“PROTEJA SEUS DIREITOS”: a campanha que busca proporcionar ferramentas pedagógicas que ajudem a reduzir a violência contra os defensores do meio ambiente na região

“PROTEJA SEUS DIREITOS”: a campanha que busca proporcionar ferramentas pedagógicas que ajudem a reduzir a violência contra os defensores do meio ambiente na região

Brasil, 18 de junho de 2024 –  O Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) se uniu à American Bar Association – ABA ROLI e diversos grupos de organizações da sociedade civil [1] que trabalham pelos direitos dos Defensores Ambientais (DE) na América Latina, para lançarem a campanha “PROTEJA SEUS DIREITOS”. Esta iniciativa faz parte do Programa de Apoio aos Defensores do Meio Ambiente na América Latina e tem como objetivo contribuir para a redução da violência contra os DE na região amazônica da Colômbia, Equador, Bolívia, Brasil, Venezuela e Peru; fornecendo ferramentas pedagógicas que promovam o fortalecimento das capacidades das organizações da sociedade civil e DE, para acessar os sistemas de justiça a fim de promover e proteger os direitos humanos através do trabalho de incidência e litígio estratégico a nível regional e internacional.

A América Latina é conhecida por sua diversidade biológica em nível mundial, mas também é uma das regiões mais perigosas para os defensores do meio ambiente. Segundo o relatório da Global Witness [2], em 2022, 88% dos assassinatos a nível mundial ocorreram na América Latina, com a Colômbia liderando o ranking mundial com 60 assassinatos. No Brasil, 34 defensores do meio ambiente perderam a vida, em comparação com os 26 de 2021. (incluir 6 países).

No âmbito de seu programa regional, ABA ROLI promove o fortalecimento das capacidades regionais para realizar intervenções coordenadas que respondam, protejam e previnam violações dos direitos humanos dos Defensores Ambientais na região amazônica. Através do programa de Apoio aos Defensores Ambientais na América Latina, ABA ROLI está implementando atividades para fortalecer as capacidades dos DE em responsabilizar o setor privado e os governos pelo cumprimento das leis ambientais, assim como na proteção e prevenção de violações dos direitos humanos contra os DE. Além disso, busca-se promover a implementação dos compromissos estabelecidos em acordos regionais e internacionais.

Graças à experiência coletiva e ao trabalho existente da ABA ROLI na região, os defensores e suas redes de organizações da sociedade civil foram incluídos no fortalecimento de suas capacidades em litígio estratégico, incidência e estratégias de autoproteção. A população-alvo do programa tem um foco interseccional que inclui principalmente mulheres defensoras, pessoas agricultoras, afrodescendentes, indígenas e/ou pessoas em situação de deficiência, assim como jovens (a partir de 16 anos) e pessoas LGBTQI+ e OSC que trabalham com defensores do meio ambiente.

 

 [1] Amazonia mía, Asociacion Civil Kape-Kape, Arayara, Carita, CONAINE,  Comunidad de Juristas Akubadaura, Derechos Humanos y Medio Ambiente (Dhuma), Encontro das Juventudes por Escazú 2024, ERI – EarthRights International, Guardián Amazónico,  La Paz querida, Observatorio DDHH y Justicia de Ecuador, Universal Rights Grou, Instituto Raça e Igualdade – Brasil, Terra de Direitos.

[2]  incluir detalhes do relatório. https://www.globalwitness.org/es/standing-firm-es/

 

 

No Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, fazemos um apelo urgente para combater a discriminação e o racismo religioso nas Américas

Washington D.C, 21 de março de 2024.– Ao comemorar neste 21 de março o Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, o Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) apela urgentemente aos Estados para que adotem medidas para combater as crescentes manifestações de discriminação e racismo religioso nas Américas, que afetam significativamente grupos populacionais racializados, como afrodescendentes e indígenas.

Na América Latina e no Caribe, esses grupos enfrentam desafios persistentes para expressar suas tradições sagradas, ancestrais e culturais sem enfrentar restrições, estigma, repúdio ou violência.  Essas práticas incluem a perseguição de seus membros, bem como a violência contra locais de culto e símbolos religiosos associados a essas tradições. A discriminação religiosa e o racismo também podem se manifestar por meio de estereótipos e preconceitos que difamam as crenças e práticas dessas pessoas, perpetuando sua exclusão e marginalização.

