nos documentos de identificação de pessoas trans e não-binárias. A Fraternidad Trans Masculina Peru recebeu, durante 2021, mais de 70 solicitações para processar processos de mudança de nome para pessoas trans. Em 2022, com o apoio do Raça e Igualdade, serão realizados ​​gratuitamente 16 casos de mudança de nome de pessoas trans em estado de vulnerabilidade. Da mesma forma, no Brasil, será alcançada a mudança de nome de mais de 100 pessoas trans, em aliança com a organização Grupo Pela Vidda.

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