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) afirma que, no caso da população afrodescendente, sua identidade cultural implica a preservação dos saberes ancestrais e a conservação de seu legado histórico, de modo que tradições e crenças como as religiões Lumbalú, Candomblé, Abakuá, Umbanda, Hoodoo, entre outras, que têm suas raízes na África, fazem parte do patrimônio imaterial da diáspora africana e fazem parte do processo social de resistência desenvolvido por pessoas escravizadas nas Américas.

No caso dos povos indígenas, em termos do direito à liberdade de religião e crença, as Nações Unidas faz uma referência a um espectro mais diverso e complexo de culturas e crenças, uma vez que, de acordo com o direito à autodeterminação, os povos indígenas são livres para definir e determinar sua própria identidade espiritual, aponta para o relatório “Povos indígenas e o direito à liberdade de religião ou crença”, apresentado em outubro de 2022 pelo então relator especial sobre liberdade de religião ou crença, Ahmed Shaheed.

“Muitos conceituam a espiritualidade como um ‘modo de vida’: a conformação das emoções, hábitos, práticas ou virtudes distintas, a formação de diferentes crenças e maneiras de pensar e um modo particular de viver juntos e se comunicar. Portanto, a espiritualidade está relacionada ao transcendente e é intrínseca às experiências e práticas cotidianas dos povos indígenas. Além de sua singularidade, a espiritualidade e a cultura indígenas são muitas vezes baseadas na comunidade, identidade e relações com terras tradicionais”, detalha o relatório.

Um problema crescente com raízes na discriminação racial

O fato de grupos de populações afrodescendentes e indígenas serem os mais afetados pela discriminação e pelo racismo religioso, isso está intrinsecamente relacionado à discriminação racial e ao racismo sistêmico que persiste nas Américas.

No recente webinar “O Legado das Práticas Religiosas Africanas e os Preconceitos e Preconceitos Sociais que Enfrentam”, organizado pela Secretaria de Acesso a Direitos e Equidade da Organização dos Estados Americanos (OEA) no âmbito da VII Semana dos Afrodescendentes nas Américas, representantes da sociedade civil associaram a rejeição,  perseguição e até criminalização dessas práticas a processos históricos carregados de ignorância, estigmatização e preconceito por não serem consideradas “civilizadas”.

A CIDH relata repetidas denúncias de perseguição e ataques contra a vida e a integridade de líderes e praticantes de religiões de matriz africana em diferentes estados da região, bem como denúncias de destruição de templos e espaços sagrados de comunidades afrodescendentes. No Brasil, a Raça e Igualdade tem conhecimento de casos de intolerância religiosa contra religiões de matriz africana que desencadearam conflitos jurídicos, com o preocupante resultado de que fiéis perderam a guarda de seus filhos.

Na Bahia, a Secretaria de Estado de Promoção da Igualdade Racial registrou 19 casos de racismo religioso entre janeiro e 21 de julho de 2021, que representou 65% do total de casos registrados em 2020.Tags. Da mesma forma, no Rio de Janeiro, a Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR) recebeu denúncias de 19 casos contra religiões de matriz africana, incluindo dois envolvendo crianças, até o mês de maio do mesmo ano.

Por outro lado, no México, um relatório da organização Christian Solidarity Worldwide (CSW) revela que as  mulheres indígenas no país sofrem mais discriminação religiosa do que seus parentes homens. As mulheres que se recusam a aderir à fé católica romana majoritária enfrentam assédio e exclusão do sistema de justiça, programas e serviços de benefícios do governo e cuidados de saúde pré-natais.

O relatório observa que, embora a Constituição mexicana garanta a liberdade de religião ou crença e outros direitos humanos a todos os seus cidadãos, na prática, as violações são comuns em certas regiões: em particular, para as comunidades indígenas regidas pela Lei de Usos e Costumes.

Estândares Internacionais no Quadro do Direito Internacional

No Sistema Interamericano, o direito à liberdade de religião e crença está consagrado na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (Artigo III) e na Convenção Americana de Direitos Humanos (Artigo 12). Considerando que, ao nível do Sistema Universal dos Direitos do Homem, este está estipulado no artigo 18º da Declaração Universal dos Direitos Humanos e no artigo 18º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, tendo sido aprofundado na Declaração sobre a Eliminação de Todas as Formas de Intolerância e Discriminação Fundadas na Religião ou nas Conviccções, em 1981.

Um dos instrumentos interamericanos mais notáveis sobre o tema é a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância (CIRDI), que afirma que os Estados devem prevenir, proibir e punir qualquer restrição ou limitação ao uso da língua, tradições, costumes e cultura das pessoas em atividades públicas ou privadas.

O “Estudo sobre Liberdade de Religião e Crença. Normas Interamericanas”, da CIDH, revela um amplo arcabouço para a proteção desse direito, onde também destaca instrumentos e jurisprudência aplicáveis aos povos indígenas e afrodescendentes. Também aponta a vulnerabilidade de alguns grupos, como pessoas LGBTI, crianças e adolescentes, defensores de direitos humanos e pessoas privadas de liberdade, e, portanto, fornece um conjunto adicional de aspectos do direito à liberdade de religião e crença em relação a eles.

Um apelo à ação

Raça e Igualdade integrou a luta contra a discriminação religiosa e o racismo em suas linhas de trabalho. Desde 2021, no Brasil, desenvolvemos um projeto que visa promover a tolerância religiosa e a redução da violência e da discriminação contra praticantes de religiões afrodescendentes, por meio do fortalecimento de organizações afro-brasileiras para que possam documentar casos de violência com base em crenças religiosas, prepará-los para litígios internacionais estratégicos e fomentar uma cultura de respeito à liberdade religiosa,  além de qualificar entidades para que possam prestar apoio jurídico às vítimas deste flagelo. Enquanto isso, em Cuba, apoiamos a elaboração do relatório “Obstáculos enfrentados por líderes e membros de religiões afro-cubanas em Cuba”.

Com base nos princípios dos direitos humanos, e levando em conta que a discriminação e o racismo religioso são um problema crescente na região, Raça e Igualdade convoca os Estados das Américas a adotarem medidas para enfrentá-lo e contê-lo, um dos mais vitais dos quais é a ratificação e implementação da Convenção Interamericana contra o Racismo, Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância. Em termos de monitoramento, é importante ter estatísticas e informações qualitativas sobre práticas religiosas e culturais de afrodescendentes e indígenas, respectivamente. Da mesma forma, que sejam promovidas informações desprovidas de preconceito e estigma em torno dessas práticas e, claro, que qualquer ação que as atrapalhe e implique em violações de direitos humanos, sejam penalizadas.

Makira-E’ta e Raça e Igualdade lançam edital para jovens lideranças indígenas

TERMO DE REFERÊNCIA No 01/24 – RAÇA E IGUALDADE

Projeto: RAÇA & IGUALDADE;

Título da Vaga: Jovens Líderes Indígenas

Departamento: Coordenadoria da Rede de Jovens Comunicadores;

Tipo de contrato: Contratação de prestação de serviços – Pessoa jurídica;

Previsão de início: Janeiro/2024

Modalidade de Trabalho: Remoto – Manaus/AM

Período de inscrição: 28 de Fevereiro a 02 de Abril de 2024, às 23h59 (Horário de Manaus)

  1. Contextualização:

A Rede de Mulheres Indígenas do Estado do Amazonas – MAKIRA E ́TA foi criada em 29 de julho de 2017, com sede na capital do estado. É uma organização de atendimento em defesa dos direitos e protagonismo da mulher,criança, e jovens indígenas do Amazonas a proteção social básica e especial, profissionalização e geração de renda às mulheres indígenas das áreas urbanas e rurais. Tem por objetivo diminuir as vulnerabilidades sociais e desenvolver potencialidades.

1.1 Sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos trabalha para promover a igualdade racial e étnica das comunidades afrodescendentes e indígenas – uma abordagem única entre as organizações internacionais de direitos humanos. Trabalhamos com organizações afrodescendentes no Brasil, bem como com uma grande variedade de organizações que combatem a discriminação racial na América Latina ou que combatem a discriminação com base na orientação sexual e identidade de gênero.

Raça e Igualdade tem uma abordagem dinâmica de capacitação para promover os direitos dos (as) afro-latinos (as), pessoas LGBTI+, povos indígenas, mulheres e outras comunidades vulnerabilizadas. Usando uma combinação de litígio, mobilização comunitária, relatórios de direitos humanos, pesquisa e metodologia de defesa em nível nacional e internacional, nos juntamos a nossos parceiros no desenvolvimento e implementação de estratégias de mudança.

É fundamental para este trabalho expandir o papel das ONGs que representam comunidades marginalizadas em nível regional. Portanto, nosso programa inclui a capacitação de nossos (as) parceiros (as) para defender a

incorporação total de questões de discriminação na Organização dos Estados Americanos (OEA) e litígios no Sistema Interamericano de Direitos Humanos, em coordenação com litígios domésticos, defesa de políticas e mobilização comunitária. O uso do Sistema Universal também é crucial para o avanço dos direitos humanos, em particular os Procedimentos Especiais e Órgãos de Tratados no sistema ONU.

O projeto Raça e igualdade, Busca o desenvolvimento de uma metodologia laboratorial de etnocomunicação, a criação de um guia estratégico sobre etnocomunicação, a concepção de uma estratégia de etnocomunicação para advocacia alinhada com os objectivos do JAPER e a produção de conteúdos que incorporem perspectivas interculturais, anti-racistas e de género.

  1. Objetivo: Jovens líderes de comunidades indígenas e afrodescendentes (incluido LGBTQI+, mulheres e pessoas com deficiência) no Brasil fortalecerão habilidades, conhecimentos e redes para promover igualdade, equidade e inclusão em suas comunidades. Este projeto, por meio de programas de liderança juvenil, capacitação e promoção de reformas, visa fortalecer parcerias com a sociedade civil no Brasil para avançar nas reformas propostas no JAPER, promovendo equidade, inclusão e igualdade de acesso para comunidades indígenas e afrodescendentes. A população-alvo deste projeto são jovens líderes da sociedade civil no Brasil, entre 20 e 35 anos, focando em grupos raciais e étnicos marginalizados, incluindo comunidades rurais e afetadas por conflitos.
  2. Principais requisitos para seleção:
  • Disponibilidade de horários para participação de formações
  • Ter entre 20 a 35 anos.
  • Candidatos devem enviar carta de candidatura e currículo. (A carta deve destacar a motivação para participar, o envolvimento nas prioridades do JAPER e como a bolsa contribuirá para seu projeto comunitário.
  • Acesso a internet de forma que sustente sua participação nas atividades.
  • Experiência em mobilização social com jovens indígenas , de preferência em projeto de formação
  • Experiência em engajamento comunitário;
  • Disponibilidade para execução das atividades, em horário comercial e finais de semana, a depender da atividade a ser executada e conforme pactuação a ser realizada junto à coordenação geral do projeto (destina-se a intervenções in loco, capacitações, reuniões e relatórios).
  • Responsabilidade, proatividade, organização, comprometimento com os objetivos do projeto e valores da instituição;
  • Facilidade de comunicação, relacionamento, em respeitando a diversidade, independentemente da situação confrontada;
  • Desenvoltura para trabalhar em equipe multidisciplinar e com diferentes atores;
  • Capacidade de executar tarefas, atividades com autonomia, auxiliar na coleta de dados e informar todas as atividades desempenhadas;
  • Comprometido com prazos e metas;
  1. Propriedade Intelectual: Todos os direitos de Propriedade Intelectual concebidos ou realizados pelo/a consultor(a) ou empresa de consultoria durante a prestação dos serviços devem pertencer a rede Makira E ́ta. Contato: makiraeta2018@gmail.com
  1. Período de vigência do projeto: janeiro de 2024 a janeiro de 2026. O projeto oferecerá 10 bolsas no valor de 300 dólares, dessa forma haverá um ciclo de formações onde esses 10 jovens serão divididos da seguinte maneira: 3/3/4. possuindo assim um ciclo de formações ao longo do projeto.
  2. Os pagamentos serão efetuados mediante entrega e aprovação de produtos, acompanhado de nota fiscal válida em cronograma a ser estabelecido em contrato.
  3. Etapas de seleção:

7.1. Análise de currículo: 3 a 9 de abril;

7.2. Entrevista com os candidatos selecionados; 11 a 13 de abril;

7.3 Resultado no dia 15 de abril.

      8.Como se Candidatar:

Os interessados devem enviar currículo e Carta de candidatura para racaeigualdademakira@gmail.com e/ou preenchimento do formulário: https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSctABf0YtlqOsKtgXuVJOxRwHdDdP3yy1TLxCfwpGeKwpLS7Q/viewform?usp=sf_link, até a data limite: 2 de abril.

Este termo de referência visa orientar o processo de recrutamento, garantindo a transparência e eficiência na seleção de jovens lideranças indígenas para a implementação das iniciativas propostas.

Manaus, 12 de Março de 2024.

8M: A Força Antirracista na Luta pelos Direitos de Todas as Mulheres

Washington D.C, 8 de março de 2024. – Desde sua criação, o movimento pelos direitos das mulheres tem sido alimentado por diferentes perspectivas, ampliando sua visão e missão em diferentes esferas da sociedade. Uma delas é a perspectiva antirracista que, apesar de encontrar uma série de obstáculos para a sua plena integração, tem sido a base de importantes contribuições para a luta.

Neste 8 de março, Dia Internacional da Mulher, através do Instituto Internacional sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade), queremos exaltar a perspectiva antirracista, levando em conta que machismo e racismo são formas de opressão que se entrelaçam e afetam exclusivamente mulheres de diferentes origens étnicas e raciais.  No caso das Américas, mulheres afrodescendentes e indígenas em particular.

Conversamos com líderes e ativistas de diferentes partes da América Latina para que elas mesmas pudessem perceber a importância da perspectiva antirracista na luta pelos direitos das mulheres, suas contribuições para o movimento feminista e os desafios que persistem em diferentes níveis para incorporar plenamente essa visão no trabalho de defesa e promoção dos direitos das mulheres.

O racismo como gatilho para múltiplas formas de violência

“A perspectiva antirracista na luta pelos direitos das mulheres é necessária se concebemos o racismo como uma violência que permeia o sistema, o Estado e as estruturas sociais, a família, nossos corpos, e que faz com que a violência aumente; Ou seja, o racismo reconhecido como violência estrutural também replica e reproduz múltiplas formas de violência”, diz Patricia Torres Sandoval, mulher indígena do Grupo P’urhépecha, que integra a coordenação geral da Coordenadoria Nacional de Mulheres Indígenas (Conami) no México.

“A perspectiva antirracista dentro dos feminismos é essencial porque entende que a categoria de mulheres é muito mais ampla ou complexa do que apenas nos identificarmos como mulheres, engloba tudo o que seria a visibilidade da situação e das experiências das mulheres afrodescendentes, indígenas, trans, traz a análise interseccional que é pensar nas múltiplas formas de opressão como o racismo, machismo, classe, processos migratórios, etc.”, diz Gilma Vieira da Silva, coordenadora regional da Rede de Jovens Afrodescendentes da América Latina e Caribe (REDJUAFRO).

Vieira da Silva acrescenta que a interseccionalidade não pode ser pensada sem um contexto étnico-racial, e lembra que esse conceito foi formulado por uma mulher afrodescendente: a advogada e acadêmica estadunidense Kimberlé Crenshaw, que dedicou grande parte de seu trabalho para compreender a desigualdade estrutural em questões de gênero.

A violência de gênero não é individual

Já Torres Sandoval ressalta que as mulheres indígenas têm contribuído para o reconhecimento da violência coletiva. Ela explica que a frase “Meu corpo, meu território” – que foi apropriada como slogan pelo movimento feminista – vem de mulheres indígenas como forma de dizer que violar seus corpos também viola a terra e o território. “Como mulheres e povos indígenas, nos reconhecemos como parte integrante do território e da Mãe Terra, contrariando a perspectiva ocidental de que somos donos da terra”, diz.

Para Gahela Cari, feminista trans indígena da Federação Nacional das Mulheres Camponesas, Artesãs, Indígenas, Indígenas e Assalariadas do Peru, o feminismo é essencial para os processos de mudança, no entanto, ela ressalta que não basta se não for antirracista. Em suas palavras, o feminismo antirracista “se posiciona em meio a uma sociedade com tantas desigualdades” e mostra que, além do gênero, outros sistemas de opressão impossibilitam viver com dignidade.

“Temos que construir processos de escuta, diálogo, construção coletiva. Mesmo quando não entendemos totalmente o que a outra pessoa está colocando na mesa”, aponta sobre uma tarefa necessária na luta feminista para trabalhar a partir de uma abordagem antirracista. Nesse sentido, ela destaca a importância de fechar o caminho para processos autoritários no país, como o que está acontecendo com o atual regime político no Peru.

Educar a partir de uma perspectiva antirracista, uma tarefa dupla

Nesse sentido, Fernanda Gomes, assistente social e integrante da Articulação Brasileira de Lésbicas (ABL) no Brasil, questiona o fato de que é preciso educar constantemente sobre a perspectiva antirracista para pessoas e grupos que não têm essa visão adequada ou que, até mesmo, a excluem.

“É um grande desafio porque a gente perde tempo pensando em uma política pública, escrevendo um manifesto, para educar essas pessoas. Temos que estar constantemente dizendo ‘ah, fulano de tal, eu não sou seu professor, pesquise no Google, pergunte a um amigo branco seu’. O movimento de mulheres negras, lésbicas e feministas também é um movimento de educação. Estamos educando pessoas brancas o tempo todo e é exaustivo”, diz.

Contribuições e desafios

Brisa Bucardo, jornalista do povo Miskito da Nicarágua, destaca o papel que os movimentos de mulheres têm desempenhado no contexto da costa caribenha do país, pois não apenas fornecem apoio fundamental às mulheres vítimas de violência, mas também lideraram as denúncias das cidadãs e fortaleceram as capacidades das mulheres tanto individual quanto coletivamente. Além disso, desmantelaram conceitos arraigados de violência historicamente justificados sob o rótulo de “cultura”.

Em termos de contribuições para a luta pelos direitos das mulheres, Dunia Medina Moreno, mulher afrodescendente e membro da Rede de Mulheres de Cuba, destaca o papel que as mulheres afrodescendentes têm desempenhado na promoção e defesa dos direitos humanos, o que resultou em uma proteção mais abrangente dos direitos de todas as pessoas em sua diversidade de identidades.

“Devemos criar um feminismo onde todas as mulheres se encaixem, um feminismo interseccional onde todas as mulheres se integrem e possamos cobrir todas as dimensões de discriminação que experimentamos”, diz Leticia Dandre Pie, ativista de direitos humanos na República Dominicana e membro do Movimento de Mulheres Dominicano-Haitianas (MUDHA).

Apesar dos avanços na introdução da perspectiva antirracista na luta pelos direitos das mulheres, ainda há desafios para uma real integração que se traduza não apenas em ativismo mais inclusivo, mas também na formulação de políticas públicas mais abrangentes. “Sabemos que a militância hoje tem que ser reconhecida como um trabalho, o nosso tempo que colocamos na luta tem que ser reconhecido, mas muitas vezes as mulheres afrodescendentes recebem pouquíssimos recursos, isso inclui também mulheres trans, mulheres com deficiência, mulheres indígenas”, diz Gilma Vieira da Silva, da REDJUAFRO.

“São muitos os desafios para se considerar a perspectiva antirracista tanto no Estado, na academia e na sociedade em geral, há sobretudo um imaginário geral que ainda coloca o eurocentrismo como a ideia do melhor, de aspirar a ser esse estereótipo branco hegemônico voltado a certos parâmetros da beleza estética, mas que não só existe no imaginário geral como consegue também permear as instituições.”  diz Patricia Torres Sandoval, da CONAMI México.

Do “feminismo branco” à interseccionalidade

Uma das grandes críticas aos feminismos originários, ou o que podemos chamar de “feminismo branco”, é que eles universalizaram a experiência das mulheres brancas[1]. Ou seja, no início a luta do feminismo era reduzida apenas às necessidades das mulheres que, de uma forma ou de outra, estavam em situação de privilégio.

A perspectiva antirracista no feminismo é crucial porque desafia essa visão eurocêntrica e androcêntrica que permeou muitos campos acadêmicos e movimentos sociais por meio do feminismo branco[2]. As mulheres racializadas que passaram a desafiar esses padrões forneceram análises críticas a partir de suas experiências situadas, questionando as estruturas de poder e defendendo uma compreensão mais completa das interseções entre raça, gênero e classe na luta contra a opressão.

Em particular, elas têm questionado a homogeneização da categoria “mulher” nos movimentos feministas, apontando que as experiências das mulheres variam significativamente de acordo com sua raça, etnia, classe e orientação sexual[3]. Essa abordagem interseccional tem enriquecido a compreensão das interconexões entre diferentes sistemas de opressão.

Você sabia?

Existem instrumentos de proteção e promoção de direitos com abordagem antirracista ou com perspectiva de gênero-raça. Alguns deles são:

  1. Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH): É o documento internacional que estabelece os direitos fundamentais de todas as pessoas sem qualquer discriminação baseada em raça ou gênero, entre outros.
  2. A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) é o instrumento internacional que trata especificamente da discriminação de gênero e leva em conta as dimensões de raça e outros fatores. Reconhece a interseccionalidade das discriminações enfrentadas pelas mulheres.
  3. Convenção Internacional pela Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial (CERD): Este tratado das Nações Unidas proíbe a discriminação racial em todas as suas formas e promove a igualdade racial. Embora não focalize exclusivamente a perspectiva de gênero, reconhece a interseccionalidade da discriminação.
  4. Declaração e Plataforma de Ação de Pequim sobre a Mulher: Esta convenção, que foi adotada na Quarta Conferência Mundial sobre a Mulher em 1995, destaca a interseccionalidade e reconhece a importância de abordar a discriminação com base em gênero e raça.
  5. Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará): é o tratado regional interamericano que tem como foco a violência de gênero e reconhece a interseccionalidade das formas de discriminação enfrentadas pelas mulheres, incluindo o racismo.
  6. Convenção 169 da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes: Esta é a convenção que aborda os direitos dos povos indígenas e reconhece a importância de abordar a discriminação com base na raça.
  7. Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas: reconhece o direito das mulheres indígenas ao reconhecimento, proteção e gozo de todos os direitos humanos sem discriminação de qualquer natureza, estabelecendo o dever dos Estados de erradicar todas as formas de violência contra as mulheres indígenas.
Recomendações

A fim de assegurar a integração efetiva de uma perspectiva racial nas políticas e resoluções relativas aos direitos das mulheres, os Estados e os órgãos de direitos humanos devem:

  • Formular políticas de igualdade de gênero que incluam explicitamente a perspectiva interseccional na formulação de políticas de igualdade de gênero.
  • Promover a diversidade em todos os níveis de liderança para refletir diferentes experiências.
  • Implementar programas educacionais que destaquem a importância de compreender as complexidades da interseccionalidade. Em particular, promover a conscientização da importância da interseccionalidade em todas as áreas do governo, bem como nos órgãos decisórios e judiciais, para que essa perspectiva seja replicada nas decisões.
  • Apoiar e promover organizações que trabalham na intersecção de gênero e raça.
  • Avaliar regularmente a eficácia das políticas, garantindo que várias camadas de discriminação sejam abordadas.

 

[1] Parra, Fabiana (2021). El feminismo será antirracista o no será. Joselito Bembé. Revista Político Cultural, nro. 2, p. 42, disponível em: https://www.memoria.fahce.unlp.edu.ar/art_revistas/pr.12875/pr.12875.pdf

[2] Curiel, Ochy (2007). Crítica pós-colonial às práticas políticas do feminismo antirracista. Nomads, ISSN 0121-7550, ISSN-e 2539-4762, No. 26, p. 93, disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=3997720

[3] Boddenberg, Sophia (2018). Mulheres indígenas e afrodescendentes, interseccionalidade e feminismo decolonial na América Latina. Revista Búsquedas Políticas, Universidad Alberto Hurtado, disponível em: https://politicaygobierno.uahurtado.cl/wp-content/uploads/sites/8/2018/06/sophia_boddenberg_mujeres_indigenas.pdf

Raça e Igualdade reconhece o papel da juventude indígena na América Latina e no Caribe como agentes de mudança em direção à autodeterminação

Washington D.C., 9 de agosto de 2023 – Na América Latina e no Caribe, há um contexto de violência generalizada em que persistem desafios importantes no reconhecimento e pleno gozo da autodeterminação e dos direitos correlatos. Diante disso, a juventude indígena, consciente de seu papel como agente de mudança, promove processos de reivindicação e de incidência política para a defesa dos direitos humanos e promoção da justiça, responsabilização e reparação.

Neste Dia Internacional dos Povos Indígenas, o Instituto sobre Raça, Igualdade e Direitos Humanos (Raça e Igualdade) se une ao chamado feito pelas Nações Unidas sob o lema “Juventude indígena, agentes de mudança para a autodeterminação”, que reconhece os esforços, mas também os desafios enfrentados pela juventude indígena na região perante a preservação de suas terras, territórios, lugares sagrados e a revitalizção de suas tradições e manifestações identitárias.

 Contexto

Estima-se que a América Latina e o Caribe abrigam aproximadamente 58 milhões de pessoas pertencentes a 800 povos indígenas, representando 9,8% da população regional. Em vários Estados da região, há lacunas significativas no cumprimento de marcos normativos e políticos favoráveis aos direitos desses povos, assim como de padrões internacionais e interamericanos sobre os direitos dos povos indígenas e tribais.

A situação de violência que enfrentam em decorrência da presença e invasão de suas terras por pessoas não indígenas, sejam estas envolvidas com extração de madeira, mineração, pecuária ou tráfico de drogas; ou por situações de conflito armado, que deixam consequências de grave risco e ameaça à sobrevivência física e cultural desses povos. Da mesma forma, ocorrem com frequência situações de criminalização, estigmatização, ameaças contra lideranças indígenas e até assassinatos.

Juventude indígena, agentes de mudança do presente e do futuro

Há algumas décadas, o movimento indígena latino-americano reconhece a gestão de um movimento de sua própria juventude, que se articula de forma regional e constrói ações específicas para o atendimento de suas demandas, entre as quais o reconhecimento de suas diversidades.

Os jovens indígenas têm uma abertura ao diálogo interseccional em suas comunidades, o que contribui para a validação de suas identidades e compromisso com o legado de seus ancestrais. O fato de possuírem uma visão de mundo plural e interseccional, fortalece as estratégias de advocacy perante órgãos de proteção dos direitos humanos, como o Fórum Permanente das Nações Unidas sobre Questões Indígenas; No entanto, há também desafios a enfrentar como a segregação etária, o desemprego, a discriminação de identidade de gênero, as ameaças, entre outros. 

Para Thaís Diakarapó, liderança jovem do povo Dessana e Coordenadora do Departamento de Adolescentes e Juventude Indígena da Rede Makira E’ta, o principal desafio da juventude indígena é “ressignificar que a juventude não é só o futuro, somos também agentes de transformação do presente, do agora, e de que temos a capacidade de liderar e estar à frente de nossas lutas com o desejo de realizar nossas demandas”.

Diakarapó reconhece que o trabalho da juventude “está sendo estruturado a cada dia e formando lideranças dentro de sua rede de luta”, no entanto, suas demandas atuais, discussões e debates estão sendo feitos apenas “de jovens para jovens” indígenas, sendo de grande importância que esses diálogos sejam também intergeracionais, com as autoridades e outros agentes de maior poder na implementação de políticas de transformação.

Já da comunidade Muxhe, no istmo de Tehuantepec Oaxaca, no México, Dayanna Gallegos Castillejos, mulher trans e ativista,  considera que o maior desafio enfrentado pelos jovens indígenas são os atos de discriminação étnica, principalmente quando pertencem a identidades de gênero indígenas.  

A juventude indígena precisa de visibilidade… Precisamos estar na agenda global para fortalecer a luta por nossas identidades indígenas”, acrescenta. 

A partir de Raça e Igualdade, reafirmamos nosso compromisso com a proteção e promoção dos direitos dos povos indígenas. Reconhecemos o  papel fundamental da juventude indígena que  levanta a voz na busca por justiça para seus povos e cria conexões intergeracionais para manter vivas suas culturas e tradições, sem interferências externas.

Instamos aos Estados para que implementem leis e políticas que garantam o direito à autodeterminação, à autonomia e ao livre consentimento, prévio e informado; além de combater problemas estruturais, desigualdades históricas, discriminação e racismo, que colocam em risco o bem-estar social dos povos indígenas.

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